Kakay: Tribunal Popular quer esclarecer a sociedade sobre excessos da Lava Jato

ENTREVISTA
Advogado criminalista participa de júri popular sobre operação da PF e seus "muitos excessos", como abuso de prisões preventivas, espetacularização do Direito Penal e criminalização da política

por Eduardo Maretti, da RBA publicado 10/08/2017
                                                                                                               MARCELO CHELLO/CJPRESS/FOLHAPRESS
Kakay
"Quero o enfrentamento da corrupção, mas dentro do devido processo legal e respeito às garantias individuais"
São Paulo – Nesta sexta-feira (11), o Coletivo Advogadas e Advogados pela Democracia (CAAD) e a Frente Brasil de Juristas pela Democracia promovem o Tribunal Popular, para julgar a operação Lava Jato. O júri será realizado em Curitiba.
O responsável pela defesa da Lava Jato será o advogado criminalista Antônio Carlos de Almeida Castro, o Kakay. Ex-ministro da Justiça de Dilma Rousseff, Eugênio Aragão desempenha o papel da acusação. O juiz de direito em Alagoas Marcelo Tadeu Lemos preside a sessão.
Lemos é objeto de uma sindicância aberta pela Corregedoria Geral de Justiça do Estado de Alagoas por participar do evento. O procurador da República Alexandre Schneider, de Bento Gonçalves (RS), enviou ao Ministério Público Federal (MPF) do Paraná um aviso sobre o simulado, que teria o objetivo de "achincalhar" o Judiciário.
Participam do julgamento os juristas Marcello Lavenère, a professora Vera Karam de Chueiri, diretora da Faculdade de Direito da Universidade Federal do Paraná, e o jornalista Fernando Morais, entre outros.
À RBA, Kakay falou sobre o significado do júri, algo "absolutamente comum no meio jurídico". Segundo ele, embora o "simulado" tenha um significado simbólico, ele se reveste de grande importância por trazer à discussão os excessos da Lava Jato. Apesar de defender a operação que "desnudou um sistema de corrupção capilarizado", Kakay diz que ela é permeada por muitos excessos, que têm de ser "obrigatoriamente apontados para a sociedade saber".
Qual a importância desse julgamento. É simbólica?
É uma importância simbólica. É absolutamente comum no meio jurídico que a gente faça tribunais simulados, júris simulados, quando tem um assunto importante em voga. Quando teve o massacre dos trabalhadores sem terra no Pará (Eldorado do Carajás, em 1996) muito tempo atrás foi feito um júri simulado no Congresso Nacional, eu era advogado do Estado do Pará, o presidente do júri foi o José Saramago. A importância é poder trazer à discussão os excessos de uma operação que é vista de uma forma, às vezes, parcial, pela sociedade. É trazer à discussão, essa é a importância.
Não é irônico que o senhor, que é um crítico da Lava Jato, faça o papel da defesa?
Mas vou fazer uma tese interessante. Tenho duas teses muito interessantes.
Pode adiantar alguma coisa?

(Risos) Não, não, não. O sucesso da tese é saber levar isso como segredo. Eu sou um cara que elogia muito as vantagens da Lava Jato. Eu sou um crítico dos excessos.
Quais os principais excessos?
São muitos. Excesso de prisão preventiva, espetacularização do Direito Penal, a criminalização da política, a criminalização até do advogado, as delações que são feitas, no meu ponto de vista, de formas não corretas, e seguramente vamos começar a ver agora várias delações serem denunciadas pela falta de critério. Tudo isso são excessos que têm que ser enfrentados e discutidos pela sociedade.
E o tribunal tem esse papel de esclarecer a sociedade...
Tem esse papel de provocar a discussão, de chamar a atenção. Evidentemente é um júri simulado, mas com pessoas que vivenciam o dia a dia desse momento punitivo que o Brasil passa. Eu acho que é importantíssimo ter essa discussão.
O que espera da Lava Jato?
A Lava Jato é uma operação que tem uma importância fundamental, importantíssima, que desnudou um sistema de corrupção capilarizado, como ninguém nunca podia imaginar. Agora, esse enfrentamento podia ter sido feito sem os excessos. Eu quero o enfrentamento. Não permito que ninguém, nenhum procurador da República, nenhum juiz, nenhum delegado diga que quer o enfrentamento de corrupção mais do que eu. Mas eu quero dentro do devido processo legal e respeito às garantias individuais. Se você tem excessos, eles têm que ser obrigatoriamente apontados para a sociedade saber.

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