EUA aceitarão a derrota ou desafiarão o Urso Russo e o Dragão Chinês? Parte 1: RELATÓRIO DE SITUAÇÃO, Síria

28/3/2018, Elijah Magnier Blog, Damasco, Síria
Traduzido Pelo Coletivo Vila Vudu

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Depois da libertação de Ghouta leste, com os jihadistas já saídos também de Idlib, ao norte, que estava sob controle da al-Qaeda e dos turcos, a cidade de Duma está agora em negociações com o lado russo, para encontrar uma saída para os militantes do "Exército do Islã" (Jaish al-Islam). Esses militantes combateram contra muitos jihadistas e rebeldes e portanto acabaram sem amigos na arena síria. Mesmo assim essa negociação já não passa hoje de detalhe tático, porque a capital, Damasco, está segura e não mais exposta ao bombardeio diário, como foi o caso antes da libertação de Ghouta.

E agora? Acontece o quê?



O Campo Yarmouk e a cidade de al-Hajar al-Aswad:

A eliminação do grupo "Estado Islâmico" [ing. ISIS] e de remanescentes da al-Qaeda no Campo Yarmouk e na área próxima de al-Hajar al-Aswad, sul de Damasco, também já é apenas detalhe tático, porque esses terroristas estão sem saída, cercados por todos os lados: já não se trata de libertar essa área.



A estepe síria (al-Badiya):

Na estepe síria (al-Badiya), o ISIS ainda ocupa um bolsão, com do qual exército sírio cuidará ao longo desse verão. A área também está totalmente sitiada, o ISIS não tem saída e, sem poder movimentar-se, a capacidade de combate e a moral estão em deterioração acelerada, já chegando ao mínimo.



Idlib e al-Qaeda:

Quanto à cidade de Idlib, onde as várias forças de oposição e jihadistas se multiplicam, elas permanecem numa disputa pelo poder que as come, umas as outras. Não conseguirão administrar a presença de diferentes nacionalidades e credos, que se opõem umas às outras numa só cidade. Assim sendo, o papel da Turquia será crucial para manobrar essa área e impedir a luta interna entre jihadistas, ou mesmo para eliminar os que não queiram submeter-se à política de Ancara.



As forças turcas de ocupação:



A presença dos turcos no noroeste e centro-norte tornou-se inevitável. Espera-se batalha de longo prazo inconsistente muito lenta entre os estados turco e sírio. É natural nas circunstâncias esperar ameaça e contra-ameaça pelos dois governos.



Se Damasco decide optar por guerra contra a Turquia, deve enfrentar essa questão sem contar com seus aliados. Nem Rússia nem Irã querem confronto militar com o exército turco. Síria tem o direito de exigir a restauração de seu território, primeiro por meios diplomáticos e depois por pressão sobre Ancara a ser feita por aliados e amigos. Damasco pode então adotar a força militar, como tentativa final, in extremis, para reaver seu território.



A Rússia pode ser tentada a intervir diplomaticamente e encontrar uma solução entre Damasco e Ancara, se o objetivo de Moscou é que suas forças coexistam com o Exército Sírio, numa Síria pacífica.



Forças norte-americanas dos EUA em Deir-Ezzour e al-Hasaka:

Forças dos EUA permanecem no nordeste (quase 24% do total de territórios sírios sob controle do exército dos EUA), com um grande bolsão do ISIS protegido por Washington no atual momento "por razões e objetivos não declarados". O ISIS está plantado nas fronteiras sírio-iraquianos e conduz "vida normal", como mostram nos anúncios e comentários de propaganda midiática. Além disso, militantes do ISIS executam ataques insurgentes contra os exércitos sírio e iraquiano, com os quais os terroristas têm muito contato, dos dois lados da fronteira.



É muito improvável que as forças dos EUA saiam em breve, a menos que sejam forçadas por ataques dos insurgentes. Quererão evitar grande número de baixas, sempre que o ambiente onde operem torne-se hostil.



Washington já se provou capaz de suportar perdas, no Iraque. Permaneceu lá apesar de ter perdido cerca de 4.500 soldados e oficiais. Como disse o ex-secretário de Estado dos EUA James Baker: "EUA irão à guerra no Oriente Médio se for necessário, para controlar fontes de energia."



Na verdade, na Síria, há fontes de energia (petróleo e gás) sob controle dos EUA, que chegam a cerca de 13% do total do estoque sírio. Além disso, a presença dos EUA facilita para Israel usar um aeroporto estabelecido pelos EUA no nordeste da Síria, como um entroncamento na fronteira sírio-iraquiana.



Os EUA também pode alterar a situação no Iraque, Síria e Turquia para ameaçar todos esses países com um possível "estado curdo", uma vez que os curdos locais hoje protegem os EUA e agem como representantes locais dos EUA. Apesar de tudo, esse é cenário improvável, e espera-se que num certo ponto, os curdos sejam abandonados pelas forças norte-americanas e em algum momento serão entregues à própria sorte.



Contudo, os objetivos dos EUA no território sírio ocupado caminham contra os países fronteiriços e isso pode influenciar a duração da presença dos EUA. Não há dúvida de que a ocupação de territórios sírios pelos EUA perturba muito o eixo anti-norte-americano e é considerado um "espinho venenoso" no Levante.



Por outro lado, a existência do ISIS também se converteu em detalhe, porque o ISIS está sitiado. Pode mover-se livremente no enclave norte-americano, mas cautelosamente em direção aos seus inimigos: os exércitos sírio e iraquiano. Assim sendo, não tem qualquer horizonte estratégico, especialmente desde que a carta islamista não conseguiu derrubar os regimes iraquiano e sírio. O "caos criativo" que os norte-americanos instalaram sob o rótulo de "Novo Oriente Médio" fracassou nesse efeito esperado.



Daraa e Quneitra:

Não significa que a Síria está libertada e que o estado sírio estende o próprio controle sobre todo o território sírio. Mas há uma importante batalha a caminho no sul da Síria nas províncias Daraa e Quneitra.



Por que essa batalha é importante, e mais importante que o bolsão do ISIS em Yarmouk ou na estepe síria, ou, mesmo, até mais importante que a cidade de Idlib, onde a Al-Qaeda e outros grupos reuniram-se ao longo dos últimos dois anos?



O grande dilema permanece nas duas províncias do sul: Daraa e Quneitra. Essas duas províncias estão na fronteira com Israel na zona de desescalada definida entre EUA, Jordânia e os russos.



Mas Damasco insiste em libertar a área, com ou sem aprovação dos russos. O governo sírio gostaria de libertar essa área que está sob controle da al-Qaeda, os rebeldes e também os militantes pró-ISIS do "Jaish Khaled bin Walid".



E claro, se se fala de o exército sírio libertar território controlado pela al-Qaeda, pode-se sempre esperar uma avalanche de acusações pela mídia internacional, que pintará a área como se ali vivessem "exclusivamente mais de meio milhão de civis que defendem a própria casa."



Essa manipulação pela mídia existe e prossegue desde as batalhas de Qusseyr, Qalamoun, Aleppo, Madaya e finalmente na batalha de Ghouta. Washington deu ordens a CIA, Pentágono e Departamento de Estado, para que fossem usadas ferramentas civis com Organizações Não Governamentais, para promover a discussão em torno da preocupação com agressões a direitos humanos só nesses países, que não se deixaram dominar pelos EUA. 



Tem sido assim desde o primeiro dia em que a Rússia pôs pé na Síria em setembro de 2015, quando a situação ainda não se decidira em campo a favor do governo sírio, e é quando começam fortes ataques e críticas agressivas contra a Rússia e contra aliados de Damasco na Síria.



Por essas razões específicas, Daraa deve ser prioridade a ser resolvida pelo governo sírio. É preciso iniciar a negociação para varrer todos os militantes que queiram ser jogados em Idlib – a "lata de lixo", destino de todos os jihadistas que saem de todas as áreas sírias libertadas.



Os EUA perderam a "batalha dos extremistas" – não conseguiram mudar o regime na Síria. Foi o despertar do urso russo, depois de longa hibernação, quando o urso deu-se conta de que os EUA tentavam encurralá-lo. Moscou também confiou no dragão chinês, que partilha com o urso russo o objetivo de eliminar todos os extremistas e terroristas jihadistas que haja na Síria.



Ambas, Rússia e China trabalham agora bem próximas uma da outra, para pôr fim à superpotência unipolar e, assim, dar cabo da dominação dos EUA sobre o mundo. [Continua]

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