Agricultores do Paraná são absolvidos pela Justiça e acusam perseguição de Moro

Operação Agro-Fantasma ajudou a desmontar Programa de Aquisição de Alimentos


Na sentença do último processo da operação, expedida em fevereiro deste ano pela juíza Gabriela Hardt, fica constatada a falta de provas para as acusações - Wellington Lenon
Em 2013, a Polícia Federal deflagrava a chamada operação Agro-Fantasma, com o objetivo de investigar supostas fraudes no Programa de Aquisição de Alimentos (PAA). À época, o então juiz Sérgio Moro, da 13ª Vara Federal de Curitiba, decretou a prisão preventiva de ao menos dez agricultores de 14 municípios do Paraná. Eles ficaram presos de 60 a 90 dias, antes mesmo do processo criminal.
De 2013 até 2020, a operação apresentou oito ações penais, conduzidas pelo Ministério Público Federal, tendo como acusados cerca de 40 pessoas, entre pequenos agricultores e funcionários da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab). Até meados de 2019, sete dessas ações haviam sido concluídas, com absolvição de todos os acusados.
A última ação penal envolvia a Associação Hortifrutigranjeiros do Município de Ponta Grossa. Nela, sete agricultores e um funcionário da Conab foram acusados de formação de quadrilha, estelionato, peculato e prevaricação, alguns responderam também por falsidade ideológica e falsificação de documento público. A denúncia era de que, por meio de falsidade nas declarações de aplicação dos recursos vindos do PAA, os acusados estavam desviando verbas públicas em proveito próprio.
Na sentença do último processo da operação, expedida em fevereiro deste ano pela juíza Gabriela Hardt, fica constatada a falta de provas para as acusações: “diante do panorama apresentado, reputo que não restou comprovada a materialidade dos crimes narrados na denúncia, sendo a absolvição dos acusados medida que se impõe”. A operação Agro-Fantasma chegou ao fim, assim, depois de quase sete anos, com todos os acusados absolvidos. O Ministério Público não recorreu de nenhuma sentença.
Perseguição política
Diorlei dos Santos, advogado que acompanhou os processos desde o início, explica que, através do programa, cooperativas da agricultura familiar tinham contato direto com a população das cidades atendidas, fazendo entrega de alimentos em creches, escolas e asilos. “Isso ajudou as cooperativas a terem uma relação muito boa com a sociedade. Ajudava a sociedade a enxergar as cooperativas de agricultura familiar e os assentamentos”, diz.
Criado em 2003, vinculado ao programa Fome Zero, o PAA é uma estratégia de combate à fome e à pobreza e de fortalecimento da agricultura familiar. As cooperativas alvo da operação Agro-Fantasma estavam inseridas no programa na modalidade "compra com doação simultânea”, em que o Estado efetuava a compra de alimentos produzidos por agricultores familiares e, subsequentemente, disponibilizava-os a pessoas em situação de insegurança alimentar, através de serviços de educação, saúde ou custódia.
Dentro desse contexto, na avaliação de Santos, a Agro-Fantasma veio, então, como forma de perseguição política. “Não há nenhuma justificativa plausível de conduzir os processos da forma como foi conduzido, com prisão preventiva, com instrução do Ministério Público Federal e tantas ações penais propostas. O crime tem que ter materialidade e não era o caso. Havia uma intencionalidade política de atacar o programa, de desmoralizar as pequenas cooperativas e deixar o programa refém dessas acusações. Foi o que aconteceu”, diz o advogado.
Desmonte do programa
O ano de início da operação Agro-Fantasma, 2013, marca também o aparecimento mais escancarado do acirramento ideológico no Brasil. Foi um ano marcante para a desestabilização do governo de Dilma Rousseff (PT) e para o crescimento do discurso de combate à corrupção, que se materializou mais concretamente no ano seguinte, com a operação Lava-Jato, também encabeçada por Sergio Moro.
Em dissertação de mestrado da Faculdade de Direito da Universidade Federal do Paraná (UFPR), Juliana de Oliveira Sales aponta o PAA como “objeto central e relacionado aos progressos promovidos pelas alas partidárias da esquerda quando estavam no poder”.
“O Programa de Aquisição de Alimentos representa um reflexo dos enfrentamentos ideológicos havidos no Brasil atual [...] favorecendo, na raiz, a um modelo alternativo e que não tem plena correspondência com os princípios da produção capitalista, que é pautada na produtividade e em comutar bens ambientais em produtos de mercado”, escreve Sales.
Desde 2013, com as mudanças no cenário político e o início da operação Agro-Fantasma, o PAA vem sendo sufocado. De acordo com estudo disponibilizado pela Conab, anualmente o programa apresenta queda nos investimentos: em 2014, foram investidos R$ 338 milhões; em 2015, foram R$ 287,5 milhões; em 2016, R$ 197,5 milhões; em 2017, R$ 124,7 milhões; e em 2018 (ano do último relatório disponível), foram investidos R$ 63,3 milhões, valor menor que o investimento feito em 2003, que foi de R$ 81,5 milhões 
Em 2013, o programa atendia 524 municípios em diferentes regiões do Brasil. Em 2018, foram 382 municípios atendidos. No Paraná, em 2013 eram 399 municípios atendidos pelo programa. Já em 2018, o número caiu para 13 municípios.
“A tática do governo, nos últimos tempos é, na prática, ir finalizando a política pública não disponibilizando orçamento. Foi o caso do PAA. Ele existe legalmente, instituído por Lei Federal, mas diminuiu o orçamento. E diminuindo orçamento, a política não se efetiva. Então, ela cessou bastante”, explica o advogado Diorlei dos Santos.
Fonte: BdF Paraná
Edição: Ana Carolina Caldas