Analista: classe média sobe na COVID-19 e só ações do Estado irão pôr economia nos trilhos no Brasil
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A classe média brasileira cresceu negativamente com o advento do novo coronavírus, com perdas bilionárias na capacidade de consumo em 2020. Apesar disso, quem tem e terá maior responsabilidade na retomada da economia do Brasil é outra classe, é a política, segundo um analista ouvido pela Sputnik Brasil.
De acordo com um levantamento produzido pela empresa IPC Marketing e Consultoria, a crise provocada pela COVID-19 no país levará as famílias com renda de cerca de R$ 3 mil (considerada a classe C1) a perder de R$ 105 bilhões a R$ 131 bilhões em capacidade de consumo, dependendo do otimismo ou do pessimismo da análise.
Responsável pela consultoria e participante do estudo, o economista Marcos Pazzini explicou à Sputnik Brasil que a avaliação se deu com base em previsões para a economia brasileira em 2020. Se o Banco Central (BC) trabalha com uma queda do Produto Interno Bruto (PIB), que é o conjunto de riquezas do país, da ordem de aproximadamente 2%.
Entretanto, o dado nacional é bem distinto daquele projetado pelo Fundo Monetário Internacional (FMI), que espera uma queda de 5,3% no PIB brasileiro neste ano. A pesquisa considerou as duas projeções, explicou Pazzini, e a única certeza por ora é que 2020 vai ser um ano muito difícil para todo mundo. E o prejuízo não está apenas na classe média.
"Com relação à classe média encolher, na verdade não [vai ocorrer]. Nesse cenário que estamos trabalhando para 2020, só tivemos queda nos domicílios das classes A e B1, que são os que estão na classe mais alta. As demais classes, a B2, a C1, a C2, D e E tiveram aumentos na quantidade de domicílios se você for ver com o que está previsto em 2020 e o que foi verificado em 2019", explicou o economista.
O responsável da IPC Marketing e Consultoria prosseguiu na mesma linha de raciocínio, destacando que a classe média na verdade acabou inflada negativamente.
"Dessas classes todas, as que mais tiveram aumento de domicílio foram a B2 e a C2. A B2 obviamente porque recebeu domicílios das classes acima, A e B1, e a C2 que deve ter recebido domicílios da classe C1. De qualquer forma, é um sinal de migração negativa, ou seja, domicílios das classes mais bem posicionadas migrando para domicílios de classes menos favorecidas", acrescentou.
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O presidente Jair Bolsonaro e o ministro da Economia, Paulo Guedes, deixando o Palácio da Alvorada, Brasília, Brasil, 27 de abril de 2020
Considerando claro que a perda da capacidade de consumo estar ligada ao comércio (hoje travado pelas medidas de isolamento e distanciamento social) e ao trabalho (em países com alta quantidade de trabalhadores no setor de serviços, os ganhos estão vinculados à possibilidade de sair de casa e ter contato com outras pessoas), Pazzini opinou que cabe aos governantes ter um papel de liderança em prol não só da população, mas da economia como um todo.
"Tudo vai depender de a velocidade das coisas voltarem ao normal. Porque a perspectiva atual é de que haja a perda de muitos empregos e que a economia demore um pouco mais para voltar ao normal. Quanto mais os governantes, tanto [no âmbito] federal quanto estadual poderem suportar a população com ajuda financeira, trabalhos de preparação e recolocação e profissionais, mais rapidamente a economia de cada estado vai voltar aos trilhos, vai voltar ao normal, e quanto mais os estados forem voltando ao normal, obviamente o Brasil como um todo vai voltar mais rapidamente aos trilhos", declarou.
Atualmente, a grande iniciativa nacional é o pagamento de R$ 600 por parte da Caixa Econômica Federal (CEF) para algumas faixas da sociedade brasileira. Contudo, há forte embate no campo político, com o presidente Jair Bolsonaro – crítico das medidas de isolamento social – entrando em conflitos com governadores de vários estados.
O economista ouvido pela Sputnik Brasil, contudo, demonstra a crença de que a economia brasileira pode dar os seus primeiros passos rumo a uma retomada a partir de junho ou julho, dependendo das ações governamentais para barrar o avanço da COVID-19 e, gradualmente, permitir que algumas atividades econômicas possam ser retomadas com segurança. Se depender do passado recente, o otimismo se justifica.
"Estamos trabalhando com uma previsão de queda do PIB de 4,2%, e do consumo das famílias de 3,7%. Aí eu tenho que comentar o seguinte: nos últimos anos, o consumo das famílias sempre tem tido um resultado melhor do que o PIB. No ano passado, por exemplo, o crescimento do PIB foi de 1%, e o consumo das famílias cresceu quase 2%, chegou a 1,9%. Então por isso que estamos trabalhando com esse cenário de consumo das famílias não tão negativo quanto o do PIB", sentenciou Pazzini.
O especialista ainda pontuou que há muito por se fazer e, caso a queda do poder de consumo das famílias brasileiras entre todas as classes sociais atinja uma estimativa intermediária, de R$ 128 bilhões, representará a mesma capacidade de consumir que o brasileiro tinha em 2013. Ou seja, o recuo já está garantido, mas ainda não se sabe exatamente o tamanho dele.