Dmitry Orlov: Mil bolas de fogo

23/5/2018, Dmitry Orlov, Club Orlov

 Traduzido pelo Coletivo Vila Vudu
"A Rússia está pronta para responder a qualquer provocação, mas a última coisa que os russos querem é outra guerra. 

E essa, se você gosta de boas notícias, é a melhor notícia que você ouvirá."
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Um odor de 3ª Guerra Mundial paira no ar. Nos EUA, a Guerra Fria 2.0 prossegue, e a retórica anti-Rússia emanada da campanha de Clinton, ecoada pelos veículos da mídia, nos leva de volta ao McCarthyismo e à ameaça vermelha. Resposta a isso, muita gente começou a pensar que o Armageddon pode estar próximo – uma troca nuclear mortal, seguida de um inverno nuclear e extinção da humanidade. Parece que muita gente nos EUA gosta de pensar assim. Santo Deus!

Mas, vejam, faz completo sentido. Não se pode dizer que seja irracional. Os EUA estão afundando num colapso financeiro, econômico e político, perdendo posição no mundo e convertendo-se num gueto de dimensões continentais povoado de abuso de todas as drogas, violência, infraestrutura em ruínas, população desgraçada por vícios de toda a ordem, envenenada com comida geneticamente modificada, doente de obesidade, explorada por departamentos de polícia e prefeitos predadores e o mais farto sortimento de pragas, da medicina à educação e à propriedade imobiliária. OK. Até aí, todos sabemos.

Também sabemos como é doloroso perceber que os EUA estão em estado de perda total, nenhum conserto é possível, ou aceitar o fato de que a maior parte do dano é autoinfligido: as guerras, infindáveis, inúteis guerras, a corrupção sem limites da política do dinheiro, a cultura tóxica, as guerras de gênero, a húbris imperial e a deliberada ignorância que subjaz a tudo isso... Esse nível de desconexão entre o que se espera e o que se vê com certeza fere, mas é possível evitar a dor, durante algum tempo, com muita ilusão em massa.

Esse tipo de espiral descendente não se traduz automaticamente como "apocalipse", mas as especificidades do culto ao estado nos EUA – uma religiosidade antiquada sobreposta à secular religião do progresso – são de tal ordem que não restam outras opções: ou estamos a caminho do céu para construir colônias em Marte, ou perecemos numa bola de fogo. Até a humilhação de ter de pedir permissão aos russos para mandar o Soyuz para a Estação Espacial Internacional faz parecerem duvidosos os planos para construir colônias espaciais norte-americanas. Resta o plano B: bolas de fogo, aqui vamos nós.

Assim, grande parte da recente belicosidade dos EUA contra a Rússia pode ser explicada pelo desejo de encontrar alguém para culpar pelo colapso em andamento. É movimento psicológico muito bem conhecido – projetar a sombra –, pelo qual alguém pega tudo que odeia mas não consegue admitir para si próprio que odeia e lança sobre outro. Num plano subconsciente (e, no caso de alguns particularmente estúpidos, também num plano consciente) os norte-americanos gostariam de despejar bombas nucleares sobre a Rússia até que o país ardesse e virasse pó brilhante, mas não podem, porque antes de virar pó os russos fariam o mesmo contra os norte-americanos. Mas os norte-americanos podem projetar na Rússia esse desejo mórbido, e dado que têm de crer que são bons e que a Rússia é má, o cenário de Armageddon vai-se tornando mais provável a cada dia.

Mas pensar assim envolve separar-se da realidade. Só há uma nação no planeta que lança bombas atômicas contra outros países: os EUA. Bombardearam com bombas atômicas o Japão – sem qualquer motivo, porque o Japão já estava derrotado e pronto para se render. Bombardearam porque podiam bombardear, só isso. Estavam preparados para bombardear com bombas atômicas a Rússia, no início da Guerra Fria, e só não bombardearam porque não tinham ainda, naquele momento, número suficiente de bombas atômicas. 

E tentaram acabar com as defesas russas contra ataques nucleares, ao abandonarem o Tratado dos Mísseis Balísticos Antimísseis em 2002; só as novas armas russas impediram os EUA de fazer o que planejavam naquele momento. Dentre as novas armas russas estavam os mísseis cruzadores supersônicos de longo alcance (Kalibr), e os mísseis intercontinentais suborbitais que transportam várias ogivas nucleares capazes de manobras evasivas ao se aproximarem dos alvos (Sarmat). 

Todas essas novas armas são impossíveis de interceptar com as tecnologias defensivas hoje concebíveis. Ao mesmo tempo, a Rússia também desenvolveu suas próprias capacidades defensivas, e seu novo sistema S-500 efetivamente vedará completamente todo o espaço aéreo russo, sendo capaz de interceptar alvos tanto em solo como bem órbitas terrestres de baixa altitude.

Entrementes, os EUA desperdiçaram quantias astronômicas de dinheiro engordando sempre mais o seu já notoriamente corrupto establishment da Defesa com variadas versões de "Guerra nas Estrelas", mas nem um vintém daquele dinheiro foi consumido de modo que se possa declarar satisfatório. As duas instalações na Europa do sistema Aegis Ashore (completada na Romênia, planejada na Polônia) de nada servirão contra mísseis Kalibr disparados de submarinos ou de pequenos navios no Pacífico ou no Atlântico, próximos do litoral dos EUA, ou contra mísseis intercontinentais que possam voar em torno deles. O Terminal High Altitude Area Defense, THAAD, atualmente sendo instalado na Coreia do Sul (contra o qual as populações locais protestam ininterruptamente, raspando a cabeça) tampouco alterará o quadro geral.

Só há uma nação nuclear agressora no planeta, e não é a Rússia. Mas não importa. Apesar dos esforços dos norte-americanos para miná-la, a lógica da Mútua Destruição Garantida [ing. Mutual Assured Destruction (MAD)] permanece vigente. A probabilidade de ataque nuclear mútuo é determinada não por alguma política, de um lado nem de outro, mas pela probabilidade de que aconteça por acidente. Dado que não há estratégia vencedora numa guerra nuclear, ninguém tem qualquer razão para começar uma. Em nenhuma circunstância os EUA serão jamais capazes de ditar ordens à Rússia, porque tenham feito ameaças de aniquilação nuclear.

Se não se cogita de guerra nuclear, o que dizer de guerra convencional? Os EUA só fazem provocar e agitar sabres, cada vez que estacionam tropas e fazem manobras militares no Báltico, junto à fronteira ocidental da Rússia; ao instalar sistemas de Mísseis Antimísseis na Romênia, Polônia e Coreia do Sul; ao apoiar nazistas ucranianos antirrussos, etc. Tudo isso é sempre provocação; podem essas provocações levar à guerra? E que guerra seria essa?

Aqui, temos de examinar como a Rússia respondeu a provocações anteriores. Esses são todos os fatos que já conhecemos, e podemos usar para predizer o que acontecerá, o que é muito diferente de declarações puramente fictícias, ficcionais, conjecturais sem qualquer relação com os fatos que se conhecem.

Quando os EUA ou seus agentes-procuradores locais atacaram algum enclave de cidadãos russos fora das fronteiras da Rússia, houve dois tipos de resposta que já pudemos observar até aqui:

1. O exemplo da Geórgia. Durante os Jogos Olímpicos de Verão em Pequim (tradicional tempo de trégua em qualquer guerra, e de paz, em geral), militares da Geórgia, armados e treinados por EUA e Israel, invadira a Ossétia Sul. 

Essa região era nominalmente parte da Geórgia, mas habitada por maioria de falantes de russo e portadores de passaportes russos. As tropas georgianas começaram a bombardear a capital, Tskhinval, matando alguns soldados russos de forças de paz estacionadas na região e provocando algumas baixas entre os civis. Em resposta, as tropas russas entraram no país e em poucas horas destruíram toda a capacidade de guerra da Geórgia. Anunciaram que Ossétia Sul deixava de facto de pertencer à Geórgia; por medida de precaução puseram a Ossétia Sul em Abkhazia (outro enclave russo em disputa) e retiraram-se. 

O presidente belicista da Geórgia, Saakashvili, foi declarado "cadáver político" e deixado lá para secar. Adiante optou por fugir da Geórgia, onde foi declarado fugitivo da justiça. O departamento de Estado dos EUA deu-lhe recentemente novo emprego, como governador de Odessa na Ucrânia. Mais recentemente, as relações russo-georgianas foram mandadas para o conserto.

2. O exemplo da Crimeia. Durante os Jogos Olímpicos de Inverno em Sochi, na Rússia (tradicional tempo de trégua em qualquer guerra, e de paz, em geral) aconteceu a derrubada ilegal, violenta, por golpe de Estado, do governo constitucional eleito da Ucrânia, seguida pela posse de um governo fantoche selecionado pelos EUA. Em resposta, a população predominantemente russa da região autônoma da Crimeia decidiu fazer um referendum. Cerca de 95% da população da Crimeia optou pela separação da Ucrânia e pela reintegração da região à Rússia, como sempre vivera integrada durante séculos e até bem recentemente. Os russos então usaram tropas já estacionadas na região por um acordo internacional, para garantir que os resultados do referendum fossem realmente respeitados. Não foi disparado sequer um tiro durante todo esse exercício perfeitamente pacífico de democracia direta.

3. Outra vez o exemplo da Crimeia. Durante os Jogos Olímpicos de Verão no Rio de Janeiro (tradicional tempo de trégua em qualquer guerra, e de paz, em geral) alguns agentes ucranianos atacaram junto à fronteira da Crimeia e foram rapidamente capturados pelo Serviço Federal de Segurança da Rússia, bem como um depósito clandestino de armas e explosivos. Vários deles foram mortos na ação, e dois russos.

Os sobrevivente sem demora confessaram que planejavam organizar ataques terroristas no terminal de balsas que liga a Crimeia ao território russo e numa estação ferroviária. O líder do grupo confessou que lhe tinha sido prometido o nababesco prêmio de $140 pelos dois ataques. Todos sonham com cama quente e três refeições ao dia à custa do governo russo, o que deve parecer cantinho do Paraíso comparado à violência, ao caos, à miséria e à desolação que caracterizam a vida hoje na Ucrânia. Em resposta, o governo de Kiev protestou contra a "provocação russa" e pôs suas tropas em alerta para preparar-se contra a "invasão russa". Talvez o próximo embarque de ajuda humanitária dos EUA à Ucrânia deva incluir suprimento dechlorpromazine ou de outra droga antipsicótica potente.

Observe-se a regularidade com que se repete o refrão "durante os Jogos Olímpicos". Não é coincidência, mas indicativo de um dado modus operandidos norte-americanos. Sim, fazer guerra em tradicional tempo de paz é ao mesmo tempo cínico e estúpido. Mas o motto dos norte-americanos parece ser "se repetirmos alguma coisa muitas, muitas vezes, e mesmo assim não funciona, é porque não nos dedicamos suficientemente". Na cabeça dos que planejam esses eventos, a causa de eles jamais funcionarem não pode ter coisa alguma a ver com a estupidez. É a chamada "Estupidez de nível 3": a estupidez é tal, que o estúpido é incapaz de compreender a própria estupidez.

4. O exemplo do Donbass. Depois dos eventos descritos em 2, acima, essa região populosa e industrializada, que é parte da Rússia até bem adiante no século 20, e que é linguisticamente e culturalmente russa, entrou num torvelinho político, porque muitos dos locais não queriam qualquer relacionamento com o governo que fora instalado em Kiev, que eles viam como ilegítimo. O governo em Kiev ainda piorou as coisas, primeiro com leis que agrediam direitos dos falantes de russo, depois com ataques militares do exército contra a região, o que continua a fazer até hoje, com três tentativas mal sucedidas de invadir a região e bombardeios continuados contra áreas residenciais e industriais, durante os quais foram mortos mais de 10 mil civis e muitos mais foram feridos. Resposta a isso, a Rússia ajudou a estabelecer um movimento local de resistência apoiado por contingente militar treinado de voluntários locais. Tudo foi feito por voluntários russos, sem qualquer delegação oficial, e por cidadãos russos que doaram, como doadores privados, dinheiro para a causa. Apesar da histeria ocidental em torno das tais "invasão russa" e "agressão russa", não há qualquer prova de que tenha acontecido qualquer desses atos. Diferente de invadir e agredir, o governo russo só fez três coisas: recusou-se a intervir no trabalho de cidadãos russos que acorriam para ajudar o Donbass; construiu e pôs em prática uma estratégia diplomática para resolver o conflito; e enviou vários comboios de ajuda humanitária aos residentes do Donbass. A iniciativa diplomática da Rússia resultou em dois acordos internacionais – Minsk I e Minsk II – que compeliram os dois lados, Kiev e o Donbass, a adotar estratégia de resolução política para o conflito, com cessação de hostilidades e garantia de total autonomia ao Donbass. Kiev recusou-se obcecadamente a cumprir os compromissos que aceitara pelos acordos. O conflito está congelado, mas ainda sangra por causa das bombas ucranianas, à espera que colapse o governo-fantoche da Ucrânia.

Para completar o quadro, deve-se incluir a recente ação militar dos russos na Síria, para onde os russos foram para defender o fragilizado governo sírio e onde os russos rapidamente demoliram grande parte do ISIS/ISIL/Daech/Califato Islâmico, além de outras várias organizações terroristas ativas na região. 

A causa para essa ação é que a Rússia via na Síria um ninho de terroristas financiados de fora da Síria e, como tal, ameaça direta à segurança da Rússia. Dois outros fatos notáveis aqui são que a Rússia agiu no estrito respeito à lei internacional (foi convidada pelo governo sírio, que é governo legítimo, internacionalmente reconhecido); e que a ação militar foi reduzida e desescalou tão logo apareceram sinais confiáveis de que todos os partidos legítimos (os não terroristas) naquele conflito voltariam à mesa de negociações. 

Esses três elementos – usar força militar como medida de segurança reativa; adesão escrupulosa aos termos da lei internacional; e garantir que prevaleça a noção clara de que a ação militar deve estar a serviço da diplomacia, não o contrário – são muito importantes para compreender os métodos e as ambições da Rússia.

Considerando agora as aventuras militares/diplomáticas dos EUA, o que se vê é completamente diferente. O gasto militar dos EUA corresponde a mais da metade de todos os gastos discricionários federais dos EUA, forçando o encolhimento de muitos outros setores vitalmente importantes, como infraestrutura, assistência pública à saúde e à educação pública. 

O gasto militar dos EUA serve a várias finalidades. A mais importante é que é um programa público de empregos: é um modo de empregar gente que, por falta de inteligência, educação e treinamento, não é empregável em nenhum emprego que exija real capacidade produtiva. Segundo, é um modo pelo qual políticos e empresas fornecedoras da Defesa enriquecem-se mutuamente e sinergicamente à custa dos cidadãos. Terceiro, é programa de propaganda & marketing universal para vender armas, sabendo-se que os EUA é o principal fornecedor mundial de tecnologia letal. Por fim, é um modo de projetar força em todo o mundo, bombardeando até converter em ruínas todos e quaisquer países que se atrevam a fazer oposição às ambições globalistas hegemonistas de Washington, muito frequentemente atropelando toda a legislação internacional. Ninguém viu, nessa lista, qualquer interesse real e efetivo de defender os EUA.

Nenhuma dessas considerações aplica-se à Rússia. Em dólares, o gasto militar dos EUA simplesmente atropela o que a Rússia gasta em defesa. Porém, aferido em termos paritários de compra, a Rússia consegue comprar dez vezes mais capacidade de defesa por unidade da riqueza nacional, que os EUA, o que, por sua vez, reduz a menos de zero a 'vantagem' que os EUA supõem que tenham. Além disso, o que os EUA recebem pelo dinheiro que gastam é material inferior: os militares russos obtêm exatamente as armas que desejam; os militares norte-americanos só conseguem o que o corruptoestablishment político e seus cúmplices no complexo industrial-militar desejam vender para se autoenriquecerem. 

Em termos de campanha de publicidade & marketing para vender armas, o que vende mais armas: (i) mostrar ao mundo as armas russas em ação na Síria, efetivamente varrendo de lá legiões de terroristas, sem demora, em campanha intensa e feita com recursos escassos, ou (ii) mostrar ao mundo as armas dos EUA que os sauditas usaram no Iêmen, usadas com apoio e consultoria técnica de norte-americanos, todos os dias derrotadas por insurgentes esfarrapados e armas leves? Difícil crer que (ii) seja eficaz na geração e promoção de mais vendas de armas caríssimas. 

Por fim, o projeto para manter a hegemonia global dos EUA também parece já ter dado de cara nos rochedos. Rússia e China já constituem uma união militar de facto. O armamento superior russo, combinado com a infantaria chinesa quase infinitamente incontável, é combinação inderrotável. A Rússia tem agora uma base aérea permanente na Síria; fez acordo com o Irã para usar bases militares iranianas, e está no processo de arrancar da OTAN a Turquia. Enquanto isso, os militares norte-americanos, com suas incontáveis imprestáveis bases espalhadas pelo mundo e pilhas de engenhocas inservíveis, giram em infinito embaraço diante do teatro das nações e só servem – e por enquanto – como programa público de empregos para incompetentes, e rica fonte de propinas.

Feitas as contas, é importante compreender o quanto são limitadas as capacidades militares dos EUA. Os EUA são ótimos quando se trata de atacar adversários muitíssimo inferiores. A ação contra a Alemanha Nazista só deu certo porque a Alemanha já estava efetivamente derrotada pelo Exército Vermelho – só faltava a varrida final, e foi aí que os EUA apareceram, saindo de seu isolamento tímido e meteram-se lá, pelas beiradas. 

Até a Coreia do Norte e o Vietnã mostraram-se fortes demais para os militares dos EUA. Mas mesmo nesses casos o desempenho dos militares dos EUA teria sido muito pior, não fosse o recrutamento, que teve o efeito de injetar nas fileiras gente não tão incompetente, mas a injeção teve o efeito colateral não desejado de recém-alistados matarem a tiros seus superiores incompetentes – um dos capítulos menos conhecidos da história militar dos EUA. E agora, com a adição de LGBTQs nas fileiras, os militares norte-americanos estão a caminho de se tornarem reserva internacional de piadas. Antes, palavras como "viadinho" e "bonequinha" [orig. "faggot" e "pussy]" eram itens indispensáveis do treinamento militar básico. Não há sargento que não tenha usado essa terminologia, para forçar os "bunda-mole" que lhe entregavam para adestrar a se comportarem como homem. Fico pensando... que palavras os sargentos usarão, agora que recebem para adestrar e fazer agir como homens, precisamente aquela humanidade que os sargentos tanto invocavam? O potencial piadístico desse desdobramento histórico não escapou aos/às militares russos/russas.

A comédia continuará enquanto os militares norte-americanos continuarem a fugir para não serem obrigados a enfrentar exércitos sérios, porque, se ficarem e lutarem, a comédia rapidamente se converterá em tragédia.
 
  • Se, por exemplo, forças dos EUA tentarem atacar território russo cuspindo mísseis através da fronteira, serão neutralizados em retaliação instantânea pela artilharia russa vastamente superior à norte-americana.

  • Se norte-americanos ou seus 'agentes locais' provocarem russos que vivem fora da Rússia (e são milhões) a ponto de rebelião armada, voluntários russos, agindo extraoficialmente e usando fundos privados, rapidamente os treinarão, vestirão e armarão, criando uma insurgência popular que durará anos, se necessário, até que norte-americanos e seus 'agentes' capitulem.

  • Se os norte-americanos cometerem a loucura extrema e invadirem território russo, serão escorraçados e aniquilados, como repetidas vezes aconteceu a forças ucranianas no Donbass.

  • Qualquer tentativa de atacar a Rússia usando a frota de porta-aviões dos EUA, resultará em afundamento instantâneo dos porta-aviões, por ação de vasto arsenal: mísseis balísticos antinavios, torpedos para supercavitação ou mísseis cruzadores supersônicos.

  • Bombardeiros estratégicos, mísseis cruzadores e mísseis balísticos serão eliminados pelos novos sistemas russos avançados de defesa aérea.



Até aqui, quanto a atacar. Mas e a defesa? Bem, fato é que há uma dimensão inteiramente à parte, para quem pense em engajar militarmente a Rússia. Todos sabem que a Rússia perdeu número descomunal de civis, na luta contra a Alemanha Nazista. Muitos morreram – velhos, mulheres e crianças – de fome e de doenças, ou sob os bombardeiros alemães, ou por causa dos maus tratos nas mãos de soldados alemães. Por sua vez, morreram praticamente tantos militares soviéticos, quanto alemães. Essa calamidade incrível abateu-se sobre a Rússia porque o país foi invadido; e isso condicionou o pensamento militar russo desde então. Qualquer futura guerra em grande escala, se houver, será combatida em território do inimigo. Significa que, se os EUA atacam a Rússia, a Rússia contra-ataca no coração do território dos EUA. Considerando-se que os EUA não enfrentam guerra em seu próprio território há mais de 150 anos, será choque considerável.

Claro, será feito de modos coerentes com o pensamento militar russo. O mais importante é que o ataque seja tal que minimize a possibilidade de ele disparar uma troca nuclear. Segundo, a força usada deve ser a mínima necessária para garantir cessação de hostilidades e volta à mesa de negociações, em termos favoráveis à Rússia. Terceiro, serão empreendidos todos os esforços para dar bom uso às revoltas populares internas, para criar insurgências duradouras, deixando que voluntários forneçam as armas e o treinamento necessários. Por fim, vencer em situação de paz é tão importante quanto vencer em situação de guerra, e são indispensáveis todos os esforços para informar ao povo dos EUA que o que lhes esteja acontecendo é justa retribuição por atos ilegais. De um ponto de vista diplomático, muito mais difícil seria resolver o problema dos criminosos de guerra que governam os EUA, como problema político interno, norte-americano, que os norte-americanos têm de resolver sozinhos, com absolutamente mínimo auxílio externo.

O meio mais recomendável para dar a conhecer aos norte-americanos as causas do que lhes acontece é uma partilha amigável, fraterna, de inteligência, de modo que todas as partes interessadas dentro dos EUA saibam exatamente quem deve ser julgado pelos crimes de guerra, que cara têm os criminosos e respectivas famílias; e o endereço deles.

A questão então é "Qual a mínima ação militar absolutamente mínima – o que estou chamando de "mil bolas de fogo", expressão criada a partir dos "mil pontos de luz" de que falou George Bush Pai – para restaurar a paz em termos favoráveis à Rússia? Parece-me que mil "bolas de fogo" é quase o número certo. Seriam pequenas explosões – suficientes para demolir um prédio ou uma instalação industrial, praticamente sem mortos. Esse último ponto é extremamente importante, porque a meta é destruir o sistema, sem ferir ninguém. Será culpa exclusivamente dos EUA tudo que o país vier a sofrer no caso de os EUA recusarem-se a fazer o que sua própria Agência Federal de Gestão de Emergências (ing. Federal Emergency Management Agency, FEMA) manda fazer: estocar comida e água suficientes para uma semana e construir plano de emergência para evacuação. Além disso, dada a direção para a qual caminham os EUA, que tratem de obter um segundo passaporte; que mandem suas economias para fora do país; e que cuidem de aprender a atirar, para o caso de acabarem ficando por aqui mesmo.

A razão pela qual é muito importante que essa ação militar não mate ninguém é a seguinte: há hoje cerca de 3 milhões de russos residentes nos EUA, e matar qualquer deles absolutamente não interessa à estratégia. Há número ainda maior de gente de populosos países amigos da Rússia, como China e Índia, que devem permanecer ilesos. Por tudo isso, absolutamente não é aceitável qualquer estratégia que resulte em perda de grande número de vidas humanas. Muito melhor cenário envolve produzir uma crise que rapidamente convença os russos que vivem nos EUA (e todos os cidadãos de nações amigas e imigrantes de primeira geração, e até alguns de segunda geração também) de que os EUA deixaram de ser bom lugar para viver. Então, toda essa gente poderia ser repatriada – processo que, sim, exigiria alguns anos. Atualmente, a Rússia é o terceiro destino preferencial para quem procura melhor lugar para viver, depois de EUA e Alemanha.

A Alemanha está à beira de revolta aberta contra o insano programa anti-imigração de Angela Merkel. Os EUA não estão muito distantes disso, e não continuarão por muito tempo como destino atraente. Isso tudo põe a Rússia em primeiro lugar para onde se mudar, em todo o planeta. É muita pressão, mesmo para um país onde cabem 11 fusos horários, e onde há abundância de tudo, exceto frutas tropicais e gente.

Temos de também ter em mente que Israel – que é, vamos encarar os fatos – protetorado dos EUA temporariamente estacionado em terra dos palestinos – não durará muito tempo, sem massivo apoio dos EUA. 1/3 da população israelense são russos. No momento em que o Projeto Israel começar a parecer agonizante, muitos desses judeus russos, inteligentes como são, com certeza decidirão encenar um êxodo e voltar diretamente para a Rússia, como é direito deles. Será dor de cabeça para o Serviço Federal Russo de Migração, porque será preciso filtrar quem chega, separando os judeus russos normais, de um lado; e, de outro, os sionistas ensandecidos, os criminosos de guerra e os doidos religiosos ortodoxos. Também será processo demorado.

Mas ações que criem maior risco de provocar mortes também são completamente desnecessárias, porque há disponível estratégia alternativa efetiva: destruir peças chaves da infraestrutura do governo e empresas; depois cruzar os braços e esperar que o outro lado caminhe de volta à mesa de negociações acenando um trapo branco. 

Observem que há alguns ingredientes mágicos que permitem aos EUA continuar a existir como país estável, desenvolvido e capaz de projetar força militar para outros continentes. São eles: a rede elétrica; o sistema financeiro; o sistema rodoviário interestadual; fretes ferroviários e marítimos; as linhas aéreas; e os oleodutos e gasodutos. Desconecte e paralise todos eles e, pronto, fim de jogo. Quantas "bolas de fogo" isso tudo custaria? Bem menos de mil, provavelmente.

Desligar a grade elétrica é quase ridiculamente fácil, porque o sistema é muito altamente integrado e interdependente, com apenas três subgrades, chamadas "interconnects": ocidental, oriental e Texas. As partes mais vulneráveis do sistema são os Large Power Transformers (LPTs) que geram voltagens de milhões de volts para transmissão e as reduzem novamente para distribuir. Essas unidades têm as dimensões de uma casa, custam milhões de dólares e uns poucos anos para substituir. Quase todas são fabricadas fora dos EUA. Além do mais, e tanto quanto o resto de toda a infraestrutura nos EUA, quase todos esses transformadores são muito antigos e podem falhar a qualquer momento. Há vários milhares dessas peças chaves de equipamento, mas, porque a grade elétrica nos EUA opera perto da capacidade máxima, com vários pontos críticos de estrangulamento, toda a grade cairia completamente se um punhado de LPTs particularmente estratégicos fossem destruídos. 

Nos EUA, qualquer corte de energia em qualquer dos grandes centros urbanos dispara automaticamente tumultos e saques. Há quem estime que um corte de energia de apenas duas semanas levaria a situação a ponto sem volta, com danos tão extensos que nem vale a pena reparar.

Desconectar o sistema financeiro também é ação relativamente trivial. Há uns poucos pontos cruciais, dentre os quais o Federal Reserve, uns poucos grandes bancos, centros de dados de empresas de cartões de crédito e débito, etc. Podem ser desabilitados por grande variedade de métodos, como ataque de míssil cruzador, um ciberataque, interrupção no fornecimento de energia elétrica e até agitação de rua. Deve-se considerar que o sistema financeiro nos EUA está a ponto de explodir e pode explodir sem qualquer intervenção externa. Pode acontecer eventualmente de ser detonado de dentro para fora, por uma combinação de dívida corrente, bolha gigante no mercado de ações, o Federal Reserve preso na armadilha das taxas cada vez mais baixas de juros; aposentadorias e pensões, além de outras obrigações do Estado, sem cobertura; propriedade imobiliária com preços muito acima da realidade do mercado; e mercado de ações ridiculamente descolado da realidade. 

Alguns poucos ataques cirúrgicos a mais podem tirar de operação os oleodutos e gasodutos, os terminais de importação de petróleo e gás, pontes e túneis nas grandes rodovias, ferrovias e linhas áreas. Poucos meses sem acesso ao dinheiro e a serviços financeiros, a eletricidade, gasolina, diesel, gás natural, transporte aéreo ou a peças de reposição importadas para reparar os danos, e provavelmente os EUA serão forçados a capitular. E se houver esforços para restaurar qualquer daqueles serviços, basta mais um ou dois mísseis e não haverá mesmo como resistir.

O número de "bolas de fogo" pode ser otimizado, se se aproveitam sinergias de destruição: um 'misturador' de sinais de GPS instalado próximo de um local a ser atacado pode impedir os mísseis antimísseis de navegar para lá; destruir um depósito de suprimentos ao mesmo tempo em que se destrói a instalação que ele supre, e associar a isso interrupções nos sistemas de transporte, pode adiar os reparos por muitos meses; uma simples ameaça de bomba pode imobilizar toda uma rede de transporte, paralisando toda a rede, em vez de, como antes, se manter como grande número de alvos móveis; etc.

Há quem suponha que um ataque assim, tão finamente planejado exigiria muita inteligência, difícil de recolher. Nada disso. Primeiro, uma grande quantidade de informação taticamente útil é sempre vazada por insiders os quais com frequência veem-se como "patriotas". Segundo, o que não vaza pode ser hackeado, porque a cibersegurança está arruinada, em estado que dá pena, nos EUA. Lembrem-se que a Rússia é produtora de softwaresantivírus – e também de alguns vírus. A Agência de Segurança Nacional dos EUA foi recentemente hackeada, e as joias da coroa, roubadas; se a agência NACIONAL de segurança dos EUA foi hackeada, o que vale a segurança dos que a agência existe para proteger?

Pode-se também pensar que os EUA, se atacados desse modo, poderiam, sim retaliar. Não. É cenário difícil demais de imaginar. Há muitos russos que não acham impossível aprender inglês, que de modo geral conhecem bem os EUA expostos na mídia comercial; e há especialistas entre eles, sobretudo os que estudaram ou deram aulas em universidades dos EUA, que sabem de seu campo de especialização nos EUA, tanto quanto sabem da sua Rússia natal. Norte-americanos, por sua vez, nem conseguem achar a Rússia no mapa, mal decoraram o alfabeto cirílico e desprezam o idioma russo, que consideram impenetrável.

Considerem também que o establishment de Defesa russo concentra-se principalmente em... defesa. Agredir pessoas em terras distantes não é considerado ali questão de alta importância estratégica. "Cem amigos é melhor que cem rublos", diz o dito popular. Assim, a Rússia trata de construir amizade com Índia e Paquistão e, ao mesmo tempo, também com China e Vietnã. No Oriente Médio, mantém relações cordiais com Turquia, Síria, Israel, Arábia Saudita, Iêmen, Egito e Irão, simultaneamente, sim. Diplomatas russos sabem que devem manter abertos canais de comunicação com amigos e com adversários, igualmente, sempre. Sim, pôr-se inexplicavelmente contra a Rússia pode ser horrorosamente doído, mas você consegue parar a dor facilmente. Basta um telefonema.

Acrescentem a isso o fato de que as vicissitudes da história russa condicionaram a população a esperar pelo pior e simplesmente lidar com o que venha. "Não vão conseguir matar todos nós!" é outro dito popular muito apreciado entre os russos. Se os norte-americanos derem jeito de fazer os russos sofrerem, os russos com certeza encontrarão bom consolo no fato de que farão os norte-americanos sofrer muito mais, e muitos russos pensarão, mesmo, que essa conquista já é, ela mesma, praticamente uma vitória. Nem os russos ficarão sem ajuda. Não é acaso que o ministro da Defesa da Rússia, Sergei Shoigu, comandou antes do Ministério das Emergências. E seu desempenho nesse serviço valeu-lhe muita adulação e elogios. Em resumo, se atacados, os russos simplesmente recolherão os próprios cacos – como sempre fizeram – e partirão para conquistar e vencer, como sempre fizeram.

Ajuda muito que muito do pouco que os norte-americanos ouvem sobre a Rússia, ensinado por seus líderes políticos e mídia de massa, seja quase inteiramente errado. Continuam a ouvir sobre Putin e o "urso russo", e provavelmente creem que a Rússia seja terra arrasada vastíssima, onde Vladimir Putin é um urso pós-graduado, poliglota, que se entretém jogando xadrez, hackeando servidores de internet, físicos nucleares, cientistas de mísseis, inventando vacina anti-Ebola.

Ursos são animais ótimos, russos amam ursos, mas não exageremos. É verdade. Ursos russos sabem andar de bicicleta e às vezes até são bonzinhos com crianças, mas mesmo assim não passam de animais selvagens e/ou bichinho de estimação (é diferença que os russos não conseguem entender). Por isso, quando os norte-americanos rosnam sobre o "urso russo", os russos ficam sem saber: Qual dos dois?

Em resumo, para a maioria dos norte-americanos a Rússia é um mistério envolto num enigma, e simplesmente não há pool possível de norte-americanos inteligentes em número suficiente que conheçam bem a Rússia, ao tempo em que, para muitos russos, os EUA são livro aberto. No que tenha a ver com serviços norte-americanos atuais de "inteligência" e "segurança", pessoal lá são passa de burocratas inchados e enrolões, obcecados com oportunismo político e com pensar como a manada, que só são bons em duas coisas: repetir sem questionar os procedimentos mais idiotas, e inventar fantasias para travestir os fatos da política do dia-a-dia. "Provar" que o Iraque tem "armas de destruição em massa" – deixe comigo, sem problemas! Distinguir terroristas islamistas e vovozinhas do meio oeste num ponto de controle de embarque de aeroporto – impossível!

A Rússia não recorrerá a medidas militares contra os EUA a menos que seja ensandecidamente provocada. Tempo e paciência trabalham a favor da Rússia. A cada ano que passa mais fracos ficam os EUA e mais perdem amigos e aliados; enquanto a Rússia fica sempre mais forte e ganha mais e mais amigos e aliados. Os EUA, nessa sua disfuncionalidade política, dívida incontrolável, infraestrutura decadente e instabilidade civil que não para, é nação morta-viva. Demorará para que cada um dos estados unidos se autodestrua e despenque sobre si mesmo, como aqueles três arranha-céus em New York dia 11/9 (WTC #1, #2 e #7), mas a Rússia é muito paciente. 

A Rússia está pronta para responder a qualquer provocação, mas a última coisa que os russos querem é outra guerra. E essa, se você gosta de boas notícias, é a melhor notícia que você ouvirá. Mas se mesmo assim você ainda crer que haverá guerra com a Rússia, não pense em termos de "Armageddon"; pense em termos de "mil bolas de fogo" e depois – grilos!*******

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