Para não ter de atender inadimplentes na pandemia, planos de saúde recusam ajuda de R$ 15 bi

Apenas nove, de um total de 695 operadoras, aderiram à proposta da ANS. “Elas são, na verdade, operadoras financeiras que veem a saúde como mercadoria para se obter lucro”, diz Alexandre Padilha

Coordenadora do programa de saúde do Idec avalia ainda que operadoras expõem inadimplentes ao "risco não é só de desassistência, o risco é de desassistência e morte"


A maioria das operadoras de plano de saúde recusou auxílio financeiro oferecido pela Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) para que atendessem clientes inadimplentes durante a pandemia do novo coronavírus. Apenas nove operadoras, de um total de 695 planos, fecharam o acordo com a ANS que prevê o repasse de R$ 15 bilhões para a manutenção dos usuários que estão em débito até o final de junho. 
A medida era uma forma também de desafogar o Sistema Único de Saúde (SUS), que, em várias capitais, está próximo de atingir o limite de sua capacidade. As principais operadoras, no entanto, preferiram recusar a reserva de recursos a ter de atender inadimplentes. 

A Federação Nacional de Saúde Suplementar (FenaSaúde), que representa 16 grupos, entre eles Amil, Bradesco Saúde, Grupo NotreDame Intermédica e Unimed, anunciou nesta segunda-feira (4) que não iria assinar o acordo porque as contrapartidas “são muitos mais danosas do que benéficas”, com “risco de inadimplência generalizada” e “aumento dos custos dos custos durante a pandemia”. 
Coordenadora do programa de saúde do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), a advogada Ana Carolina Navarrete avalia a posição das operadoras como uma “ameaça de morte”. “O risco não é só de desassistência, o risco é de desassistência e morte. Estão achando que é uma situação corriqueira, de mais ou menos regulação, não é esse o debate. O debate é de quantas vidas podem ser poupadas”, afirma Ana Carolina, em entrevista à repórter Larissa Bohrer, da Rádio Brasil Atual
“São 47 milhões de usuários”, pontua. “Quando você atende uma pessoa contaminada com Covid, está salvando aquela pessoa e as outras que poderiam estar em contato com ela”, destaca. O Brasil já soma mais de 100 mil casos da doença confirmados.

Confira a reportagem na íntegra

O ex-ministro da Saúde e deputado federal Alexandre Padilha (PT-SP) também criticou a postura dos planos de saúde. “Elas são, na verdade, operadoras financeiras que veem a saúde como mercadoria para se obter lucro, para que se possa vender apenas àqueles que podem comprar”, diz Padilha. O ex-ministro da Saúde ressalta que, neste momento de crise sanitária, o ideal seria o SUS ter controle de uma fila única de leitos disponíveis no setor privado.
“Estamos vendo uma realidade na qual muitos hospitais privados estão com baixa taxa de ocupação e não internam por dois motivos: um, porque querem ficar com os leitos vazios, porque não têm interesse em ter pacientes infectados com coronavírus em seu ambiente hospitalar. Outro, porque tiveram a redução no seu faturamento por cancelamento de cirurgias eletivas, estéticas, de exame, e, no momento, perderam seu faturamento e querem vender esse leito vazio para o Sistema Único de Saúde, que já está com a sua taxa de ocupação quase 100%”, aponta.