Manlio Dinucci: A Lei que dá ao presidente licença para matar
Rede Voltaire | Roma (Itália) | 14 de Setembro de 2021
A 18 de Setembro de 2001, uma semana após o 11 de Setembro, o Congresso dos EUA aprovou a Lei Pública 107-40 por votação unânime bipartidária, que declarava: "O Presidente está autorizado a utilizar toda a força necessária e apropriada contra as nações, organizações, ou pessoas que ele acredita terem planeado, autorizado, cometido, ou ajudado nos ataques terroristas que ocorreram a 11 de Setembro de 2001, ou dado refúgio a tais organizações ou pessoas, a fim de prevenir qualquer acto futuro de terrorismo internacional contra os Estados Unidos da parte de tais nações, organizações, ou pessoas". O projecto de lei, que conferia ao Presidente republicano George W. Bush plenos poderes de guerra, foi elaborado pelo senador democrata, Joe Biden, presidente da Comissão de Relações Externas.
O Presidente Bush era, assim, autorizado pelo Congresso, em nome da "guerra ao terror", a usar a força militar não só contra organizações ou indivíduos, mas contra nações inteiras, cuja culpa era decretada pelo próprio Presidente, que proferia sentença sem julgamento, nem possibilidade de recurso e ordenava a sua execução imediata por meio da guerra. Os únicos que têm vindo a pedir a revogação desta lei há já algum tempo são dois senadores, o democrata Kaine e o republicano Young, mas até agora as suas tentativas não foram bem sucedidas. A Lei de 18 de Setembro de 2001, ainda em vigor, foi utilizada, após o Presidente republicano Bush, pelo democrata Obama, pelo Republicano Trump e pelo democrata Biden (antigo vice-presidente da Administração Obama). Estima-se que tenha sido utilizada para "legitimar", ao longo dos últimos 20 anos, operações militares efectuadas pelas forças armadas norte-americanas, por ordem presidencial, em 19 países do mundo, entre os quais o Afeganistão, Iraque, Líbia, Síria, Iémen, Tunísia, Quénia, Mali, Nigéria, Somália, Camarões e Níger.
Três semanas após a promulgação da Lei, o Presidente Bush ordenava atacar e invadir o Afeganistão, oficialmente para dar caça a Bin Laden, protegido pelos Talibãs; três meses depois, ordenava a abertura do campo prisional de Guantánamo, para onde eram secretamente deportados e torturados, suspeitos de terrorismo de várias partes do mundo; um ano e meio depois - motivado por uma resolução bipartidária de 77 senadores, promovida por Joe Biden - o Presidente Bush ordenava atacar e a invadir o Iraque, sob a acusação (mais tarde provada falsa) de que este possuía armas de destruição maciça. A ordem era usar o punho de ferro para esmagar a resistência, como confirmavam as imagens de tortura na prisão de Abu Ghraib, vindas à luz em 2004.
Também com base na lei de 2001 que o autorizava a "usar toda a força necessária e apropriada", o Presidente Obama, dez anos mais tarde, autorizava a CIA a realizar operações secretas na Líbia, para preparar a guerra da NATO que iria demolir o Estado líbio. Segundo o mesmo procedimento ’legal’ - documentado pelo New York Times (29 de Maio de 2012) - durante a Administração Obama, foi criada uma ’kill list’ actualizada semanalmente, incluindo pessoas de todo o mundo que tinham sido secretamente condenadas à morte sob acusação de terrorismo, as quais, após aprovação do Presidente, foram eliminadas por drones-assassinos. O mesmo procedimento foi seguido em Janeiro de 2020 pelo Presidente Trump, que ordenou a eliminação do General iraniano Soleimani, morto por um drone americano no aeroporto de Bagdade. Ataques semelhantes com drones americanos foram autorizados "legalmente" no Afeganistão, no Iraque, na Líbia, no Paquistão, na Somália, na Síria e no Iémen.
O mais recente ataque com um ‘drone-killer’ foi o que, com base na autorização do Presidente Biden, atingiu um carro suspeito de transportar uma bomba do ISIS em Cabul, a 29 de Agosto. Uma investigação do New York Times (10 de Setembro) apurou que o carro (que estava a ser seguido durante muito tempo pelo piloto do drone, a milhares de quilómetros de distância) não transportava explosivos, mas latas de água. Contra este automóvel, num bairro densamente povoado, foi disparado um míssil ’Hellfire’, que matou dez civis, entre os quais, sete crianças.
Maria Luísa de Vasconcellos
Fonte
Il Manifesto (Itália)
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