Manlio Dinucci: Biliões de euros para "inovar" a NATO nuclear
Rede Voltaire | Roma (Itália) | 26 de Outubro de 2021
"A NATO acabou no sótão", escreveram há um mês, os comentadores políticos em vários jornais, depois de a França ter retirado o seu embaixador de Washington em 16 de Setembro. Foi o protesto de Paris por ter sido excluído da parceria estratégico-militar entre os Estados Unidos, Grã-Bretanha e Austrália, anunciado na véspera e por ter perdido um contrato lucrativo para a venda de submarinos à Austrália, que será substituído por submarinos nucleares fornecidos pelos EUA e Grã-Bretanha. Contudo, uma semana após a sensacional rotura diplomática, o General francês Lavigne foi colocado no comando do Comando Aliado da Transformação, com sede em Norfolk nos EUA, e os presidentes dos dois países, Biden e Macron, emitiram uma Declaração Conjunta.
Biden reafirmou "a importância estratégica do compromisso francês e europeu no Indo-Pacífico" (a região que, na geopolítica de Wa-shington, se estende desde a costa ocidental dos EUA até à da Índia). A comissão militar dos Chefes da Defesa dos 30 países da NATO, reunidos em Atenas, explicou porquê: "Enquanto as acções agressivas de Moscovo ameaçam a nossa segurança, a ascensão da China está a alterar o equilíbrio do poder, com consequências para a nossa segurança, para a nossa prosperidade e para o nosso modo de vida". Perante tais "ameaças", concluiu, "precisamos que a Europa e a América do Norte estejam fortes, unidas". Como precisam de estar unidas, Biden reitera na sua declaração conjunta com Macron: "Os Estados Unidos reconhecem a importância de uma força de defesa europeia mais forte e mais capaz que complemente a NATO. Uma Europa militarmente mais forte, mas como complemento da NATO: uma aliança assimétrica, à qual pertencem 21 dos 27 países da União Europeia, na qual o cargo de Comandante Supremo Aliado na Europa é sempre ocupado por um general dos EUA, que detém todos os outros comandos-chave na Europa (como o JFC-Nápoles, com sede no Lago Patria).
Foi neste contexto que se realizou a reunião dos 30 Ministros da Defesa (pela Itália, Lorenzo Guerini, PD), em 21-22 de Outubro na sede da NATO, em Bruxelas. Criou um "Fundo para a Inovação" com uma dotação inicial de um bilião de euros, a cargo de 17 países europeus, entre os quais a Itália, mas não pelos Estados Unidos, para o desenvolvimento das tecnologias mais avançadas para uso bélico. Lançou a "Estratégia para a Inteligência Artificial", um programa ainda mais dispendioso para a NATO manter a vantagem neste campo, que está a "mudar o ambiente global da defesa", ou seja, o modo de fazer a guerra. Decidiu "o melhoramento da prontidão e da eficácia do nosso dissuasor nuclear", ou seja, a instalação na Europa, de novas armas nucleares, naturalmente com a motivação de defender-se da "crescente ameaça dos mísseis da Rússia".
Na véspera da reunião da NATO, o Ministro da Defesa russo, Sergei Shoigu, advertiu que "os Estados Unidos, com o apoio total dos aliados da NATO, intensificaram o trabalho de modernização das armas nucleares tácticas e dos seus locais de armazenamento na Europa" e a Rússia considera particularmente preocupante que "os pilotos dos países não nucleares da NATO estejam envolvidos em exercícios para a utilização de armas nucleares tácticas". Uma mensagem dirigida em particular à Itália, onde os EUA se preparam para substituir as bombas nucleares B61 pelas novas B61-12 e os pilotos italianos estão agora a ser treinados na sua utilização também com os F-35. "Consideramos esta situação ser uma violação directa do Tratado de Não-Proliferação de Armas Nucleares", concluiu Shoigu. A mensagem é dirigida à Itália e a outros membros europeus da NATO que, apesar de terem ratificado o Tratado de Não-Proliferação como países não nucleares, albergam armas nucleares dos EUA e treinam-se na sua utilização. O significado implícito da mensagem é claro: a Rússia considera estes países como uma fonte de ameaça e está a tomar contramedidas. A mensagem foi, como habitualmente, ignorada pelo nosso governo e parlamento e, claro, pelos meios dea comunicação social que colocaram a NATO no sótão.
Maria Luísa de Vasconcellos
Il Manifesto (Itália)
Comentários