Aparecida: medo do desemprego, gratidão e vaias a políticos marcam dia da Padroeira

CAPITAL DA FÉ
Na comemoração dos 300 anos da aparição da imagem da santa, encontrada por pescadores, fieis expressam devoção e esperança, mas não perdoam os que constrangeram até o papa Francisco com o golpe no Brasil

por Sarah Fernandes e Danilo Ramos, com redação RBA publicado 12/10/2017

DANILO RAMOS/RBA
apa-abre.jpg
Organizadores calculam em 200 mil os visitantes este ano. Regina Célia Pereira veio de Ilhéus pedir ajuda à santa por um emprego para o marido, que é marítimo e foi demitido em março de 2016. "Com a Lava Jato todo trabalho parou. É terrível para nossa família"
Aparecida – Mais de 200 mil romeiros foram esperados na cidade para a celebração dos três séculos de aparição da imagem de Nossa Senhora Aparecida, neste feriado da Padroeira do Brasil. As pessoas vêm de todas as partes do país. Algumas caminham durante horas pelas estradas que levam ao santuário. Outras vêm a cavalo. O objetivo: agradecer por algum pedido alcançando a partir de um ato de fé e renovar pedidos. A crise, o desemprego, a ausência de perspectiva (mas não de esperança) tiveram destaque nas palavras dos fieis.
As pessoas vistas como responsáveis por este momento de desalento do país também foram lembradas pelo povo: com vaias. Entre eles o presidente ilegítimo Michel Temer – vaiado mesmo sem estar presente, apesar de ter feito convite ao papa Francisco para participar da festa. Francisco foi mais um chefe de Estado que, constrangido com o golpe no Brasil, recusou. O governador de São Paulo, Geraldo Alckmin (PSDB), também não foi poupado de vaias, assim como os representantes do governo federal, ministros Gilberto Kassab (Ciência e Tecnologia) e Antônio Imbassahy (Secretaria-Geral) não foram bem vindos na cidade batizada pela imagem encontrada há 300 anos na margem norte do Rio Paraíba, região lesta do interior paulista.

Conta a história foi uma pescaria mudou a história do catolicismo no Brasil: três pescadores – Domingos Garcia, Felipe Pedroso e João Alves – jogaram redes no Rio Paraíba, obedecendo à ordem da Câmara de Guaratinguetá de trazer o máximo possível de peixes para recepcionar do novo governador. Após horas de trabalho, porém, não tinham conseguiam nada. Até que em um dos lançamentos da rede pescaram o corpo uma imagem de barro decaptada. Na próxima tentativa veio à cabeça. Poucos minutos depois havia tanto peixe que mal podiam carregar.
Em 1930, a escultura negra de 37 centímetros ganhou do Papa Pio XI o título de Padroeira do Brasil e virou um dos símbolos do país. Uma pequena capela construída pelo padre José Alves Vilela abrigou a imagem por 145 anos até ser transferida para a Igreja Matriz, que hoje é o Santuário Nacional de Aparecida, maior centro mariano do mundo em tamanho e segundo maior em frequência, atrás apenas do de Nossa Senhora de Guadalupe, no México. Pelo menos 12 milhões de romeiros por ano visitam a basílica, localizada a 180 quilômetros da capital paulista.
Logo após o aparecimento da imagem no rio começaram os relatos de milagres: velas se acendiam sozinhas, as correntes de um escravo se arrebentaram após ele pedir proteção à santa, as patas dianteiras de um cavalo grudaram nas pedras da escadaria da igreja quando seu dono ameaçou entrar nela montado, uma menina cega de Jaboticabal (SP) começou a enxergar e um menino que se afogava no rio Paraíba foi milagrosamente salvo.
A reportagem acompanhou alguns em romaria para Aparecida – que não tem o “Norte” no nome oficial. Acompanhe.
DANILO RAMOS/RBAapa-benedito.jpg
Vi muitos colegas sendo demitidos nos últimos meses e venho aqui também pedir por eles, porque imagino o sofrimento dessas famílias. Peço também pelo Brasil, que atravessa um momento difícil, e pelo mundo, que precisa de paz. Ninguém vence sozinho, diz o ferramenteiro Benedito Lobo, de 61 anos, de Diadema, no ABC paulista
DANILO RAMOS/RBAapa-3.jpg
O neto do comerciante Joaquim Rodrigues da Silva foi desenganado por médicos ao nascer prematuro. 'Hoje ele está ótimo. É alegria das nossas vidas', conta enquanto atravessava de joelhos os 392 metros da rampa que dá acesso à Basílica, ao lado do filho Bruno Allan da Silva.A família de Cícero Aparecido passou por um grande susto: após quitarem a casa, com as economias de uma vida, descobriram que o antigo proprietário tinha dívidas sobre o imóvel, e punha em risco a propriedade. 'Agora temos a escritura'Desde 1977, João Moiséis de Souza vem todos os anos de São José do Rio Preto em viagem de 700 quilômetros. A imagem da santa o acompanha há 25 anos e o altar, feito pelo cunhado, há 18. Sofri uma perfuração no olho e o médico disse que eu ia perder a visão. Enxergo perfeitamente"Para conseguir emprego no ano que vem a estudante de Direito Lariane Rocha, de 22 anos, tinha que passar no exame da OAB. "Consegui passar faltando um período para minha formatura", diz a jovem de Campo Grande (MS). Dos 50 alunos de sua turma apenas cinco foram aprovados
DANILO RAMOS/RBAapa-maria-soares.jpg
Maria Soares da Silva veio em romaria de João Alfredo (PE) para pedir pela família. 'Tenho muitos parentes desempregados e peço a Nossa Senhora Aparecida por eles', diz enquanto entrega à santa uma jóia que ganhou no dia do seu casamento
DANILO RAMOS/RBAapa-2.jpg
Por saúde de um familiar, emprego e por um país melhor. Romeiros caminham por dias até a chegado ao Santuário. Vim só por agradecimento. Muitas coisas boas que acontecem para mim são pela intercessão dela, diz a analista financeira Adriana MartinsO metalúrgico Leonardo Carvalho, de 35 anos, saiu à 1h de São José dos Campos e segue caminhando por 85 quilômetros em agradecimento pelo emprego 'e em oração pra não ficar desempregado novamente'
DANILO RAMOS/RBACapela
Na Capela das Velas, milhares de devotos desfilam pedidos e agradecimentos a Nossa Senhora Aparecida

Comentários