Tijolaço: Matar, desmatar, acovardar-se e calar. A leis da nova era

POR  · 01/12/2018


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Jair Bolsonaro diz que não deixará que policiais e militares respondam por terem matado alguém.
Isso no país onde onde as mortes se banalizaram, às dezenas de milhares por ano.
Jair Bolsonaro diz que não deixará que os fiscais do Ibama apliquem sua “indústria de multas” sobre quem esteja violando leis ambientais se for para “produzir”.
Isso no país onde se desmata e se queima a rodo.
Jair Bolsonaro diz que não permitirá que os fiscais do quase extinto Ministério do Trabalho “fiquem no cangote” de empresários que ameaçam direitos ou a segurança de seus empregados.

Isso no país onde os acidentes de trabalho matam uma pessoa a cada 4 horas e meia.
Jair Bolsonaro diz que não permitirá que o professor “doutrine” seus alunos, sendo “doutrina” qualquer opinião ou conceito que não se enquadre na cartilha fundamentalista.
Isso no país onde a baixa qualidade do ensino, em boa parte pelo acriticismo, é uma realidade internacionalmente vergonhosa.
É evidente que se você for fiscal do Ibama, ou fiscal do trabalho ou mesmo professor, terá uma imensa tendência a se omitir. Vai que você multe “o cara errado” ou fale em sala “algo que poderá e será usado contra você’?
E que o policial, sabendo o criminoso que nem voz de prisão ouvirá, não está sujeito a enfrentar a falta de limites de quem sabe que vai morrer? Afinal, confronto de vida ou morte é faca de dois gumes, não é?
É claro que o resultado disso serão mais mortes, mais desmatamento ilegal, mais acidentes de trabalho e sonegação de direito e, claro, salas de aula mais tensas, com mais dos sobressaltos que o magistério já vive, com o empoderamento de provocadores e de dedo-duros juvenis.
O que as declarações demagógicas do presidente eleito vão produzir são mais transgressões, mais desorganização administrativa e maior queda na qualidade de um ensino onde já falta pensar, debater, aprender pelo confronto de ideias e informações. Aprender a data da chegada de Cabral e o nome das caravelas é mais seguro que discutir a importância das descobertas ultramarinas na implantação do mercantilismo (talvez a crítica do mercantilismo seja marxista, não é?).
Fico pensando no meu professor de francês no ginásio explicando “A marselhesa”, hoje hino da França, o risco que correria.
Recorrer a quem, se centenas de procuradores do Ministério Público Federal já divulgam manifesto em apoio ao obscurantismo e prometendo lutar contra o ” tempo precioso do aprendizado [que] é desperdiçado com a pregação ideológica e a propaganda político-partidária mais ou menos disfarçada”. O pobre coitado era capaz de ser condenado por dizer que Maria Antonieta estava indiferente à fome nas ruas de Paris, mas que, ao contrário, queria melhorar a dieta dos pobres servindo-lhes brioches.
Não haverá socorro, senão o da própria consciência, aos “infratores” da nova ordem. Ainda mais que temos no Judiciário e na mídia toda uma camada de imbecis prontos a repetir conceitos vazios, bem adequados ao “senso comum”.
A burrice, a estupidez e o autoritarismo espalham-se em círculos concêntricos e logo estarão sendo a regra por este Brasil afora.

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