Pepe Escobar: Ninguém espere que Trump mande a Cavalaria, se MbS deixar-se cercar

13/1/2018, Pepe Escobar, Information Clearing House

Traduzido Pelo Coletivo Vila Vudu
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Seja ou não mero fornecedor de "fatos alternativos", Michael Wolff em seu Fire and Fury tenta entrar dentro da cabeça de Donald Trump enquanto concebia a nova política exterior de Washington para o Oriente Médio.

Nas palavras de Wolff, eis o que pensava o presidente dos EUA.

"Há basicamente quatro atores [ou, pelo menos, se pode esquecer todos os demais], Israel, Egito, Arábia Saudita e Irã" – escreve Wolff no seu recente livro, muito controvertido. "Os três primeiros podem ser unidos contra o quarto.

"E Egito e Arábia Saudita, dado o que desejam relacionado ao Irã – e qualquer coisa a mais, desde que não interfira com interesses dos EUA – pressionarão os palestinos para que façam um acordo" – prossegue Wolff.

Até agora, o que se sabe com certeza é que Henry Kissinger, secretário de Estado e Conselheiro de Segurança Nacional no governo do presidente Richard Nixon, atuava como conselheiro do genro de Trump e seu enviado ao Oriente Médio, Jared Kushner.

Ao mesmo tempo, o príncipe coroado Mohammad bin Salman, ou MBS, ia construindo um relacionamento com Kushner e promovendo sua "Visão 2030" para fazer sombra a Dubai.

O que se pode descrever como Plano Kushner & MBS para o Novo Oriente Médio começou a ganhar forma quando Mohammad bin Salman visitou a Casa Branca em março de 2017.

Depois de oferecer um saco de negócios a Trump, convidou o presidente dos EUA a visitar Riad em maio. Havia também a vaga promessa (na verdade, promessa reciclada dos anos Obama) de que a Arábia Saudita compraria US$110 bilhões em armas e investiria $350 bilhões nos EUA nos dez anos seguintes.

Suspense para o próximo capítulo

Então, à página 233 de Fire and Fury, vem o gancho de suspense para fisgar para o próximo capítulo: "Poucas semanas depois da viagem, MBS prenderia MBN [Mohammed bin Nayef] na calada da noite, para forçá-lo a desistir do título de Príncipe Coroado, que MBS então assumiria para si" – escreve Wolff. – "Trump então diria aos amigos que ele e Jared arquitetaram o golpe: 'Pusemos nosso homem no trono'."

Claro que ninguém pode garantir que "diria" signifique que o presidente realmente disse tal coisa. A questão fica aberta a pesquisas. Mas o que é garantido, confirmado por fontes próximas à Casa de Saud, é que MBS realmente operou em união com Kushner.

Crucial nesse caso é que Kushner interpretou a efusividade de Trump como luz verde para partir à caça do Qatar. Afinal, o presidente parecia ter engolido o boato de Riad, segundo o qual o Qatar estaria promovendo o terrorismo ao apoiar a Fraternidade Muçulmana. E que a Arábia Saudita seria inocente nessas acusações de 'apoio a terroristas'.

Além disso, MBS deixara no ar a impressão de que Riad ofereceria uma base militar aos EUA para substituir al-Udeid de Doha.

O Secretário de Defesa dos EUA, James Mattis, tem fortes laços com a base, desde o tempo em que esteve à frente do Comando Central dos EUA, antes de encarnar o personagem de conselheiro militar dos Emirados Árabes Unidos no reinado do Príncipe Coroado de Abu Dhabi, Xeique Mohamed bin Zayed Al Nahyan.

Tudo isso se encaixa numa narrativa quase plausível de que Kushner teria preparado o terreno para Trump dar sinal verde ao plano de MBS para atacar o Qatar e substituir MBN, antigo favorito da CIA, como Príncipe Coroado.

Toda a informação disponível aponta nessa direção, bem como toda uma suposta inteligência alemã, desde o final de 2016.

Todos sabem o que aconteceu quando os sauditas e outros membros, incluindo os Emirados Árabes Unidos do Conselho de Cooperação para os Estados Árabes do Golfo ('Conselho de Cooperação do Golfo, CCG), puseram em prática seu "bloqueio" contra o Qatar. Irã e Turquia apoiaram Doha, e a 'unidade' do GCC foi testada até quase o ponto de rompimento.

Ainda não se sabe com certeza se os EUA algum dia receberão as centenas de bilhões de dólares em novos investimentos sauditas que lhes teriam sido prometidos por MBS. Só o tempo dirá.

Entrementes, o bilionário saudita príncipe Alwaleed bin Talal, muito amigo de Bill Gates fundador da Microsoft, e do magnata de empresas de mídia Rupert Murdoch, continua em prisão domiciliar, como parte do golpe de Riad contra elementos importantes ligados à família real saudita.

Não se ouviu/leu sequer algum tuíto do príncipe desde que foi preso, o que é de estranhar, dado que é proprietário de parte da empresa Twitter de notícias online e serviços de networking.

Caixa de maçãs políticas 

Esse estranho paradoxo tem a ver com a suposta concorrência pública para venda da Aramco por supostos $2 trilhões, que foi adiada para o fim do ano em curso mas, agora, talvez só aconteça em 2019, segundo funcionários sauditas. É parte do plano de jogo de MBS: por que perturbar uma das maçãs, quando uma caixa inteira de maçãs políticas acenam do fundo de uma concorrência aberta a todas as incontáveis riquezas do planeta inteiro?

Os bancos de investimento de Wall Street só fazem tecer os mais rasgados elogios à Aramco. Mas também podem optar por uma dose de 'choque e pavor'. O leilão público de ações da Aramco pode não ir para New York, evento que para Trump seria favas contadas, sequer para Londres.

Ali Shihabi, fundador do think-tank Arabia Foundation, que tem sede em Washington, vê as coisas de outro modo. Sugeriu que os chineses poderiam comprar diretamente uma fatia da Aramco, depois do que haveria leilão limitado das ações restantes, na Bolsa de Valores da Arábia Saudita.

Essa, diz ele, seria a melhor opção para Riad. "Alocar as ações em mãos de um grande investidor estratégico como a China tem a vantagem de ser solução mais simples, mais rápida e menos sujeita às surpresas dos mercados públicos, que uma exposição pública em Londres ou New York" – disse Shihabi.

Se acontecer assim, Trump não terá muito com o que se entusiasmar com MBS. Pode-se também acrescentar o problema palestino a esse mix. Pode acontecer de MBS simplesmente não ser capaz de cumprir a promessa de um Grande Acordo Israel-Palestina-Mundo Árabe, que não parece haver dúvidas de que tenha sido discutido em Washington e Riad.

Esse 'acordo' tornou-se virtualmente impossível depois que Trump reconheceu formalmente Jerusalém como capital de Israel.

Tudo isso considerado, quem está por cima? Dado que todos os roteiros para o Oriente Médio e Arábia Saudita foram escritos e rasgados com impressionante regularidade, que ninguém espere que a Casa Branca de Trump envie a cavalaria, no caso de MBS deixar-se cercar.




MBS simplesmente não tem como cumprir a promessa de um Grande Acordo Israel-Palestina-Mundo Árabe – que agora absolutamente não pode ser apresentado à rua árabe, depois que Trump reconheceu formalmente Jerusalém como capital de Israel.
Assim sendo, a pergunta é: quem está REALMENTE no comando?
Nas palavras de uma fonte top de investidores no Golfo, íntimo do modus operandi da Casa de Saud –, aqui elaborando sobre o que já me dissera, comentado em colunas anteriores:
"MBS cometeu dois erros fatais ao prender os dois filhos do rei Abdullah, Turki e Miteb. Miteb comandava a Guarda Nacional e sua prisão jogou os oficiais contra MBS. Além do mais, a cooperação entre Kushner e MBS não está sendo bem digerida pela inteligência saudita. Muito se fala de que haveria um golpe em preparação."
Para ''nosso homem no trono", MBS, a coisa fica muito pior:

"O reconhecimento de Jerusalém por Donald Trump pôs MBS numa posição insustentável, depois de ele ter dito a membros da família real, não em alguma prisão, mas no Ritz, que só ele tinha relacionamento próximo com o presidente dos EUA. Agora, esse "relacionamento" é como uma rocha atada ao seu pescoço. No pé em que estão as coisas, com toda a família real desacreditada e presa como ladrões, e com MBS já tendo também se autodesacreditado, deve-se concluir que o próximo golpe venha diretamente dos militares. E pode acontecer a qualquer momento, uma vez que MBS isolou-se de todos os centros de poder: do clero, da família real, das massas e dos militares. A posição de MBS é insustentável."*****

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