Venda de estatais como Correios e Telebras põe soberania e desenvolvimento em risco

Ao incluir empresas na lista de privatizações, Bolsonaro abre mão de patrimônio público lucrativo e estratégico


A Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos está presente em quase todas as cidades do Brasil - Créditos: Marcelo Camargo | Agência Brasil
A Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos está presente em quase todas as cidades do Brasil / Marcelo Camargo | Agência Brasil

Nove empresas federais foram incluídas no Plano Nacional de Desestatização (PND) do governo federal, na semana passada, entre elas os Correios, a Telebrás, o Porto de Santos, a Empresa de Tecnologia e Informações da Previdência Social (Dataprev) e o Serviço Federal de Processamento de Dados (Serpro).
Também foram abertos processos de desestatização da Agência Brasileira Gestora de Fundos Garantidores (ABGF), da Empresa Gestora de Ativos (Emgea), do Centro de Excelência em Tecnologia Eletrônica Avançada (Ceitec) e da Companhia de Entrepostos e Armazéns Gerais de São Paulo (Ceagesp).
O governo também pretende conceder à iniciativa privada a Lotex, serviço de Loteria Instantânea Exclusiva, e a venda de 20 milhões de ações excedentes da União no Banco do Brasil. Com isso, já são 18 o número de ativos federais (empresas, ações e serviços) incluídos no Programa de Parcerias e Investimentos (PPI), para serem futuramente privatizados.
Enquanto o presidente Jair Bolsonaro (PSL) faz um discurso inflamado em favor da soberania nacional, depois de receber duras críticas de outros países pelo alto índice de incêndios na Amazônia, o maior dos últimos anos, por outro lado o seu governo abre mão de um patrimônio nacional altamente estratégico.
É o caso, por exemplo, da Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos (ECT), a mais antiga do Brasil, com 356 anos de existência. Em nota pública, o Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação (FNDC) condenou a tentativa de privatizar a estatal.
“Empresa estratégica para garantir que entregas ocorram em todo o país, mesmo em localidades remotas ou de risco. É uma companhia que tem presença em praticamente todos os municípios, que pode abrigar serviços de interesse públicos. Além disso, é uma estatal lucrativa, que encerrou o ano de 2018 com lucro líquido de R$ 161 milhões”, diz a nota.
Além disso, os Correios atuam na logística de distribuição das provas do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) e de vacinas. Sua privatização pode prejudicar ou encarecer esses serviços, que são de interesse público.
A soberania do país também está sob o risco com o avanço da desestatização da Telebras. Segundo o FNDC, a medida pode implicar em vulnerabilidade de informações de Estado, já que a Telebras comanda o mais importante satélite do país.
“Com a privatização total da Telebras (parte dela já foi vendida em 1990), outra das empresas incluídas na lista de desestatização, o governo vai abrir mão de pelo menos dois ativos importantes para o desenvolvimento nacional: a rede de fibra ótica espalhada pelo território nacional e o Satélite Geoestacionário de Defesa Estratégica (SGDC). Como o próprio nome indica, trata-se de uma ferramenta essencial para a segurança nacional”.
Segundo a entidade, a Telebras “também cumpre papel fundamental para a soberania na área da conectividade e para a adoção de políticas de inclusão digital em regiões que não despertam interesse econômico das empresas privadas”.
Nesse segundo caso, uma eventual privatização pode tornar ainda mais difícil a expansão da internet banda larga para as regiões mais remotas do país, que só contam com esse serviço quando oferecidos diretamente pelo governo.
Desenvolvimento
Menos conhecidas por parte da população, outras empresas também estratégicas para o desenvolvimento tecnológico do Brasil estão na mira do governo, entre elas o Centro de Excelência em Tecnologia Eletrônica Avançada (Ceitec), que fabrica circuitos integrados. Também sob ameaça de privatização estão a Empresa de Tecnologia e Informações da Previdência (Dataprev) e o Serviço Federal de Processamento de Dados (Serpro), duas estatais que prestam serviços de tecnologia em informática ao próprio governo e são lucrativas (o Serpro e lucrou R$ 459 milhões no ano passado).
“Trata-se de abrir mão de tecnologia própria para comprar soluções de terceiros. Na chamada sociedade da informação, do mundo interligado pela revolução 4.0, nosso país caminha na contramão ao abdicar da possibilidade de desenvolver tecnologias neste campo e ser apenas um consumidor passivo. Esta é uma política suicida, pois vai ampliar a distância que separa o Brasil das demais nações que investem em pesquisa e tecnologia”, diz o FNDC.
No caso do Serpro e da Dataprev, há um outro problema grave. As duas empresas hospedam atualmente os dados do Imposto de Renda e da Previdência Social, respectivamente. Esses dados poderão passar a ser hospedados em servidores privados com a desestatização das empresas, pondo em risco a soberania do país sobre informações extremamente sensíveis, argumenta o FNDC.
Edição: João Paulo Soares