PML: A não ser que queria virar Imperatriz, Carmen Lucia deve chamar plenário a votar

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por Paulo Moreira Leite - no 247 - 10/02/2018

A decisão de Luiz Fachin sobre o habeas corpus de Lula mostra que os atores importantes da Lava Jato cumprem o papel que se espera deles mas não estão à vontade para representar o enredo à risca.

   Está claro que Fachin não teve a grandeza para fazer o certo, que seria acolher o habeas corpus, em respeito à clausula constitucional que prevê o trânsito em julgado da pena antes da prisão da pessoa condenada.

   É verdade que a decisão provocaria uma reação em fúria da TV Globo e demais aliados de Sérgio Moro e Deltan Dallagnol, que sustentam Facchin desde que ele foi escalado para ocupar o lugar de Teori Zavaski mas é o caso de perguntar: não é para isso que existem juízes e uma corte suprema?

   Facchin negou um habeas corpus favorável ao mais popular político brasileiro de forma cautelosa, o que se vê pelo prazo de divulgação -- véspera de Carnaval, quando as atenções da maioria envolvem outras prioridades, sabemos todos.

    Numa demonstração de que não queria assumir sòzinho uma decisão de tamanha envergadura, que terá um impacto imenso na sucessão presidencial 2018,  Facchin decidiu dividir a próxima fase dos trabalhos que envolvem Lula com a presidente do STF, Carmen Lúcia.

   Em vez de arquivar o pedido com uma decisão sumária,  alternativa vista como a mais desastrada pela defesa, determinou que a decisão fosse transferida ao plenário de 11 juízes que compõe o STF.  Deixou uma brecha aberta para o pleito seguir adiante. Mas  ela é mais estreita do que se poderia imaginar e pode não se abrir nunca, o que mostra limites da decisão. Na prática, tudo vai depender da vontade de Carmen Lucia.

   O juiz natural para decisões de maior envergadura sobre a Lava Jato, no STF, não é o plenário, mas a Segunda Turma, formada por cinco ministros. É ali, onde Facchin desempenha o papel de relator, que as grandes questões em torno da Lava Jato tem sido resolvidas. É certo que nesse ambiente a decisão sobre o habeas corpus teria um fundamento técnico inegável e uma base sólida, no artigo 5 da Constituição. Há um problema de natureza aí.   

   É que a Segunda Turma tem sido o cenário de derrotas importantes de muitas decisões   alinhadas com  Sérgio Moro, em função de uma maioria consolidada de 3 votos 2, que tem desautorizado Facchin com frequência e regularidade.  Ao encaminhar a decisão para os 11 ministros, Facchin escolheu levar a disputa para um  ambiente no qual as chances de Lula sair vitorioso continuam reais -- mas menores do que na Segunda Turma.

    Acima de tudo, a decisão dirige os holofotes para a presidente do Tribunal, Carmen Lúcia.  

   Num episódio que confirma a necessidade de que nossos magistrados respeitarem o princípio de que só devem se manifestar pelos autos, há poucos dias Carmen Lucia comprou um debate público ao dizer que o STF ficaria "apequenado" resolvesse debater a situação de Lula.

    Ao dividir responsabilidades na decisão, Facchin produziu um efeito instrutivo importante.

   Mostrou que, qualquer que seja a estatura que a discussão venha a assumir,  o debate sobre o destino de Lula já está em curso no STF.

    Isso quer dizer que deve ser feito às claras, sem demora, dentro das regras que envolvem as decisões do tribunal, ainda que isso custe à sua presidente assumir uma postura de humildade e reexaminar o próprio erro. Pode ser uma reação incomum mas torna-se inevitável num  universo em que togas que deveriam se manter silenciosas tornaram-se falantes. 

   Caso decida deixar o assunto fora de pauta, atendendo a pressões previsíveis, a responsabilidade de Carmen Lúcia estará marcada pela pior das posturas. Falar em omissão seria pouco.

   Do ponto de vista do Judiciário, seria um novo gesto de enfraquecimento do STF como  instituição deve decidir e atuar de forma coletiva, única forma de produz uma jurisprudência capaz de gerar segurança aos brasileiros e superar ambiente atual de  ruptura permanente e deliberações individualizadas que marcam os difíceis dias presentes.

   Do ponto de vista da maioria dos brasileiros, seria a exibição de uma atitude calculista de quem teme medo de dar a palavra ao plenário -- como o próprio relator da Lava Jato demandou  -- pelo receio obvio de uma derrota. Pior: seria a confirmação de uma justiça que funciona com "derrotas" e "vitórias" de caráter partidário, o que só é aceitável em tribunais políticos.

    A menos que esteja acreditando em estímulos sob medida para sonhar com o trono de Imperatriz do Brasil, não resta a Carmen Lucia outra atitude a não ser chamar o plenário para discutir e votar. Como presidente do STF, sua única prioridade legal é defender a Constituição escrita por parlamentares escolhidos em 1986 pelo voto de 69 milhões de brasileiros. 

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