A derrota do neoliberalismo e do FMI, a moratória argentina e o futuro da região

 
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Por Aram Aharonian e Horacio Rovelli - na Carta Maior - 06/09/2019

Poucos fatos surpreendem esta região que alguma vez foi chamada de “fazenda do mundo”, hoje cheia de indigentes e trabalhadores lançados à miséria pelas políticas sociais e econômicas do governo neoliberal de Mauricio Macri.

Na quarta-feira (4/9), movimentos sociais e sindicais da capital argentina e da Grande Buenos Aires realizaram manifestações contra a crise alimentar no país, pedindo pela abertura de programas sociais e mais e melhores alimentos para os restaurantes populares, que trabalham diariamente para garantir ao menos uma refeição a centenas de milhares de crianças. Instalaram uma barraca na frente do Congresso com a intenção de permanecer no lugar até que se sancione a lei de emergência alimentar, enquanto se organizam a distribuição de comida para pessoas na badalada Avenida 9 de Julio.

A avalanche popular na Argentina, expressado nas eleições primárias do dia 11 de agosto, também modificou o polo de gravidade das próximas eleições presidenciais da Bolívia e do Uruguai – que também ocorrem no mês de outubro. A ratificação de mais um mandato de Evo Morales e a eventual continuidade da Frente Ampla podem ganhar outro significado, em um novo contexto sul-americano.

O resultado das primárias na Argentina são o reflexo da situação no país: 68% dos eleitores votou contra a política econômica macrista. O governo neoliberal de Mauricio Macri recebeu uma economia desendividada, e entregará um país em moratória. O ministro da Fazenda, Hernán Lacunza, tentou maquiar a situação dizendo que é uma “reestruturação voluntária ameaçar o capital e os juros”.

O dia 28 de agosto de 2019 entrará para a história da Argentina de 2019 como o dia em que o governo de Macri reconheceu que, depois de liderar o mais vertiginoso ciclo de endividamento já vivido pelo país, já não pode cumprir com os pagamentos de capital e interesses nas condições pactuadas. O ministro da Fazenda, Hernán Lacunza, informou que haverá uma ampla reestruturação dos pagamentos de curto e longo prazo, incluindo o empréstimo do Fundo Monetário Internacional (FMI), o que significa que o governo duvida da própria capacidade de pagar a dívida pública.

Numa mudança radical em suas políticas econômicas, o governo neoliberal de Mauricio Macri dispôs, no domingo, de um decreto de necessidade e urgência que impôs limites às compras e transferências de divisas (até 10 mil dólares)até o fim de ano, para tentar convencer o FMI entregue a última parte de um empréstimo que ajudaria a impulsar as medidas até o dia 10 de dezembro, dia em que termina o atual mandato constitucional. Ainda assim, foi publicado um decreto que proibiu as empresas de comprar dólares com fins de acumulação, e se reduziram os prazos para que os exportadores liquidem, no mercado local, as divisas obtidas em suas operações. Desde 2016, muitas empresas não estavam liquidando, e para isso contaram com a cumplicidade do governo.

As novas regulações sobre o acesso ao mercado cambiário que impôs o Banco Central, que não significaram mudanças substantivas na cotização das divisas, começaram a valer quando quase todos os capitais especulativos chegados ao país nos últimos três anos já haviam fugido do país. Entre janeiro e julho, a saída total desses investimentos foi de 3,5 bilhões de dólares, e desde abril de 2018, quando começou o processo de desvalorização, foi de 10,8 bilhões.

Entre os dias 12 e 22 de agosto, as reservas internacionais do Banco Central argentino passaram de 66,4 bilhões a 59,8bilhões de dólares, sem contar que as de livre disponibilidade são uma quinta parte de dessas reservas brutas.

Mas o caminho não parece ser tão simples: no diretório do FMI, Itália, Suécia e Holanda se opuseram à proposta de entregar mais dinheiro ao país, a última parte do empréstimo já acordado. Os três membros, que representam um total 29 países ecerta de 12% dos votos no organismo, propõem um adiamento da avaliação para o próximo envio de recursos, para depois das eleições, ou até mesmo da sucessão presidencial. Consideram que governo de Macri violou os termos do programa pactuado com o organismo e exigem que se suspenda o desembolso dos 5,4 bilhões de dólares, previsto para o dia 15 de setembro.

A tragédia de Macri afeta também a figura da ex-gerente do FMI, a economista francesa Christine Lagarde – que concorre como candidata principal para ser a próxima diretora do Banco Central Europeu –, já que esse caso é o principal questionamento à sua gestão no Fundo, ao ficar evidente que ela cedeu às pressões dos Estados Unidos para continuar emprestando recursos ao governo de Macri, mesmo sabendo que o país não poderia pagar, e também exigindo cada vez mais ajustes econômicos a um país que está no limite da convulsão social.

Hoje, os Estados Unidossão o único país disposto a salvar Macri, porque precisam dele como sócio, ainda mais neste momento em que a figura do presidente brasileiro, o ultra direitista Jair Bolsonaro, está despencando. O apoio estadunidense e seu poder de veto mantêm viva a esperança do governo em receber os fundos necessários para continuar o programa de ajuda financeira.

O ministro Lacunza anunciou que 90% do estoque de dívida (em pesos e em divisas estrangeiras) que estão em poder de bancos, fundos de investimento e organismos institucionais, e que vencem nos próximos quatro meses (equivalentes a cerca de 23,5 bilhões de dólares) serão cancelados da seguinte forma: 15% no dia do vencimento, 25% após 90 dias,e os 60% restantes após 180 dias, respeitando as demais condições originais do crédito. Os 10% restantes está em poder de pessoas físicas, e serão respeitadas as condições do acordo.

O governo de Mauricio Macri pode apresentar a moratória assim, como um mero “remanejamento” da dívida, mas não pode esconder que é uma decisão arbitrária, já que a verdade é que não conta com os recursos para realizar os pagamentos dos títulos de dívida que adquiriu irresponsavelmente. O capital financeiro e a política de endividamento fazem com que a cada sete anos a sociedade argentina tenha que viver uma derrapada da sua moeda (e, com isso, o valor do seu trabalho e dos seus ativos também diminui).

Os exemplos são vários: a crise de 1975, pouco antes do início da ditadura, a de 1982, simultânea à Guerra das Malvinas, a da hiperinflação de 1989, que levou ao fim antecipado do governo de Raúl Alfonsín, a do Efeito Tequila, em 1995, e finalmente a de 2001, com o corralito impulsado pelo governo de Fernando de la Rúa. Após 12 anos de administração kirchnerista – período em que o país não se endividou e ainda por cima conseguiu reestruturar a dívida herdada, e com uma importante diminuição do valor total e a prolongação dos prazos de pagamento –, a Argentina volta a cair numa situação de endividamento e destruição da moeda local, como resultado da política econômica do atual governo.

Vazio de poder?
O recado dos enviados do FMI que visitaram a Argentina, na semana passada – liderados pelo diretor do Departamento do Hemisfério Ocidental, Alejandro Werner, quem, antes de partir, deixou transcender a opinião de que não há um poder político estabelecido para negociar – foi claro: nas atuais condições, não pode haver outro desembolso do organismo, e tudo dependerá, em última instância da decisão do presidente estadunidense Donald Trump.

O magnata-presidente não disse uma só palavra, nem enviou um tuíte sobre a Argentina desde o dia 11 de agosto, quando soube que seu “amigo argentino” acabava de dilapidar a oportunidade de governar e acatar suas ordens durante outros quatro anos.

O curso político da Argentina será determinante de um eventual renascimento do ciclo progressista, sempre e quando o novo governo, que assumirá no dia 10 de dezembro (caso não aconteça nada estranho no meio do caminho), se disponha a seguir um novo rumo, diferente da atual tragédia econômica e social, e promova o ressurgimento dos organismos regionais de integração e coordenação política e complementação econômica, que os governos neoliberais congelaram e/ou tentaram aniquilar.

Contudo, também é preciso dizer que as eleições primárias servem apenas como termômetro. O primeiro turno das eleições será no dia 27 de outubro, e tudo indica que a frente antimacrista encabeçado por Alberto Fernández e Cristina Fernández de Kirchner arrasará, sem precisar passar por um segundo. Porém, vale a pena manter a cautela, já que ninguém está eleito ainda, mesmo que exista uma sensação de que o novo governo já está chegando.

O que ficou demonstrado é que a grande maioria da população argentina rechaça o modelo de subordinação ao capital financeiro e ao FMI, mas a candidatura vencedora, cautelosa, falou apenas em reestruturação do acordo, e ninguém disse nada sobre uma auditoria da dívida (como a que fez Néstor Kirchner em 2003) e muito menos em deixar de pagar, que é a exigência dos movimentos sociais.

Somente em 10 de dezembro, quando assumirá o novo governo, haverá uma resposta para essa questão. Até lá, muita coisa ainda pode acontecer. O governo atual está nocauteado, uma aliança neoliberal que provavelmente desaparecerá, deixando essa sensação de vazio de poder que já está instalada, e que obrigou o FMI a propor um ménage à trois: negociar com o eventual próximo governo a entrega a última parte do empréstimo acordado com o macrismo.

Apesar de o Banco Central ter vendido 9,3 bilhões de dólares em reservar entre 12 e 28 de agosto, o dólar subiu em mais 3%, o valor das ações despencou e o risco país alcançou os 2346 pontos. O FMI preferia começar a negociar desde já com Alberto Fernández, sobre as condições do novo desembolso, mas isso não foi possível: o candidato é precisamente isso, candidato.

A equipe econômica de Fernández manifestou à delegação do FMI sua disposição de “reformular os acordos sem exigir mais esforços ao nosso povo”, sem metas nem reformas, e deixando claro que nenhum dos quatro principais objetivos do acordo foi alcançado. Na realidade, tudo piorou: a economia caiu 1,7%, a dívida pública subiu para 29% do PIB, o desemprego chegou aos 10,1%, a pobreza passou dos 32% e a inflação se disparou, até os 53,9%.

Ademais, esses dólares que o FMI proporcionou, com numerosos desembolsos, tiveram como destino a fuga de capitais argentinos,ou a reversão de investimentos estrangeiros especulativos, algo que o próprio FMI tinha proibido por estatuto. Entre os dias 1º de janeiro de 2016 e 31 de julho de 2019, a Argentina assistiu a fuga de 73,2 bilhões de dólares.

Os eventuais triunfantes tampouco indicaram, até o momento, como se retomarão o caminho do crescimento e a melhora da redistribuição de renda, em um país que carece de recursos e precisa refinanciar sua dívida com o FMI.

Os perdedores
Outro tema crucial é o Tratado de Livre Comércio do Mercosul com a União Europeia, que Macri de Bolsonaro anunciaram com pompa e circunstância, como se fosse algo já concluído, e o mostraram como uma prova de que conquistaram um lugar no mundo – e que, na verdade, está muito perto de naufragar. Será preciso embaralhar de novo as cartas dessa negociação, sobretudo devido à postura subimperialista do novo governo brasileiro, protegido pelos Estados Unidos. A derrota nas primárias não foi somente a queda do neoliberalismo populista-burguês argentino, mas também a das receitas do FMI e do próprio presidente Donald Trump, que não consegue nem tuitar sobre o fracasso de quem ele apoiou, um presidente regional que tanto fez para defender seus interesses durante três anos e meio.

Trump foi quem impôs ao FMI a ajuda financeira à Argentina, para contar com um fiel subordinado no Cone Sul, decidido a abraçar as agressões contra a Venezuela e o Irã, alvos das estratégias geopolíticas de Washington. Satisfazendo as necessidades dos Estados Unidos e de Israel. Macri já havia cumprido a tarefa de considerar o Hezbollah como grupo terrorista, e preparava definições pró-israelenses mais contundentes, quando se deu a derrota eleitoral.

Se algo deve ser destacado no caso da Argentina é que o país está há quase 36 anos em um processo de recuperação das instituições, período no qual tem se apegado firmemente às formalidades democráticas.

Em seus últimos discursos esquizofrênicos, o derrotado Mauricio Macri vem tentando semear o medo, querendo responsabilizar o kirchnerismo pelo caos existente, e depois buscando ajuda, procurando estabelecer um pacto de governabilidade compartilhada com Alberto Fernández. Para esclarecer: este, embora tenha ganho tranquilamente as eleições internas, ainda não foi eleito para nenhum cargo.

A votação gigantescamente a favor do peronismo se produziu graças a uma plataforma oferecida pela mais lúcida líder política do país, a ex-presidenta Cristina Fernández de Kirchner, que sacrificou sua candidatura presidencial para possibilitar a unidade antimacrista. Por sua parte, o governo incentivou o ódio, o ressentimento de classe contra os pobres, e alimentou o medo. Tentou demonizar os governos kirchneristas e conseguiu instalar o ódio à política. Porém, gerou um efeito colateral, o ódio também ao chamado poder fático, o dos grandes empresários e seus testas-de-ferro.

Mauricio Macri não aprendeu a lição da madrasta da Branca de Neve e seu espelho mágico. Seu maior problema foi ter se nutrido de suas próprias mentiras, ficando cego em meio a tantas fantasias, fake news, pesquisas de opinião internas, trolls de redes sociais e focus grups. O tsunami de votos também afetou outros candidatos direitistas que especularam com o mal-estar popular, mas que não conseguiram convencer a população: o problema é o modelo, e também quem o executa.

A única verdade é a realidade
Em termos socioeconômicos, a situação do país continua se deteriorando, o que está refletido em uma crescente desigualdade social, fruto de uma duplicação dos níveis de pobreza e indigência, junto com uma maior concentração da riqueza. Os trabalhadores perderam mais de 30% de seu poder aquisitivo e a dívida externa é seis vezes maior que no começo do mandato.

Graças aos Kirchner, o país voltou a crescer com base no mercado interno, e também devido aos acordos estratégicos fortalecidos durantes essas gestões, com entidades como o Mercosul, a Unasul (União de Nações Sul-Americanas) e a CELAC (Comunidade dos Estados Latino-Americanos e Caribenhos), organismos de integração e complementação regional, que Macri trabalhou fortemente para aniquilar.

Os dois presidentes anteriores a Macriaumentaram as exportações,e sobretudo as de manufaturas de origem industrial. Houve redistribuição de renda a favor dos trabalhadores. Porém, obviamente, os principais capitais se mantinha, e ainda se mantêm no poder, com a minoria beneficiada pela ditadura de Videla-Martínez de Hoz (1976-1983), e associada ao capital estrangeiro, fundamentalmente dos Estados Unidos, ainda sendo fator preponderante.

A prioridade para os peronistas-kirchneristas é vencer as eleições de 27 de outubro, ainda que sem apresentar publicamente nenhum plano de governo, mesmo que alguns de seus representantes assegurem concordar com um documento de 14 pontos,apresentado pelo empresariado industrial.

Tudo isso constitui o cenário dessa terceira grande crise que o país deve atravessar desde a recuperação institucional (1983). A primeira foi a hiperinflação alfonsinista (1989), sucedida pelo governo neoliberal de Carlos Menem, e logo pela crise do corralito (2001), durante o governo de Fernando de la Rúa, que abriu as portas a um período de transição do qual emergiu o progressismo, das mãos de Néstor Kirchner.

A Argentina vive o que se chama de “estagflação” (inflação com estagnação). Em todas as situações anteriores, a “solução política” foi voltar a restabelecer o “equilíbrio do velho sistema”, caracterizado por um capitalismo decadente e uma democracia insuficiente. De não mediar circunstâncias excepcionais, é muito provável que esta situação derive em um governo que esteja a meio caminho entre o liberalismo menemista e o progressismo kirchnerista.

Essa burguesia rentista e parasitaria do Estado que a Argentina suporta hoje em dia é filha do ditadura civil-militar e seu genocídio. A façanha dos Kirchner foi torná-la menos parasita, menos rentista e mais produtiva, tentando demonstrar que ganhariam mais com a geração de valor agregado.

As cifras falam por si só. Segundo os fabricantes de automotores, foram produzidas em 2013 mais de 790 mil unidades, enquanto em 2018 esse número caiu para pouco mais de 466 mil. De acordo com os produtores de geladeiras, em 2013 foram fabricadas1,05 milhão de unidades, e somente 417 mil em 2018. Em 2013, a Argentina consumiu 12,5 mil toneladas de cimento, e no ano passado, essa cifra baixou para 9,8 mil. O país tinha quase o pleno uso da capacidade instalada, com altos níveis de emprego e salário, situação que foi se diluindo no atual governo.

O processo inflacionário se gera porque a burguesia argentina, com mercados muito “cartelizados”, onde poucas (eàs vezes uma só) grandes empresas são as que produzem determinado bem (aço, alumínio, petroquímica, laboratórios, açúcar, erva mate, leite e derivados, farinha, óleos e azeites, entre outros), e preferem, diante de uma demanda interna sustentável, aumentar os preços em vez de aumentar a produção.

E os principais empresários, que se acreditam capazes de reordenar a economia argentina a seu favor, conspiram contra o governo nacional e popular, ou ao menos tentam dividi-la, apoiando a chamada “larga via do meio”, sempre com o apoio da embaixada dos Estados Unidos – a mesma que preparou a tomada do poder pela direita em 2015, liderada por Mauricio Macri, esse filho (não pródigo, claro) que só conseguiu gerar negócios para os amigos e para o capital financeiro internacional, endividando o país em dólares e a curto prazo.

O resultado não podia ser outro que não o desastre cambiário iniciado em 25 de abril de 2018, com a compra, no mercado de câmbio local, de 1,2 bilhão de dólares a um preço médio de 20,20 pesos (16 meses depois, a cotação do dólar já supera os 60 pesos), realizado basicamente pelas mesmas entidades que propiciavam a colocação de títulos de dívida argentinos no exterior (JP Morgan, Morgan Stanley, HSBC, Deutsche Bank, Merill Lynch, entre outros).

É aí que a burguesia argentina, encabeçada pelos grupos Techint e Arcor, junto com os principais referentes da União Industrial Argentina (UIA), propiciaram um plano de 14 pontos, difundido no dia 4 de julho de 2018, onde se impulsa o crescimento industrial e a proteção do mercado interno, mas com os salários medidos em dólares, que deviam ser menores que os do Brasil, que obviamente nem se aproximam aos da Alemanha ou dos Estados Unidos.

A resposta imediata do governo foi difundir um escândalo de corrupção ligado à gestão da Secretaria de Obras Públicas durante os governos de Néstor e Cristina Kirchner, uma reprodução do que se vê no Brasil com o Caso Odebrecht, sobre o pagamento de comissões pelos principais empresas que possuem contratos do Estado, incluindo empresários como o primo do presidente Macri, Ángelo Calcaterra.

Os empresários acabaram entendendo que não tinham espaço no cenário desenhado pelo capital internacional para a Argentina. Ainda conservam um pequeno espaço –nas jazidas de hidrocarbonetos de Vaca Muerta ou na produção de grãos eem sua industrialização –, mas esses negócios também interessam às multinacionais.

O governo de Mauricio Macri está perdido, sujeitado ao FMI, que já o está abandonando, e tentando não ser afetado pela crise. Os resultados econômicos, sociais e políticos demonstram que os níveis de desinvestimento são alarmantes: mais de 13% do PIB (o país não consegue gerar fundos para a amortização das máquinas e equipamentos do aparato industrial) e o consumo caiu, acompanhando o desemprego e a queda também no poder de compra dos salários.

O governo macrista dependia desse último desembolso do FMI, programado para setembro, com um valor de pouco mais de 5,4 bilhões de dólares, para poder pagar os vencimentos de títulos até o final deste ano, e não cair na falência completa. Mas o mais provável, diante do temor dos representantes do Fundo, é que estes recursos não chegarão ao país em 2019.

O fim do deslegitimado e abandonado governo macrista está marcado pelo descontrole das variáveis econômicas internas e externas, com níveis de desocupação e de pobreza que se assemelham ao do fim do governo de Raúl Alfonsín, em 1989, ou o de Fernando de la Rúa, em2001. Agora, Macri que espera que o FMI (ou seja, os Estados Unidos) não o abandone totalmente. A postura dúbia do FMI nos últimos dias tem uma estratégia clara, mas que não tem a ver com o atual governo: querem condicionar o futuro presidente e mantê-lo sob sua dependência.

O “vazio de poder” torna estéril qualquer medida, e mais ainda as tomadas pelo governo macrista, que significam uma moratória encoberta, de conseqüências severas para a sociedade, e condicionamentos para o próximo governo, ainda mais se tratando de um país quebrado. A pergunta que fica é: será que Macri consegue chegar se manter no poder até o dia 10 de dezembro?

Aram Aharonian e Horacio Rovelli são analistas do Centro Latino-Americano de Análise Estratégica (CLAE)

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