Nassif: Xadrez de Janot, o Asmodeu trapalhão
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“Entre um burro a um canalha, não passa o fio de uma navalha” (Millor Fernandes)
Ninguém imaginaria, anos atrás, que, indicado Procurador Geral da República, um burocrata mediano, especializado nas pequenas demandas corporativas do Ministério Público Federal, se constituiria – por omissão e por iniciativas empurradas pelo medo – no grande anjo vingador, o Asmodeu capaz de decretar a morte das instituições brasileiras para punir os pobres pelos anos de dissipação e corrupção dos poderosos.
Na defesa do regime democrático, principal missão do MPF, o PGR Rodrigo Janot falhou vergonhosamente, contribuindo por omissão e ação para um golpe de Estado, em uma falta total de compromisso com a República.
Agora, a divulgação, pela PGR, de cópias de mensagens do celular de uma advogada brasiliense, insinuando corrupção para diversos desembargadores do Superior Tribunal de Justiça e um Ministro do STF, Gilmar Mendes, é o terremoto final a derrubar as últimas estacas da institucionalidade brasileira.
Assim como em relação à economia e à política, em lugar do trabalho profissional de investigar a corrupção e limpar o país, resguardando as instituições, o mesmo trabalho de desmonte, de jogar a bomba na mídia despertar suspeitas generalizadas, promover um curto-circuito geral no sistema de informações.
imaturidade institucional brasileira. Só um país institucionalmente débil aceitaria passivamente a indicação de um procurador medíocre para o alto cargo de Procurador Geral da República; advogados ou juízes deslumbrados para os altos cargos de Ministro do Supremo Tribunal Federal. E, sobre eles, se jogasse o supremo desafio de abrir a caixa de Pandora da corrupção brasileira sem destruir completamente a economia e as instituições brasileiras.
O que se tem, agora, na grande tragédia brasileira.
Peça 1 – o poder Judiciário
Pelos diálogos publicados pela Veja, trata-se de uma filha típica da alta aristocracia brasiliense, arrotando ligações íntimas com o Poder e se dispondo ao trabalho sujo.
Pelo teor dos diálogos, tem-se duas possibilidades. A primeira, da compra efetiva de votos de desembargadores. A segunda, o golpe da “taxa de sucesso”, muito comum em Brasília. O sujeito se apresenta como intermediário do desembargador e pede um pagamento para conseguir o voto favorável. Há 50% de possibilidade de se adivinhar a sentença: ou o juiz votará a favor ou contra. Votando a favor, o falsário embolsa o dinheiro e o juiz fica sob suspeita.
Quais dos casos vazados se enquadram na primeira hipótese; quais os da segunda hipótese?
Houvesse um PGR maduro, esse material seria utilizado para abrir investigações sigilosas, nas quais se levantariam as provas contra os culpados e se inocentariam os inocentes. Afinal, é o MPF que possui poderes constitucionais para investigar, não a revista Veja.
No país da Lava Jato, o primeiro tribunal é o da mídia, com resultados previsíveis: destrói os honestos, pela mera exposição da suspeita; fortalece os criminosos, por estarem no mesmo balaio dos honestos.
Um dos implicados nas conversas, desembargador João Otávio Noronha, corregedor do Conselho Nacional de Justiça. Há um ano, ao tomar posse no cargo de corregedor, fez um discurso duro contra a república dos procuradores.
"Lemos todos os dias nos jornais a censura a quem vota a favor ou contra determinado investigado. Não se pode um juiz ser refém do Ministério Público, da Polícia Federal, de quem quer que seja. O magistrado existe para garantir os direitos fundamentais", disse ministro. Segundo ele, o seu papel no CNJ é "de proteger, é de blindar a magistratura das influências externas, fazer com que o juiz exerça a magistratura na mais plena liberdade, fazer com que juiz não tenha medo da mídia, mídia que se tornou um poder".
Nas conversas divulgadas pela PGR para Veja, a advogado insinua a cumplicidade de Noronha. A reportagem constata que a demanda da JBS não foi atendida. Pouco importa, Noronha está exposto definitivamente ao julgamento público.
Na outra ponta, surgem as indicações óbvias da influência de Gilmar Mendes na captação de patrocínios para o IDP (Instituto Brasiliense de Direito Público), através de Dalide Correa, seu braço direito na instituição. Como disse Gilmar sobre a relação Miller-Janot, os patrocínios ao IDP por parte de empresas interessadas em votos favoráveis de Gilmar, nem segredo de carochinha são: fatos públicos, documentados. Mas o bravo MPF prefere investigar as flores recebidas pela sra. Gilmar.
Como fica, agora? A irresponsabilidade de Janot joga uma bomba de hidrogênio no colo de sua sucessora, Raquel Dodge. Ela não terá a tranquilidade para uma investigação séria e profissional, como é de seu estilo. Cada passo será acompanhado pela mídia e sujeita a toda sorte de pressão por parte dos tribunais.
Conseguiu-se, com o vazamento, colocar todos os tribunais superiores sob suspeita.
Peça 2 – a mídia e o Executivo
Na edição em que noticia a descoberta de R$ 51 milhões em dinheiro vivo de Geddel Vieira Lima, o Globo divulga vídeo em que, nas passeatas do impeachment, ele deblatera contra a corrupção. Obviamente a reportagem deixa de relatar que a Globo foi a madrinha da entrega do poder nacional ao mais deslavado esquema de corrupção política da história, comandado pelo próprio presidente da República, Michel Temer.
Como fica agora? Os bandidos de dentro do bunker, podendo utilizar a artilharia pesada das Medidas Provisórias, das negociatas em todas as linhas. E o nosso Asmodeu da selva, dando flechadas a torto e a direito, inclusive, no próprio pé.
E a mídia perdida entre atender à demanda dos leitores, de denúncias contra Temer, e ser submissa às verbas da Secom, já que a Lava Jato, com o auxílio precioso de Dilma-Levy e de Temer-Meirelles, desmontou a economia e o fôlego que havia no setor privado.
Peça 4 – a continuidade do golpe
Desde o ano passado sabia-se que Antônio Palocci já estava negociando a delação premiada com a Lava Jato. Com José Dirceu ainda preso, Palocci já tinha sido transferido para uma ala do presídio dedicada aos futuros delatores.
Repete-se o mesmo modelo de outras delações, de acordo com os manuais da “teoria do choque” adotado por várias polícias políticas. O sujeito fica detido e torturado (no caso de Palocci, a tortura moral da expectativa de prisão duradoura) até entregar os pontos. Depois, a “omertá”, a prova de sangue para garantir sua lealdade à “famiglia” Lava Jato: declarações bombásticas de fundo político, como afirmar que Lula e Emilio Odebrecht tinham um “pacto de sangue”.
Como disse Joesley Batista na conversa auto-grampeada com Ricardo Sur, para os acordos o MPF exige palavras fortes, falar de “bandidos”, “organizações criminosas” já que o grande tribunal é a mídia.
Comentando a delação de Palocci, mesmo a mídia tradicional tem divulgado a receita do bolo das delações da Lava Jato, vendo no seu comportamento o padrão típico de delação exigida pela Lava Jato. O método ilegal tornou-se carne de vaca. Todos comentam, menos os tribunais superiores, com a tranquilidade de um país que aprendeu a conviver com a ilegalidade no crime e na luta contra o crime.
A delação de Delcídio do Amaral demonstrou amplamente as leviandades que são ditas sob a pressão da tortura moral. Pouco importa se mais adiante a delação de Palocci cair no vazio, por falta de provas. Matar-se-ão dois coelhos com uma só cajadada: politicamente, a Lula; penalmente, cassando os benefícios de Palocci com a delação.
Peça 4 – os mercadores da ética
As instituições estão tão desmoralizadas que os agentes dessa barafunda, juiz e procuradores da Lava Jato, se locupletam dos frutos do trabalho em palestras regiamente pagas. E, pior, para setores potencialmente sensíveis às investigações da Lava Jato – como o financeiro. Ou então, com parentes sendo remunerados por advogados investigados pela operação, como é o caso da senhora Moro, recebendo do doleiro Tacla Duran.
Nas empresas afetadas, montou-se a maior das maracutaias legalizadas da história.
Tome-se o caso da Eletrobras. Para investigar suspeitas de corrupção que não devem chegar a poucas dezenas de milhões de reais, contratam-se escritórios de advocacia sem licitação, como honorários na casa dos 200 milhões de reais.
Na Procuradoria Geral da República explode o escândalo Marcelo Miller. E, aí, o próprio Janot torna-se vítima do clima de julgamento midiático, acusado de ter negociado antecipadamente com a JBS a delação premiada. Como se todas as delações premiadas não fossem fruto de negociações prévias, nas quais o MPF diz o que quer e o que oferece e o delator aceita ou não.
Peça 5 – quem dará a freada de arrumação?
Conferiu-se ao mais sem noção dos PGRs o maior desafio da história da instituição. Sem sua liderança moral, o MPF se tornou uma legião estrangeira, com cada procurador penal praticando tiro ao alvo a esmo, mostrando uma musculatura incompatível com a sobriedade da instituição, militando em redes sociais e passeatas pró-impeachment.
E agora? No momento em que as instituições se desfazem como os castelos de areia do deserto, em que se tomam medidas e fazem negócios que comprometerão daqui para futuras gerações, quem fará a mediação?
É o pior momento da história do país. A República foi proclamada com a estrutura parlamentarista do Império dando um ponto de apoio, retrogrado, anacrônico, mas ponto de apoio. 1930 acontece com os positivistas gaúchos e os tenentes dando as linhas mestras do novo regime e um estadista maior, como Getúlio Vargas, assumindo o leme.
1964 é um golpe de Estado clássico, no qual o voto é varrido do mapa, os que assumem implementam um modelo de país, não aceiro pelas urnas mas, em todo caso, com cabeça, tronco e membros. Tinha-se um modelo.
O fium do regime militar ocorre sob os ventos da nova Constituição, permitindo um pacto político que garante a governabilidade por 25 anos.
Agora, não se tem nada. Há um assalto indiscriminado ao país do parlamento e suas leis ao mercado financeiro e suas tacadas com empresas públicas, de grandes escritórios de advocacia conseguindo contratos milionários para coibir à corrupção, a pequenos ditadores se locupletando do seu próprio trabalho.
No meio do caminho há uma pedra, as eleições de 2018.
Duas observações
A responsável maior por essa destruição do país foi a concentração da mídia nas mãos da Globo.
No único contato que tive com Rodrigo Janot, quando uma colega dele queixou-se da manipulação de entrevista que dera, ele fez um ar de malandro experimentado e me disse:
- Nós que somos experientes sabemos que não devemos dar entevista para o outro lado, não é Nassif?
O “outro lado”, obviamente, era eu.
Quando deixar a PGR, Janot será alvo de uma perseguição implacável, que certamente atropelará seus direitos. Sabe quem irá defende-lo? O “outro lado”. Afinal, canalha Janot não é. No máximo, um Asmodeu trapalhão
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