Janio: Repentina e sem razão perceptível, substituição na PF merece suspeitas

Fernando Segóvia cumprimenta Leandro Daiello (à dir.) no gabinete do diretor da PF, em Brasília
Fernando Segóvia cumprimenta Leandro Daiello (à dir.) no gabinete do diretor da PF, em Brasília
por Janio de Freitas - na Folha - 12/11/2017

A articulação é muito maior do que parece. Tomam-se como casos isolados, cada qual com existência e sentido próprios, a mudança na Polícia Federal, a divisão conflituosa do PSDB e as obscuridades da nova Procuradoria-Geral da República. São, no entanto, partes que se interligam em um todo de ações e expectativas ansiadas pelos políticos acusados de ilicitudes, ou passíveis de sê-lo.
Quem perguntasse por quê, afinal de contas, o pugilato no PSDB, na melhor hipótese ouviria uma referência improvisada e vaga à eleição presidencial 2018.
Mas, enrolado em acusações desmoralizantes, Aécio Neves é alheio às candidaturas à Presidência. O que lhe interessa é driblar os problemas policiais e judiciais que o ameaçam. Interesse idêntico ao que move Michel Temer e seu grupo.
O senador Tasso Jereissati pensa no reerguimento do PSDB, Aécio Neves pensa no PSDB como parte do governo que pode ser uma possibilidade de deter, ou até reverter, os processos criminais e suas eventuais consequências.

Esse é o seu entendimento com a pessoa, o político e o objetivo de Temer. E se mantém esse laço, apesar do que lhe custa, pode-se supor que tem elementos indicativos de maiores probabilidades ali do que na força política de um PSDB restaurado. A escolha de Aécio é como um depoimento sobre intenções de Temer e seu grupo.
Já por ser repentina e sem razão perceptível, a substituição do diretor da Polícia Federal merece suspeitas. Ainda mais sugestiva é a escolha feita entre políticos com problemas policiais-judiciais.
Além disso, as opiniões consideráveis sobre o escolhido, delegado Fernando Segóvia, são opostas demais. O que não chega a ser original, mas é impróprio para o cargo —dos mais fechados ao conhecimento público de sua atividade e, complemento apropriado, dos mais instrumentalizados para ações de todos os tipos e fins.
Leandro Daiello não caiu por falha funcional. Fosse por isso, a substituição não precisaria se dar sem a participação do ministro que o tinha como subordinado.
Em seguida à concordância em permanecer no cargo, a pedido do ministro Torquato Jardim, Daiello surpreendera com a desmontagem súbita da equipe policial da Lava Jato. Não os que prendem: os que investigavam. Pelo visto, não foi o bastante. E sabe-se qual pode ser o seguimento lógico daquela medida.
Se Daiello não caiu à toa, Segóvia não subiu à toa. Substituição que se dá quando Raquel Dodge, substituta do incriminador de políticos, vai completar dois meses no cargo sem, no entanto, deixar clara sua linha de ação.
Carência e coincidência mais fortes quando se sabe que decisões de Rodrigo Janot passam ou vão passar por exame da equipe montada por Dodge. O provável é haver, sim, o que deva ser revisto, com tantas medidas e tamanha voracidade acusatória da Lava Jato. Mas a revisão compete a juízes. Na própria Procuradoria-Geral da República, o exame expõe-se a propósitos mais do que técnicos. Ainda que invoque tal motivação.
E sem jamais negar atenção a Eduardo Cunha, uma observação que vale pelas anteriores. Desde preso e até suas penúltimas manifestações, em juízo ou não, ele fez acusações e insinuações gravíssimas a Michel Temer.
O juiz Sergio Moro, com sua personalíssima imparcialidade, chegou a intervir e eliminar várias perguntas de Cunha a Temer, porque "constrangeriam o presidente".
Pois bem, quando a direção da PF passa por substituição inexplicada, Aécio racha o PSDB em favor de Temer e seu grupo, e a Procuradoria-Geral da República cria mais suspense do que clareza, Eduardo Cunha eleva Temer a inocente absoluto, vítima de difamações e de uma tentativa de golpe. Só há um motivo para fazê-lo.

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