Carnaval começa em ritmo de Bolsonaro; bloco repudia PM que chamou Lula de “vagabundo”; veja vídeos
Por VIOMUNDO - 02/03/2019 - 19:45
Foto Facebook Bloco 77 |
Homofobia: Tchanzinho registra agressões contra homossexuais e repudia ação da PM: ‘Incitação de intolerância’
O tradicional bloco do Carnaval de BH Tchanzinho Zona Norte, ameaçado durante cortejo que reuniu cerca de 70 mil pessoas, na noite de sexta-feira (1º), registrou aumento de casos de homofobia após a intervenção da Polícia Militar.
A atração informou neste sábado que levará o caso ao Ministério Público e à Corregedoria da Polícia Militar.
A confusão ocorreu por volta das 20h, quando o chefe do policiamento do evento, capitão Lisandro Sodré, abordou organizadores do bloco ameaçando retirar a segurança caso gritos contra o presidente da República, Jair Bolsonaro (PSL), não fossem interrompidos.
“Ele [capitão Sodré] subiu no trio e disse que não queria gritos contra o Bolsonaro e nem a favor do Lula, que, na opinião dele é um preso, vagabundo e condenado”, contou, ainda ontem, ao BHAZ Lilian Macedo, organizadora da atração.
Hoje, o bloco emitiu nota oficial (veja na íntegra abaixo) revelando que casos de homofobia se intensificaram na atração após a abordagem do capitão.
“Não é à toa que os casos de violência homofóbica e se multiplicaram no desfile do bloco após a intervenção de Sodré, chegando ao triste momento em que tivemos que atender, no trio, um amigo ensanguentado após ser chamado de viado e ser agredido a socos por conta de sua orientação sexual”, afirmaram.
O cortejo precisou, ainda, ser encerrado antes do local e horário previstos “para a garantir da segurança dos presentes”, segundo a organização do bloco.
‘Incitação de atos de intolerância’
No posicionamento, o Tchanzinho Zona Norte reforça que tem sete anos de existência e é “um bloco que respeita e defende a democracia e a liberdade, só dobrando o joelho para rebolar o bumbum até o chão. Não nos rebaixaremos diante de atitudes de intolerância e desrespeito à diversidade de ideias e de expressão”.
“Acreditamos que atitudes como a do capitão Lisandro Sodré, ao contrário de estimular uma convivência pacífica entre pessoas de posicionamentos políticos divergentes (como sempre ocorreu em nossos desfiles), se presta à incitação de atos de intolerância por parte de foliãs e foliões, que se vêem legitimado por atitudes de semelhante intolerância vindas de uma instituição pública de tamanha importância, como é o caso da Polícia Militar”, complementa.
A nota também fala sobre o comprometimento do bloco durante os diálogos com a Belotur, reconhecendo “a importância da PM para o Carnaval de BH”. “Seguimos à risca as recomendações da PM para o desenrolar do desfile, reconhecendo a experiência de uma instituição que vem atuando há anos no setor de segurança pública em nosso Estado”.
A atração reitera, ainda, ser um bloco político, que “nasceu e cresceu em um movimento de reação a imposições políticas de cerceamento de liberdades individuais, de ocupação dos espaços públicos por pessoas comuns e corpos brincantes durante a folia carnavalesca, durante a gestão de nosso ex-prefeito Márcio Lacerda”.
‘Ato provocativo’
Procurada novamente pelo BHAZ, a Polícia Militar reforçou o apoio à ação do capitão. “Qualquer ato provocativo de qualquer pessoa que tenha a legitimidade das massas diante de uma multidão da qual não tem controle, é uma atitude irresponsável que pode gerar violência e até mortes. Se o policial perceber que há qualquer risco, ele deve intervir para impedir o conflito”, afirmou o porta-voz, major Flávio Santiago.
Sobre a fala de Sodré contra Lula, que na opinião dele é “um preso, vagabundo e condenado”, o major destaca que “não há confirmação de que o policial tenha dito essas palavras”. “Mas que, de forma geral, independentemente da opinião polícia, durante o serviço, o militar age de forma a manter e garantir direitos. Ele é a personificação do Estado e tem que estar acima das pessoais”, afirma.
Questionado sobre a ameaça do policiamento ser retirado do local, o major destaca que essa atitude também não foi confirmada, mas que, “de modo geral, a Polícia Militar vai sempre se manter ativa e, quando for necessário, pode fazer uso gradativo da força para fazer com que a ordem seja estabelecida”.
Veja a nota do Tchanzinho na íntegra:
“O Carnaval do Tchanzinho é um carnaval de paz. Nosso carnaval é frequentado por famílias, crianças, jovens, adultos e idosos que buscam na folia carnavalesca compartilhar momentos de alegria e diversão. Durante todo o ano, participamos de campanhas e atos que fomentam e promovem o respeito à diversidade e o diálogo como saída para vivermos em um país onde a onda de ódio vem se avolumando a cada dia.
O bloco sempre foi e será um bloco político, pois o Tchanzinho Zona Norte nasceu e cresceu em um movimento de reação à imposições políticas de cerceamento de liberdades individuais e de ocupação dos espaços públicos por pessoas comuns e corpos brincantes durante a folia carnavalesca, durante a gestão de nosso ex-prefeito Márcio Lacerda.
Temos um histórico de 7 anos de um bloco politizado em sua essência e raríssimos foram os episódios de violência vivenciados em nossos desfiles. Nossos posicionamentos políticos não ferem a existência do próximo, não promovem a intolerância e a eliminação da diversidade, como o fazem vários discursos com os quais compactuam grupos que estão representados hoje, inclusive, na presidência da República, espalhando-se, consequentemente, com velocidade assustadora entre diversas camadas da população.
Neste contexto repudiamos o autoritarismo da Polícia Militar, representada na figura do capitão Lisandro Sodré, e pedirá aos órgãos competentes, como Corregedoria da Polícia Militar e Ministério Público, que se manifestem e tomem providências sobre o autoritarismo do policial e a tentativa de censura manifestada pela PM durante o desfile do Tchanzinho Zona Norte em 2019.
Durante o desfile, na noite de sexta-feira, o militar tentou determinar o que poderia ser cantado pelo bloco e quis impedir manifestações políticas. Sodré chegou a ameaçar que caso o bloco continuasse com as manifestações políticas ele retiraria o Policiamento do local. Tal atitude implicaria em risco a segurança das 70 mil pessoas que acompanhavam o bloco, mesmo com a forte chuva que nos acompanhou durante quase todo o trajeto.
Quando o trio elétrico ainda estava em concentração, o capitão subiu na escada de acesso ao veículo e disse – em tom autoritário – aos organizadores que eles teriam que parar com os gritos e músicas críticos ao presidente Jair Bolsonaro. O policial também disse que não toleraria manifestações favoráveis ao ex-presidente Lula.
Sodré foi questionado por integrantes do bloco se a posição era oficial da Polícia Militar ou um posicionamento pessoal. Depois de muita insistência, ele disse que era uma posição dele. Questionado, ele disse que a ameaça dele não era uma ameaça à liberdade de expressão, pois o bloco estava fazendo “a defesa de um vagabundo”, se referindo ao ex-presidente Lula.
A ameaça de usar o efetivo da polícia como chantagem para satisfazer seus caprichos e ideologias pessoais demonstram um total descompasso com a função pública da Polícia Militar, que deveria estar ali para garantir a convivência das pessoas em sua diversidade. O Tchanzinho Zona Norte é um bloco que respeita e defende a democracia e a liberdade, só dobrando o joelho para rebolar o bumbum até o chão. Não nos rebaixaremos diante de atitudes de intolerância e desrespeito à diversidade de ideias e de expressão.
As críticas a um governo envolvido com corrupção até o pescoço – como é o caso do governo Jair Bolsonaro – e com o que há de mais sujo e sanguinário na política nacional – os grupos milicianos, que são grupos de extermínio e esquadrões da morte financiados por dinheiro ilegal – já deveriam ser motivos suficientes para a indignação de qualquer pessoa e instituição que se diga “de bem”.
Apesar disso, o Tchanzinho Zona Norte sempre se comprometeu com o respeito às diferenças e, portanto, pessoas que compactuam com as orientações políticas do bloco ou não, são e sempre foram muito bem vindas em nossa festa, desde que não reproduzam discursos e práticas de violência e de intolerância. Não é à toa que realizamos nosso desfile em ambiente aberto, de forma gratuita e o divulgamos amplamente em nossas redes sociais e nas mídias tradicionais.
Acreditamos que atitudes como a do capitão Lisandro Sodré, ao contrário de estimular uma convivência pacífica entre pessoas de posicionamentos políticos divergentes (como sempre ocorreu em nossos desfiles), se presta à incitação de atos de intolerância por parte de foliãs e foliões, que se vêem legitimado por atitudes de semelhante intolerância vindas de uma instituição pública de tamanha importância, como é o caso da Política Militar.
Não é à toa que os casos de violência homofóbica e se multiplicaram no desfile do bloco após a intervenção de Sodré, chegando ao triste momento em que tivemos que atender, no trio, um amigo ensanguentado após ser chamado de viado e ser agredido a socos por conta de sua orientação sexual. Após um suspeito spray de pimenta (qual cidadão comum possui spray de pimenta no bolso?) lançado aleatoreamente em frente ao trio e da agressão gratuita a uma integrante da bateria do bloco por parte de um folião, optamos pelo encerramento do desfile, antes do local e horário previstos, para a garantia da segurança dos presentes.
Reconhecemos a importância da Política Militar para o carnaval de Belo Horizonte e, portanto, não nos furtamos a participar das diversas reuniões convocadas com o órgão e pela Belotur, para garantir a segurança de nosso desfile. Seguimos à risca as recomendações da PM para o desenrolar do desfile, reconhecendo a experiência de uma instituição que vem atuando há anos no setor de segurança pública em nosso estado. Se, por outro lado, as exigências da Política Militar passam pela censura às canções entoadas pelo bloco e ao endosso de posicionamentos de intolerância de de violência por parte de grupos que atuam com base no ódio à diversidade e à diferença, não podemos compactuar e sermos cúmplices.
Precisamos existir em nossas diferenças. Precisamos defender a democracia nos pequenos atos. Precisamos que nosso carnaval seja como sempre foi: de paz, de amor e de diversidade.
Somos fortes, somos muitxs e estamos unidxs! O carnaval do Tchanzinho Zona Norte resiste!”
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