"Cinturão e Estrada" chineses estão enlouquecendo os EUA! Por MK Bhadrakumar

20/10/2017, MK Bhadrakumar, Indian Punchline

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Quando falou ao Centro de Estudos Estratégicos Internacionais em Washington, 2ª-feira passada, em discurso intitulado 'Definir nosso relacionamento com a Índia para o próximo século', Tillerson falou da Iniciativa Cinturão e Estrada, ICE, dos chineses, na sessão de perguntas e respostas. Convidado a elaborar sobre uma expressão lastimável que usara no discurso – "economia predatória" no Pacífico Asiático – Tillerson respondeu como segue:
"É importante que aquelas democracias e economias emergentes (no Pacífico Asiático) tenham meios alternativos para desenvolverem a infraestrutura de que precisam, mas também que desenvolvam suas economias. Temos acompanhado a ação de outros na região, em particular da China, e os mecanismos de financiamento que leva àqueles países, que resultam em jogar sobre as costas deles níveis enormes de dívidas. Em geral não criam empregos, projetos de infraestrutura devem ser tremendos geradores de empregos naquelas economias, mas quase sempre, são levados trabalhadores estrangeiros para lá para executar aqueles projetos de infraestrutura. O financiamento é estruturado de tal modo que torna muito difícil para eles obterem financiamento futuro, e com frequência há gatilhos disfarçados no financiamento que resultam em calote e em conversão da dívida, trocada por ações da empresa.

Quero dizer: não é estrutura que possa apoiar o crescimento futuro desses países. Consideramos importante começar a desenvolver algum meio de reagir a isso com medidas alternativas de financiamento, estruturas de financiamento. E durante a Cúpula do Leste Asiático – Cúpula dos Ministros, em agosto, iniciamos conversação discreta com outros sobre o que estão vendo, do que precisam, e estamos iniciando uma conversação discreta, de modo multilateral tipo "Como podemos criar mecanismos alternativos de financiamento?"" Não conseguiremos competir com os termos que a China oferece e – mas os países têm de resolver: o que querem dar em troca de garantir a própria soberania e o controle futuro de suas economias? E já tivemos também as mesmas discussões com eles, também."


Respondendo questão na sequência, Tillerson acrescentou:

"Bom, acho que, em muitas questões, é o que temos de argumentar com esses países que precisam de financiamento para infraestrutura, que eles realmente têm de pensar sobre o futuro de longo prazo de como desejam que o país deles e suas economias se desenvolvam… Aqui estão todos os outros benefícios que você ganha quando deixa que dólares de investimento fluam desse modo para você: Você conserva o controle da própria soberania, você preserva o controle sobre as leis e a execução dentro do próprio país. E isso deve ter valor significativo para eles, quando pensam sobre o futuro. É isso. Quando há uma base competitiva direta é difícil competir com alguém que oferece coisas, em termos financeiros, que valem alguns pontos do lado tomador [ing. on the lending side], mas temos de ajudá-los a ver as coisas na perspectiva da habilidade, no mais longo prazo, para controlar o futuro do país deles, controlar o desenvolvimento da economia deles num sistema baseado em regras. E o que nós realmente promovemos é vocês mantêm sua soberania, mantêm-se comprometidos com a ordem baseada na lei, e traremos outras opções para vocês."


Nem uma vez Tillerson pronunciou a palavra "ICE", sem parar um momento de falar mal da coisa. Importante: revelou que os EUA estão mantendo "conversação discreta sobre o que estão vendo, do que precisam" com estados regionais e sobre se poderiam conceber mecanismos alternativos de financiamento "tipo multilaterais" para enfrentar a Iniciativa Cinturão e Estrada, ICE, da China com "medidas alternativas de financiamento, estruturas de financiamento." 

Fato é que a ICE chinesa está enlouquecendo os norte-americanos. 

A China está fazendo a "engenharia reversa" do que o ocidente fez de ampliar financiamentos para estimular o comércio. A revista The Atlantic publicou matéria consistente (China Is Quietly Reshaping the World [China está silenciosamente reformatando o mundo]), sobre como a ICE chinesa mina a influência regional dos EUA. O que os EUA fizeram mediante o Plano Marshall para "reconstruir" a Europa do pós-guerra foi prover o equivalente a $800 bilhões de dólares (calculados como porcentagem do PIB de hoje), empréstimo que, como retorno, fez dos EUA a maior nação em comércio do mundo e emprestador n.1. Agora a China está seguindo essa mesma trilha, estendendo fundos dos quais $300 já estão lá e com planos para gastar outro $1 trilhão na próxima década.

E a China já é a principal parceira comercial (importações e/ou exportações) de nada menos que 92 países (contra os 57 dos EUA). A China é hoje maior emprestador de fundos que o Banco Mundial. A virada aconteceu, bem-sucedida, em período notavelmente breve de tempo. Claro está que a China está adotando a mesma via que os EUA adotaram para expandir sua ação política, e para alavancar outros países que lhes ficaram devendo favores. Se a Iniciativa Cinturão e Estrada dos chineses for bem-sucedida, será ainda mais difícil para os EUA imporem a própria vontade a outros países. 

A chamada "ordem internacional liberal" estará gravemente ameaçada. Até Tillerson já admitiu: "Não conseguiremos competir com os termos que a China oferece."

Estamos ainda no começo. A China aprende depressa. O mais provável é que, em futuro próximo, a China denuncie ela mesma os vícios dos quais Tillerson a acusou. Pequim anunciou esse ano orientações mais rígidas para seus investidores no exterior. Assim também, podemos esperar melhores padrões de trabalho, mais respeito aos direitos humanos e mais atenção ao meio ambiente nos projetos chineses, à medida que o tempo vá passando. Pequim já se orgulha de exibir o Banco Asiático de Investimento e Infraestrutura como banco atento aos melhores padrões mundiais nesses campos.

Dito em poucas palavras, os EUA não têm o $1 trilhão para pagar para ver. A Iniciativa Cinturão e Estrada da China está desnorteando os EUA. Se a China mantiver a atenção à boa qualidade de suas ferramentas nesse seu salto geoeconômico à luz da experiência, a Iniciativa Cinturão e Estrada chinesa reformatará profundamente a ordem mundial na direção de sistema internacional mais igualitário e justo, sem para isso destruir a ordem existente.

A questão derradeira é "que força movimenta a Iniciativa Cinturão e Estrada – geoestratégia ou geoeconomia? Especialmente na Índia, analistas de política exterior tendem a ver a ICE chinesa sob lente principalmente geopolítica, como tentativa que Pequim empreende para se autoalavancar em termos políticos, sobre os vizinhos. Sem dúvida, a China espera usar seus vastos recursos econômicos como ferramenta chave para manter a estabilidade regional e projetar a própria liderança sobre os países próximos.

O Corredor Econômico China-Paquistão [ing. CPEC] é bom exemplo. Mas também é muito fácil exagerar. 

Estudo recente e surpreendentemente original foi feito nessa área pelo renomado think-tank australiano Lowy Institute. O estudo concluiu que:

  • Os dois objetivos (geoestratégico e geoeconômico) não são de fato contraditórios. A China está usando a ICE para afirmar a própria liderança regional mediante vasto programa de integração econômica. Seu objetivo é criar uma cadeia regional de produção, da qual a China seria um centro de manufatura e inovação avançadas, e padrão a ser seguido.
  • Mas também é verdade que a ICE ajudará a China a superar um de seus mais prementes desafios econômicos. 
  • Deles, três são especialmente relevantes para compreender os objetivos centrais da Iniciativa Cinturão e Estrada:
  • – encorajar o desenvolvimento regional na China, mediante maior integração com economias vizinhas; 
  • – garantir a modernização da indústria chinesa e a exportação dos padrões chineses; e
  • – atacar o terrível problema do excesso de capacidade.


O relatório do estudo do Lowy Institute "Para compreender a Iniciativa Cinturão e Estrada da China" pode ser lido aqui. *****

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