Thierry Meyssan: O poder político do Facebook
William Joel / The Verge |
Rede Voltaire | Paris (França) | 12 de Outubro de 2021
O Facebook enquanto rede social
O principal actor político da Internet é a rede social Facebook. Em 1 de Janeiro de 2021, ela contava 2,85 mil milhões (bilhões-br) de usuários activos mensais e 1,88 mil milhões de utilizadores (usuários-br) activos diários em todo o mundo. A rede social censura regularmente mensagens, incluindo fotos de nus ou actividade sexual, assédio, discurso de ódio, falsificações, spam, propaganda terrorista ou violência, usando inteligência artificial sobretudo aproximativa e injusta. Ela fecha contas que considera perigosas, ou porque foram censuradas várias vezes, ou porque estão ligadas a inimigos dos Estados Unidos.
O Facebook é uma enorme sociedade que inclui o Instagram, Facebook Messenger, WhatsApp, Oculus, Workplace, Portal, Novi. Emprega mais de 60. 000 pessoas.
O Facebook como banco
O Facebook emite agora a sua própria moeda, a Libra, tal como um Estado. Esta está ligada a um cesto de divisas composto em 50 % por dólares, 14 % de ienes, 11 % de libras esterlinas e 7 % de dólares de Singapura [1].
Tornando-se um banco cuja moeda é progressivamente aceite pelo sítios de venda Internet, o Facebook construiu uma economia paralela, simultaneamente virtual e global, mais importante que a economia de muitos Estados.
O Facebook e seus utilizadores
O Facebook faz apelo aos seus utilizadores para detectar as contas que violam as suas regras. Ele abre um dossier sobre cada um dos seus informadores e pontua-os [2].
O Facebook, que afirma tratar todos os utilizadores com igualdade, formou secretamente uma lista de 5,8 milhões de VIP a quem as suas regras não se aplicam. Só eles podem dizer tudo e mostrar tudo [3].
A Cambridge Analytica e a NSA
Os dados pessoais de pelo menos 87 milhões de utilizadores foram
visados e desviados pela empresa britânica Cambridge Analytica (do
bilionário Robert Mercer e de Steve Bannon) e pela sua filial canadiana
(canadense-br), AggregateIQ [4]. Foram utilizados pelo menos :
para a eleição do Primeiro-Ministro indiano Narendra Modi, em 2014 [5],
para 44 eleições locais nos EUA, em 2014,
por Mauricio Macri aquando da eleição presidencial argentina,
por Nigel Farage aquando do referendo britânico sobre o Brexit, em 2016.
E, sobretudo, durante a campanha presidencial dos EUA igualmente em 2016, sucessivamente para Ben Carson, Ted Cruz [6], e finalmente para Donald Trump e o seu director de campanha… Steve Bannon.
Segundo o The Observer, a Cambridge Analytica empregava muitas personalidades oriundas do complexo militar-industrial britânico e dos serviços de propaganda do MI6 [7]. Mas, talvez seja apenas a ponta do icebergue : Edward Snowden revelou que o Facebook tinha aderido à rede ultra-secreta de vigilância electrónica PRISM autorizando a National Security Agency (NSA) a ter acesso aos dados pessoais de todos os seus clientes. Mas ninguém denunciou (vazou-br) o uso que a NSA faz deles.
Segundo Newton Lee, antigo pesquisador no Institute for Defense Analyses, a rede PRISM seria o avatar do projecto de Conhecimento total de informação (Total Information Awareness - TIA) que o Almirante John Poindexter havia criado sob indicação de Donald Rumsfeld no seio da DARPA (Defense Advanced Research Projects Agency) [8].
O envolvimento pessoal de Mark Zuckerberg em favor de Israel
Em 2011, o Facebook, a pedido de Israel, censurou as contas que apelavam a um levantamento nos territórios palestinianos.
Em 2012, Mark Zuckerberg, envolveu-se pessoalmente em favor do prémio Nobel da Paz, Shimon Perez. Ele supervisionou a criação e a promoção da página oficial do Presidente israelita, e criou uma campanha de vídeo intitulada « Be my friend for peace » (torna-te meu amigo para a paz), onde constavam nomeadamente Nicolas Sarkozy, David Cameron, Recep Tayyip Erdoğan ou ainda a Rainha Isabel II de Inglaterra.
Em 2015, o Facebook declarou o Hezbolla e a República árabe síria « organizações terroristas ». Fechou as contas de vários canais de televisão, entre as quais Al-Mayadeen (então a televisão de informação mais vista do mundo árabe), Sama e Dunia (duas televisões públicas sírias) e Ikhbariya (um canal privado sírio). Simultaneamente, colocou formadores à disposição dos jiadistas que combatem a República árabe síria.
Neste assunto, o Facebook não censura as mensagens de ódio ou de violência. Assim, ele incentiva a conta dos opositores à Síria que recolhem informações (nome, endereço, foto) de nacionalistas sírios afim de os poder assassinar.
Projecto político
Em 2010, a Nature publica um estudo quanto a « Uma experiência de influência social e de mobilização política sobre 61 milhões de pessoas » [9]. Os pesquisadores da Universidade da Califórnia mostram que as postagens políticas no Facebook durante a eleição intercalar nos Estados Unidos tiveram um importante impacto, não apenas nos utilizadores da rede social, mas também sobre os seus amigos e até mesmo sobre os amigos dos seus amigos.
Em 2014, o Facebook realizou, sem o conhecimento dos seus assinantes, um estudo sobre « A demonstração experimental de um fenómeno de contágio emocional de grande amplitude via redes sociais » [10].
Em 2018, o Facebook estabeleceu uma parceria com o Atlantic Council, influente “think-tank” subvencionado pela OTAN para fazer a « promoção da liderança e da acção dos EUA no mundo, com os seus aliados ». O objetivo específico da parceria é garantir « o uso correcto do Facebook nas eleições em todo o mundo, vigiando a desinformação e a interferência estrangeira, ajudando a educar os cidadãos e a sociedade civil » [11].
Por fim, em 2020, o Facebook envolve-se na política colonial em África com seu projecto de cabo submarino circundando o continente, “2Africa”. Esta rede ligará os principais portos, mas não penetrará no interior dos países [12].Trata-se apenas de favorecer as elites que participam na pilhagem do continente e do envio das suas riquezas para o Ocidente.
No plano internacional, o director de relações públicas do Facebook é o liberal- democrata Nick Clegg. Ele foi adjunto do Primeiro-Ministro britânico, David Cameron. O Facebook França, esse, é dirigido por Laurent Solly, antigo Chefe de gabinete do Presidente Sarkozy, depois número 2 do canal de televisão privado TF1. Ele é o marido de Caroline Roux, a jornalista vedeta do canal de televisão pública France2.
O Facebook não está nem ao serviço dos Democratas, nem dos Republicanos. É uma empresa que defende os interesses do « Império americano » utilizando simultaneamente tanto o seu conhecimento dos utilizadores quanto as emoções que propaga entre eles.
Deste ponto de vista, é particularmente interessante que, em 2017, Mark Zuckerberg tenha pensado tornar-se presidente dos Estados Unidos sem ter que se candidatar às eleições. Montou uma equipe de campanha antes de desistir. O seu plano consistia em apoiar-se sobre o Partido Democrata para destituir o Presidente Donald Trump, depois em aproximar-se do Vice-Presidente Mike Pence para aquele lhe cedesse o lugar assim que automaticamente se tornasse presidente e, por fim, em apoiar-se nos Republicanos para levar à demissão de Pence e tornar-se ele próprio presidente [13].
Acção política
Em 2008, o candidato Barack Obama apoiou-se no antigo porta-voz do Facebook, Chris Hughes, director de My.BarackObama.com (MyBO) e mentor da Obama’s Online Operation (OOO), para atingir e mobilizar cinco milhões de eleitores através do Facebook [14].
Em 2010, o Facebook censurou a Wikileaks, a associação que expõe as práticas do Pentágono e causa portanto dano ao « Império americano ».
Em 2010-11, a plataforma, oficialmente apoiada pelo Departamento de Estado dos EUA, conhece uma explosão por ocasião das « primaveras árabes » no « Médio-Oriente Alargado ».
Em 2018, o Facebook interdita o canal de televisão inter-governamental TeleSur, que reúne na altura a Argentina, a Bolívia, Cuba, o Equador, o Uruguai e a Venezuela.
Em 2020, o Facebook fecha contas ligadas ao Exército francês na República Centrofricana e no Mali. Este levava a cabo uma campanha que não correspondia à do Pentágono.
Em 2021, o Facebook fecha as contas dos Presidentes em exercício do Uganda, Yoweri Museveni, e dos Estados Unidos, Donald Trump.
O Facebook e os média
Uma associação britânica, a Full Fact, criou uma coligação (coalizão-br) entre os ministérios competentes do Reino Unido e do Canadá por um lado e, por outro lado, dos gigantes da informação (Facebook, mas também Twitter, Alphabet e Reuters), a fim de lutar contra a desinformação na Rede anglófona.
O Facebook não se limita a lutar contra as Fake News. Ele acaba de criar um programa, « News Inovation », para apoiar a imprensa escrita. Já foi implantado no Canadá, na Argentina e no Brasil. Ele assinou, por mais de de US $ 10 milhões de dólares, um contrato focando-se nos média (mídia-br) que apoiam Justin Trudeau no Canadá ou são hostis a Alberto Fernandez e Cristina Fernández de Kirchner na Argentina e a Jair Bolsonaro no Brasil.
A Administração Biden e o Facebook
A Administração Biden inquieta-se —perante o público— com a aumento de poderio do Facebook, que ela vê como um rival. A empresa fixa as suas fronteiras, faz de polícia e de justiceira na sua rede, e emite a sua própria moeda. Ela está, é certo, actualmente ao serviço do Pentágono, mas apenas lhe falta um exército para se transformar num Estado.
Foi por isso que a Administração Biden lançou a denunciante France Haugen junto do Wall Street Journal, e depois do Senado. Os debates centraram-se na influência deletéria do Facebook sobre algumas crianças. Foi uma maneira de colocar a rede social no seu lugar sem fazer as perguntas políticas que acabamos de enumerar.
A única pessoa que, hoje em dia, nos Estados Unidos coloca a pergunta sobre a influência política dos gigantes digitais é o antigo Presidente Donal Trump. Ele acaba de entrar com uma queixa contra o Twitter, que desconectou a sua conta quando ainda era Presidente em exercício dos Estados Unidos. Trump apoia-se nas confidências de senadores democratas que se gabaram de ter feito pressão sobre o Twitter. Isso prova, segundo ele, que esta censura não é uma decisão comercial, mas política; que ela viola a 1ª Emenda da Constituição dos EUA sobre a Liberdade total de Expressão. Os seus advogados vão directos ao ponto: o Twitter jamais censurou a linguagem violenta. Ele alberga uma conta do governo Talibã do Afeganistão.
TraduçãoAlva
[1] «Fed’s Brainard: Facebook’s Libra faces ’core set’ of regulatory hurdles», Reuters Staff, Reuters, December 18, 2019.
[2] “Facebook is rating the trustworthiness of its users on a scale from zero to 1”, Elizabeth Dwoskin, The Washington Post, August 21, 2018.
[3] « Facebook Documents Reveal Secret Elite Exempt From Its Rules, Jeff Horwitz », The Wall Street Journal, September 14, 2021.
[4] Mindf*ck: Cambridge Analytica and the Plot to Break America, Christopher Wylie, Randon House (2019). Targeted: The Cambridge Analytica Whistleblower’s Inside Story of How Big Data, Trump, and Facebook Broke Democracy and How It Can Happen Again, Brittany Kaiser, Harper (2019).
[5] «Un equipo secreto de Facebook manipula las opiniones del público», por Shelley Kasli, Great Game India (India) , Red Voltaire , 29 de diciembre de 2017.
[6] “A “Psico” Ted Cruz”, Thierry Meyssan, Tradução Alva, Rede Voltaire, 8 de Fevereiro de 2016.
[7] «The great British Brexit robbery: how our democracy was hijacked», Carole Cadwalladr, The Observer, May 7, 2017.
[8] «El ojo del Pentágono», por Thierry Meyssan, Red Voltaire , 15 de febrero de 2005.
[9] «A 61-million-person experiment in social influence and political mobilization», Robert M. Bond, Christopher J. Fariss, Jason J. Jones, Adam D. I. Kramer, Cameron Marlow, Jaime E. Settle & James H. Fowler, Nature 489, p. 295–298 (2012). doi:10.1038/nature11421.
[10] “Experimental evidence of massive-scale emotional contagion through social networks”, Adam D. I. Kramer, Jamie E. Guillory & Jeffrey T. Hancock, Proceedings of the National Academy of Sciences of the United States of America (PNSA), Vol 111, #24, July 17, 2014.
[11] «Announcing New Election Partnership With the Atlantic Council», Katie Harbath, Facebook, May 17, 2018. «U.S. think tank’s tiny lab helps Facebook battle fake social media», Joseph Menn, Reuters, August 7, 2018. «Facebook’s partnership with the Atlantic Council», Kevin Reed, World Socialist Web Site, September 8, 2018
[12] “O Facebook circunda a África”, Manlio Dinucci, Tradução Maria Luísa de Vasconcellos, Il Manifesto (Itália) , Rede Voltaire, 17 de Junho de 2020.
[13] “Mark Zuckerberg possível futuro presidente dos Estados Unidos”, Tradução Alva, Rede Voltaire, 4 de Agosto de 2017.
[14] «The Reason for the Obama Victory: It’s the Internet, Stupid», Betsy Schiffman, Wired, July 11, 2008. «Obama’s Wide Web», Jose Antonio Varga, The Washington Post, August 20, 2008. «How Chris Hughes Helped Launch Facebook and the Barack Obama Campaign», Ellen McGirt, Fast Company, April 1, 2009.
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