Ministro da Saúde tenta usurpar sucesso de 20 anos de luta contra hepatites virais, mas o show mundial é do SUS, que ele só destrói
VIOMUNDO - 03 de novembro de 2017 às 22h40
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Os avanços no controle das Hepatites Virais no Brasil
por Fabio Mesquita*, na Tribuna de Santos
O Brasil estabeleceu seu Programa Nacional de Hepatites Virais em 2002. Em 2009, o PNHV foi integrado ao Programa de IST e AIDS, do Ministério da Saúde e constituiu o Departamento de IST/AIDS e Hepatites Virais.
Em maio de 2010, nosso país liderou na Assembleia Mundial de Saúde, uma resolução (aprovada), criando o Dia Mundial de Luta Contra as Hepatites Virais, colocando na pauta de todos os governos este tema como relevantíssimo para a Saúde Pública. A própria Organização Mundial da Saúde (OMS) estabeleceu seu Programa Global a partir deste evento.
Em 2013, em parceria com experts e ONGs no tema, fizemos um esforço adicional para tirar as hepatites virais da lista de doenças negligenciadas, impulsionando a resposta brasileira ao agravo.
A partir daí, demos passos importantes nesse sentido, como a publicação do primeiro protocolo de transmissão vertical (de mãe para filho) incluindo HIV, Sífilis e Hepatites Virais e da modernização da estratégia de controle da transmissão vertical da hepatite B, introduzindo tratamento medicamentoso no terceiro trimestre da gestação.
Ainda em nossa gestão implantamos, junto ao Programa Nacional de Imunizações, a vacina contra a hepatite A em crianças. Além de atualizarmos o Protocolo de Tratamento Clínico da Hepatite B, publicado posteriormente.
Outro ponto fundamental levantado por nossa gestão, foi a preocupação efetiva com a Hepatite Delta, até então bastante negligenciada.
O tempo passa e grandes mudanças surgem. Graças ao avanço tecnológico, surgiu a cura da hepatite C com os novos Antivirais de Ação Direta, que apresentaram taxas de cerca de 95% de cura, e que revolucionaram o tratamento no Brasil e no mundo. Na sequência, outro passo inovador com enorme impacto na saúde da população brasileira e no Sistema Único de Saúde (SUS), foi a publicação do novo Protocolo Clínico de Tratamento de Hepatite C publicado em Maio de 2015.
No mesmo ano fechamos uma negociação com três empresas produtoras de medicamentos (Gilead, Bristol Myers Squibb e Jansen) conseguindo barateamento nos custos dos remédios em relação aos preços praticados na Europa e Estados Unidos, de 95%. Isto viabilizou preços mais acessíveis e que o SUS poderia pagar.
Foi uma verdadeira Força Tarefa para promover tantos benefícios aos que mais necessitavam. Para tal contamos com apoios indispensáveis do Ministro Arthur Chioro, do então Secretário de Vigilância, Jarbas Barbosa, da Comissão de Incorporação de Tecnologia do SUS (CONITEC), da ANVISA, e dos excelentes técnicos do DIAHV liderados pelo Dr. Marcelo Naveira, outro santista de ponta.
Contamos ainda com o apoio de um Comitê Técnico Assessor de excelencia, com celebridades da área como nosso colega santista , Dr. Evaldo Stanislau , Dra. Leila Beltrão e Dra. Kycia Maria, dentre outros, e com a ajuda incondicional da Sociedades Brasileiras de Hepatologia e de Infectologia, liderada pelos médicos Edison Parise e Erico Arruda, respectivamente.
Tudo isto para atender a uma reivindicação histórica do movimento social de luta contra as hepatites no Brasil, liderados por mais um Santista, Jeova Fragoso, por Carlos Varaldo dentre outras lideranças.
Os novos medicamentos começaram a ser distribuídos em outubro de 2015 e nos dois primeiros anos de tratamento promoveram a cura de aproximadamente 60 mil pessoas, que tinham grau de fibrose hepática avançada.
A partir deste momento criamos um precedente para considerar a Hepatite C uma doença possivel de eliminação. Finalmente passou a ser possível sonhar com a expansão do tratamento para todos. Isto fez do Brasil de novo uma referência.
Tratamos e curamos de maneira pública e gratuita milhares de pessoas, tiramos inúmeros pessoas da futura fila de transplante, com medidas de tremendo impacto social e elevado custo benefício para o SUS.
Todo este histórico e iniciativa da gestão à época, deu ao Brasil o privilégio de sediar o II Summit Mundial de Hepatites Virais, que começa hoje em São Paulo, reunindo quase mil pessoas de todo o mundo, entre autoridades da saúde, sociedade civil e especialistas.
Desejamos sucesso ao evento e seguimos acompanhando de perto os avanços em todo o mundo na luta contra as Hepatites Virais.
*Fabio Mesquita é médico, doutor em Saúde Pública e atualmente trabalha na sede da OMS, em Genebra, Suíça, no Departamento de HIV e no Programa Global de Hepatites Virais. Durante muitos anos atuou na Baixada Santista, em SP. De 2013 a 2016, foi diretor do Departamento de DST/AIDS e Hepatites Virais do Ministério da Saúde.
PS de Conceição Lemes
Terminou hoje (03/11), em São Paulo, a Cúpula Mundial de Hepatites Virais 2017 (World Hepatitis Sumitt 2017), organizada pela OMS e a Aliança Mundial contra as Hepatites, em parceria com o governo brasileiro.
Gol de placa. O artigo de Fabio Mesquita, publicado nessa quarta-feira, veio bem a calhar.
Ao resgatar os passos cruciais do enfrentamento das hepatites virais no Brasil, ele põe a realidade em pratos limpos.
Como?!
Diz o ditado popular: Filho feio não tem pai. Ao qual, acrescento: se é bonito, endinheirado ou bem-sucedido, a paternidade é disputada a tapa, na base do vale-tudo.
Esses tempos sombrios parecem confirmar a regra.
Assistimos ao show mundial do Sistema Único de Saúde (SUS) na luta contra as hepatites virais, uma batalha duramente travada durante os últimos 20 anos.
Curiosamente, as manifestações do Ministério da Saúde tentaram passar a impressão de que o protagonismo do Brasil é fruto do governo atual tamanha a jactância do ministro atual, o engenheiro Ricardo Barros, que age como se fosse pai da criança.
Logo ele:
1) o ministro dos planos privados de saúde, que odeia tanto o SUS;
2) o primeiro ministro da Saúde anti-SUS na história do Brasil;
3) o ministro que está aniquilando o SUS e as políticas públicas de saúde consagradas, para entregar tudo ao mercado.
Portanto, guardam bem:
1)Os resultados positivos no enfrentamento das hepatites virais fazem parte, sim, das conquistas do SUS.
2)Os avanços do Brasil nessa área, inclusive o fato de a cúpula ter acontecido aqui, decorrem de um trabalho construído diariamente durante duas décadas por milhares e milhares de mãos.
Leia-se: governos federal, estaduais e municipais, profissionais de saúde (entre os quais, médicos, enfermeiros, agentes comunitários, psicólogos, fisioterapeutas, nutricionistas), cientistas, professores, organizações não governamentais, usuários e familiares.
Realmente, uma construção coletiva em que pesou muito a atuação de entidades e movimentos sociais, representados no Conselho Nacional de Saúde (CNS), que Ricardo Barros faz questão de desrespeitar direto.
Só que o ministro passa, esta repórter passa, e o CNS fica.
Não adianta alguém tentar usurpar os louros dessa luta histórica. Não cola bem vai colar.
Há alguns dias o ministro afirmou que o Brasil tem como meta eliminar a hepatite C até 2030, como recomenda a OMS.
Como, ministro?! Tocando bumbo?
Com desmonte da saúde pública levada a cabo por sua gestão e o congelamento dos recursos nos próximos 20 anos, já, já, estaremos falando em grandes retrocessos.
Como já ocorrem com a fome e a pobreza crescentes no Brasil, obras do governo Temer.
Certamente junto virão muito mais doenças e mortes.
E, aí, está um título que ninguém poderá lhe tirar: o de ter ajudado a cavar o túmulo de milhares e milhares de brasileiros.
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