Inflação alta e menor poder de compra: economista explica o 'pior dos mundos' para o Brasil em 2022


 

Especiais - Sputnik Brasil

Para Patrícia Costa, supervisora do Dieese entrevistada pela Sputnik Brasil, o governo federal errou ao propor uma política de não intervenção na economia, principalmente no âmbito das exportações, gerando um quadro de recessão para 2022.
Ao final de todo ano, o Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese) estima e reajusta qual o valor ideal para o salário mínimo no Brasil. A pesquisa mais recente, de novembro, revelou que, em 2021, a quantia deveria ser de R$ 5.969,17.
O Congresso, entretanto, aprovou na última semana o valor de R$ 1.211,98, com apenas a correção da inflação, que deve ultrapassar os 10%. Este é o terceiro ano seguido em que o trabalhador não terá aumento real no valor do salário mínimo, o que pode agravar a condição socioeconômica dos mais vulneráveis.
Para o governo que promete uma retomada econômica e um novo ciclo de crescimento a partir de 2022, é preciso entender se o Brasil de fato está neste trilho, e como ficarão as pessoas que recebem tão pouco diante do aumento dos preços. O ministro da Economia, Paulo Guedes, acredita que o crescimento do país incluirá os mais pobres. Ele disse, em novembro, que uma recessão em 2022 só pode ser "estimada por pessimistas".
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A pesquisadora Patrícia Costa, supervisora do Dieese, seria uma "pessimista" na avaliação do ministro. Em entrevista para a Sputnik Brasil, ela falou sobre a importância do salário mínimo para impulsionar o consumo e o crescimento econômico, e quais foram os erros do governo na condução da inflação. Ela entende que o cenário econômico do país para 2022 "é o pior dos mundos, com inflação alta e sem crescimento".

Onde foi que erramos?

Embora o prognóstico de Patrícia Costa, ao olhar para o quadro econômico brasileiro a partir do ano que vem, seja de grandes dificuldades (e em especial para os mais pobres), Paulo Guedes avalia que há um pessimismo exacerbado ante as avalições sobre o Brasil. Para ele, é preciso ressaltar que o país "registrará desempenho positivo do PIB (Produto Interno Bruto)".
Além disso, ainda segundo Guedes, "a alta da Bolsa de Valores indica que o mercado não levou a série uma hipótese de nova recessão no Brasil. Entramos em recessão técnica, o PIB caiu 0,1% neste trimestre. Porém, a Bolsa subiu 3%. Se alguém tivesse levado a sério que o PIB vai cair, a Bolsa não estava caindo".
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A crença do ministro, na avaliação de Patrícia Costa, é equivocada. Ela disse que "o momento é muito complicado". Em seguida, apontou que o principal erro do governo de Jair Bolsonaro para agravar este cenário "foi abandonar a política de valorização do salário mínimo, que é tão importante". Ela disse ainda que "essa é uma das razões para o não crescimento da economia".
Ela avalia que a política de valorização do salário mínimo é importante porque ela sinaliza quando o rendimento dos empresários pode subir, gerando pesquisa, crescimento e investimentos.
"As famílias que ganham menos estimulam o consumo, criando mais desenvolvimento e empregos", comentou.
Paulo Guedes credita o futuro do Brasil, e o seu otimismo sobre o tema, às futuras privatizações que o governo federal pretende fazer em 2022. Ele também conta com o "poder" da chegada do Auxílio Brasil na economia, o aumento dos investimentos em infraestrutura, e os programas de contenção de gastos públicos.
Embora sua estratégia tenha sido aprovada pelo Congresso, o Brasil seguirá como 11ª maior economia do mundo em 2022, conforme previsão do relatório anual do Centro de Pesquisa para Economia e Negócios (CEBR, na sigla em inglês).

Intervenção nos preços: o dilema dos economistas

O instituto do Reino Unido considerou que, "além dos problemas nas cadeias de produção e altos preços da energia, a fraqueza da moeda do Brasil é um fator adicional de pressão na inflação". Em verdade, o real perdeu cerca de um quarto do valor desde o começo da pandemia, em 2020. Outras projeções apontam que a economia do Brasil crescerá até 1,5% em 2022, muito abaixo dos maiores países do globo.
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Para Patrícia Costa, os erros do governo federal para que chegássemos a estes números foram muitos, porém, pesou a ausência de uma política de Estado para controlar os preços de alguns itens que são essenciais para a cadeia de abastecimento do Brasil. A pesquisadora defende uma política de intervenção nas exportações do Brasil, sobretudo para reduzir o constante aumento nos preços do alimentos.
Ela explicou que, desde 2019, o governo federal "abandou políticas que poderiam mitigar o aumento nos preços dos alimentos", em especial as ferramentas "que estimulam os estoques reguladores, assim como a agricultura familiar, apresentando uma proposta [via PEC dos Precatórios] que é fraca para o desenvolvimento deste segmento da economia".

"Estamos em um momento de ascensão de preços, principalmente de itens básicos, como gasolina, alimentação, o gás e a energia. Não há sinalização de que os alimentos terão intervenção governo federal. Portanto, teremos uma inflação ascendente em 2022", comentou a pesquisadora.

A importância do salário mínimo

A supervisora do Dieese comentou que "o governo faz um diagnóstico equivocado e trata essa inflação como problema de demanda, porque o aumento do juros joga a economia em uma recessão, e não resolve a inflação, que está associada ao aumento dos custos em geral". Com isso, explicou, "o brasileiro começa o ano como ele terminou: perdendo o seu poder de compra".
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Este problema, na opinião da pesquisadora, é negligenciado pelo Ministério da Economia, que, embora esteja contente com os números da exportação de carne, soja e outras commodities, parece cruzar os braços ante ao aumento considerável da gasolina. Com isso, pequenos reajustes no salário mínimo serão inócuos no orçamento das famílias mais pobres, pois os preços continuarão subindo.
"Estamos dando em janeiro [de 2022] um reajuste passado. Ao longo do ano, o salário mínimo não foi composto pelo seu valor original e foi perdendo valor. Em dezembro, o nosso salário vale 10% a menos do que vali no início do ano. Se não houver controle da inflação, o salário continuará caindo", comentou.
Patrícia Costa apontou que, segundo dados de novembro de 2021, "a cesta básica de alimentos em Santa Catarina, a mais cara do país, custa cerca de R$ 710. Se a gente pensa que essa é a alimentação de uma família para um mês, com dois adultos e duas crianças, é preciso multiplicar essa cesta por três. Com isso, a gente chegaria na conta de R$ 2.100. Colocando outras variantes na conta das famílias, outros gastos, fica claro que isso não sabe no orçamento familiar".
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A cesta básica é composta por 13 itens alimentícios e é base para o cálculo do valor do salário mínimo necessário para a sobrevivência de um trabalhador e de sua família. A alta dos preços atingiu todos os setores da alimentação e a desvalorização do real frente ao dólar foi um dos motivos que mais pressionou o indicador.
Apesar do Brasil ser um exportador de alimentos, o fato de ter uma moeda norte-americana muito valorizada faz com que o produtor queira exportar, diminuindo a oferta local. Já o que importamos, com dólar alto, também fica mais caro.

Qual o salário mínimo ideal?

Patrícia Costa explicou que o salário mínimo deveria "garantir alimentação, moradia e acesso a lazer, educação e saúde". Ele é calculado com base nos preços da cesta básica, particularmente sobre a cesta mais cara do país. A pesquisadora disse ainda que o problema é que o "salário mínimo não é importante para este governo, assim como não foi a vacinação".
Ela comentou que a gestão de Paulo Guedes "priorizou os lucros do agronegócio, e os preceitos macroeconômicos, ainda que isso tenha dado errado, pois a inflação não está equilibrada". Segundo ela, o "Brasil é o pior dos mundos, com inflação e sem crescimento", mas este quadro recessivo, vale lembrar, o Ministério da Economia ainda rejeita.
Por questões ideológicas, Paulo Guedes se opõe não apenas às intervenções do Estado nas relações entre empregadores e empregados, como também acredita que o salário mínimo prejudica os pequenos negócios, abaixa a competitividade no mercado, e reduz a quantidade demandada de trabalhadores.
Longe de qualquer consenso, o tema, como se vê, seguirá dominando a agenda política do país nos próximos anos.
Presidente do Brasil, Jair Bolsonaro, e o ministro Paulo Guedes, na coletiva de imprensa no Ministério da Economia, Brasília, 22 de outubro de 2021 - Sputnik Brasil, 1920, 27.12.2021
Presidente do Brasil, Jair Bolsonaro, e o ministro Paulo Guedes, na coletiva de imprensa no Ministério da Economia, Brasília, 22 de outubro de 2021

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