Maurício Dias: Alto lá, general

por Maurício Dias - na Carta Capital - 01/12/2018
Os militares agora na política falam muito antes da posse. Bolsonaro cuida de amenizar a frustração do passado
Marcelo Camargo/Agência Brasil
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Pujol, revisor da história: "Há preconceito na análise sobre 1964."
Jair Bolsonaro, capitão da reserva e presidente eleito, escolheu até agora oito generais para compor parte do governo. Nenhuma objeção legal. É, porém, uma decisão estranha na história da República tomada, provavelmente, pela suposição de que somente os militares são honestos e podem acabar com as falcatruas no País. 
Bolsonaro é um presidente imprudente. Ele se engana com as vulgaridades pessoais criadas por ele, ora para rir e, outras vezes, para chorar. 
Quem se lembra da construção da Ponte Rio Niterói? Quantas armas, anualmente, desaparecem dos quartéis? Entre os generais também há corrupção. Os militares pisam também na Constituição e, com certa frequência, criticam ou alertam para fatos restritos ao mundo político e ao civil. Deveriam esperar a hora de vestir o pijama.  
Duas provocações recentes, feitas por dois generais, podem ser identificadas como rotas de colisão.

Eis o que o general Eduardo Villas Bôas, comandante do Exército, postou no Twitter: “Determinei ao Exército que rememorem a ‘intentona comunista’ ocorrida há 83 anos... em nome de uma ideologia diversionista”.
Os rebelados lutavam por uma causa e perderam. “Ideologia diversionista”, se aplicável em sociedades onde haja abismos entre ricos e pobres, fará com que elas estejam sempre sujeitas a rebeliões. 
O general Edson Pujol, o próximo comandante do Exército, pensa com identidade igual, ou quase, à do general Villas Bôas. Ele analisa o golpe contra João Goulart e transforma a ditadura em “período militar”.
“Há preconceito na análise sobre 1964”, diz Pujol. E segue convicto: “O preconceito é fruto de uma doutrinação na análise dos últimos 60 anos da história”. Jango, eleito democraticamente, foi derrubado. Saiu do País para o exílio. Supor que era comunista é impropério. 
Dois generais e um capitão. Bolsonaro é o conjunto de uma obra: a doutrinação nos quartéis. Certa vez, fez um discurso na Câmara dos Deputados e deixou a sua marca: “Incansáveis, os agentes do satanismo marxista-leninista, mesmo privados de um de seus eixos de poder, Moscou, continuam assanhadíssimos”. 
A vontade de militares chegarem ao poder democraticamente foi inútil ao longo das tentativas. Houve exceção. Sustentado eleitoralmente por Getúlio Vargas, o general Eurico Gaspar Dutra ganhou a eleição de 1946.
Fora este específico momento, os militares só chegaram ao poder através do golpe de 1964. Saíram 21 anos depois. Bolsonaro, até agora, cuida de amenizar uma antiga frustração.

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