Quem recusou a proposta de delação do dono da Engevix sobre Temer? Saiba o que ele pretendia dizer sobre o usurpador
VIOMUNDO - 05 de maio de 2017 às 22h32
“Te respondo só com uma frase. Não fui eu quem desistiu. Você me perguntou por que eu desisti. Estou dizendo que não fui eu quem desistiu. Ponto”. José Antunes Filho, dona da Engevix, que passou seis meses preso em Curitiba, sobre a delação premiada que pretendia fazer, em entrevista ao Valor Econômico. |
O AMIGO DO TEMER
Em 2009, a pequena Argeplan, empresa paulistana de arquitetura e engenharia, ganhou um belo contrato. Por R$ 232 mil, iria reformar o forro da biblioteca do Tribunal de Justiça de São Paulo. A sede da empresa é uma casa de dois andares numa viela residencial da Vila Madalena, na capital, onde não há letreiro. A Argeplan é “especializada em obras públicas no Estado de São Paulo”, conforme revela seu próprio portfólio na internet.
É comandada por dois sócios: o arquiteto Carlos Alberto da Costa e o coronel da Polícia Militar João Baptista Lima Filho, ambos septuagenários.
João Baptista, que todos conhecem somente como Lima, obteve diploma de arquiteto depois de se aposentar da corporação.
Três anos depois, enquanto acabava a reforma na biblioteca do Tribunal de São Paulo, a Argeplan obteve um contrato melhor.
Em maio de 2012, venceu, por R$ 162 milhões, uma licitação internacional da estatal Eletronuclear, para serviços altamente especializados de eletromecânica na usina nuclear de Angra 3.
A empresa do coronel Lima não obteve sozinha o contrato.
Entrou num consórcio com a finlandesa AF, que criou uma filial no Brasil para participar da licitação. Segundo documentos obtidos por ÉPOCA, Lima também é sócio dessa empresa.
Como a empresinha do coronel Lima conseguiu tamanho contrato? Em sua proposta de delação, Antunes afirma que a Argeplan é uma empresa ligada ao vice-presidente Michel Temer. Segundo Antunes, o coronel Lima “é a pessoa de total confiança de Michel Temer”.
Aos 74 anos, Lima é do círculo próximo de Temer desde os tempos em que o vice assumiu cargos de alto escalão no governo de Franco Montoro, em São Paulo. Lima também é próximo do almirante Othon Pinheiro, presidente da Eletronuclear nos governos Lula e Dilma, que foi preso na Lava Jato, acusado de corrupção nos contratos de Angra 3.
Segundo dois chefes do PMDB e um lobista do partido, o almirante foi indicado por Temer e pelos senadores do PMDB — Temer nega ter feito a indicação.
Consta da proposta de delação de Antunes que “Lima foi diretamente responsável pela indicação de Othon junto a Michel Temer, e por sua manutenção no cargo de presidente da Eletronuclear”.
O delator disse ainda ter ouvido de Lima que a manutenção de Othon na presidência da empresa estava diretamente associada a “resultados”.
Antunes disse que foi procurado pelo coronel Lima para entrar no contrato de Angra 3. A empresa de Lima, afinal, não tinha quaisquer condições de executar os serviços.
Antunes topou e foi subcontratado pelo consórcio AF/Argeplan, criado, segundo ele e documentos comerciais, por Lima e pessoas ligadas ao almirante Othon.
Antunes afirma que “entre as condições para que Othon fosse mantido no cargo, estava a de ajudar Lima nesse contrato e em outros futuros, de modo que a Argeplan/AF e mesmo a Engevix se posicionassem bem nos futuros projetos nucleares”.
Fontes da Engevix ouvidas por ÉPOCA garantem, contudo, que, apesar de integrar o consórcio, a AF Consult do Brasil não realizou nenhuma obra em Angra 3, e que sua participação no contrato jamais foi explicada pela direção da empresa.
Antunes afirmou ainda, em sua proposta de delação, que esteve por duas vezes no escritório de Michel Temer em São Paulo, acompanhado de Lima, “tratando de assuntos, incluindo a Eletronuclear”.
Diz que foi cobrado por Lima, que dizia agir em nome de Temer, a fazer um pagamento de R$ 1 milhão. Esse dinheiro, segundo Antunes, iria para a campanha do peemedebista em 2014. Antunes disse aos procuradores que fez o pagamento por fora, por intermédio de uma fornecedora da Engevix.
Segundo Antunes, a Lava Jato amedrontou Lima. Antunes diz que Lima o procurou no ano passado, para propor a devolução do dinheiro. Antunes diz que não topou.
Não é a primeira vez que Lima surge na Lava Jato. O nome do coronel é citado em uma troca de e-mails de Antunes sobre o contrato Eletromecânico 1 de Angra 3, justamente o que foi firmado pela Engevix, com participação da Argeplan. Lima e sua empresa também aparecem em interceptações telefônicas do almirante Othon Pinheiro.
Em 7 de julho de 2015, Lima perguntou se Othon teria previsão de ir a São Paulo para um encontro. Num diálogo que denotava subordinação de Othon a Lima, o almirante dizia que não tinha previsão, porém poderia rapidamente organizar a viagem para segunda-feira, menos de uma semana depois da ligação.
“Segunda-feira, se o senhor vier aqui, a gente precisava ter uma conversa. Tem de tomar uma providência aí que… eu acho que tá chegando no ponto que vai culminar naquele tema”, diz Lima na gravação.
Procurado, Temer disse conhecer Lima há mais de 30 anos. Também afirmou que recebeu Antunes e Lima em seu escritório em São Paulo, mas que o encontro foi para falar sobre o Porto de Rio Grande, obra tocada pela Engevix. Temer não revelou em maiores detalhes o teor da conversa. Disse apenas que os pleitos do empreiteiro não foram atendidos.
Afirmou que não ajudou a indicar o almirante Othon para o cargo, que não tinha qualquer influência na Eletronuclear e que não autorizou ninguém a buscar recursos ilícitos em nome dele.
O almirante Othon disse que só se pronunciaria em juízo. A Eletrobras, que tem se pronunciado sobre questões envolvendo a Eletronuclear, não retornou o pedido de informação até o fechamento da reportagem.
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O empresário José Antunes Sobrinho, um dos donos da construtora Engevix, é mantido em prisão domiciliar a poucos metros da força-tarefa em Curitiba.
Vem de Antunes a acusação, em uma proposta de delação premiada, de que o presidente interino Michel Temer foi o beneficiário de R$ 1 milhão de propina, paga pela Engevix, como recompensa por um contrato de R$ 162 milhões da empreiteira com a Eletronuclear.
ÉPOCA revelou o caso no fim de abril. Temer negou as acusações na ocasião. Na proposta de delação, Antunes conta que o ex-coronel da Polícia Militar João Baptista Lima Filho, sócio da empresa de arquitetura Argeplan e “pessoa de total confiança de Michel Temer”, ganhou o principal contrato de construção da usina Angra 3 com a Eletronuclear, no valor de R$ 162 milhões, e se comprometeu a subcontratar a Engevix para realizar a obra.
Em troca, a empreiteira pagaria R$ 1 milhão para “suprir interesses de Michel Temer”, de acordo com Antunes.
A proposta de delação premiada revela detalhes sobre o caso.
Lá, Antunes diz que pediu para que uma prestadora de serviços da Engevix fizesse o pagamento para Lima, para disfarçar. Segundo a proposta de delação, o repasse foi feito pela empresa Alúmi Publicidades, que prestava serviços de mídia para o aeroporto de Brasília, controlado pela Engevix.
Segundo ÉPOCA apurou, houve realmente um pagamento da Alúmi para a PDA Projeto, outra empresa de Lima. A PDA recebeu R$ 1,1 milhão em outubro de 2014, pagos pela Alúmi, na reta final da eleição daquele ano.
Procurada por ÉPOCA, a Alúmi confirma o repasse de dinheiro à PDA. Lima confirma o recebimento da quantia. Os dois afirmam, no entanto, que se trata apenas de serviços prestados pelo amigo de Temer, não de propina.
Com as revelações do executivo, o dinheiro pode ser rastreado pelos investigadores para que seja verificado se Temer foi de fato beneficiado, como afirma Antunes – o que, novamente, o presidente interino nega com veemência.
Pouco tempo depois do pagamento da propina, Lima fez viagens ao Panamá e ao Uruguai, dois conhecidos paraísos fiscais usados por operadores da Lava Jato para esconder dinheiro.
A interlocutores, Temer já disse que Lima cuidou de suas campanhas eleitorais. De acordo com a proposta de delação de Antunes, Lima ganhou a licitação para a obra em Angra 3, em maio de 2012, por ter forte influência sobre Othon Pinheiro, presidente da Eletronuclear nos governos Lula e Dilma.
Temer e Lima eram responsáveis pela manutenção de Othon no cargo, diz Antunes em sua proposta de delação. Segundo essa versão, em troca do apoio, Othon deveria ajudar Lima nesse e em outros contratos. Mas a Argeplan, uma empresa que reformava telhados e cuidava de pequenos projetos arquitetônicos, não tinha experiência alguma com energia nuclear. Foi aí que entrou a Engevix, com sua expertise.
A ingerência de Lima e Temer na Eletronuclear não era algo abstrato, diz Antunes em sua proposta de delação. Para tratar de assuntos da estatal, Antunes chegou a se encontrar com Lima e Temer no escritório do presidente interino no Itaim Bibi, na Zona Sul de São Paulo. Houve pelo menos dois encontros, de acordo com a proposta de delação.
Antunes disse que foi procurado pelo coronel Lima para entrar no contrato de Angra 3. Lima havia montado uma parceria com a finlandesa AF Consult, que resultou no consórcio AF Brasil, e subcontratou a Engevix por cerca de 70% do valor do contrato com a Eletronuclear. Segundo Antunes e documentos comerciais, o consórcio foi criado por Lima e pessoas ligadas ao almirante Othon.
Advogados de Antunes tentam, desde novembro do ano passado, fechar um acordo de delação premiada com a Procuradoria-Geral da República. Mas a proposta foi recusada formalmente pelo colegiado de três procuradores que representava o procurador-geral, Rodrigo Janot.
Janot era representado nas negociações com Antunes pelo promotor Sérgio Bruno, do grupo de trabalho de Brasília, pelo procurador Athayde Ribeiro, da força-tarefa de Curitiba, e pelo procurador Lauro Coelho Júnior, da força-tarefa do Rio de Janeiro.
O Ministério Público não informa oficialmente o motivo da recusa às revelações de Antunes, que só podem ser usadas como ponto de partida em investigações criminais caso seja assinado um acordo.
Nada impede, no entanto, que a investigação prossiga a partir de outros atos iniciais — como informações fornecidas por outros delatores ou outras representações enviadas ao Ministério Público.
Reservadamente, porém, negociadores comentam que Antunes parecia fazer “contenção de danos”. Ou seja, avaliam que ele não contou tudo o que sabia e vivenciou.
Só uma coisa irrita mais os negociadores do que um delator que se faz de coitado: um delator que mente. Foi o caso do lobista Fernando Moura, cujo acordo de delação foi anulado porque ele mentiu à Justiça. Este não parece ser o caso de Antunes.
Os investigadores formaram a convicção de que ele omitiu informações. Recusas são normais e os negociadores não aliviam as exigências para os criminosos. Por isso, os advogados de Antunes mudaram de estratégia. Passaram a divulgar que o empresário desistiu do acordo de delação depois de a proposta ter sido recusada pelo procurador-geral da República.
Na realidade, Antunes continua desesperado por um acordo. Tão desesperado que sua filha, Marianne, abordou um dos procuradores em um restaurante de Curitiba e implorou para que ele aceitasse a proposta do pai.
Fazendas, imóveis no Estado de São Paulo e 50% de participação na construtora Argeplan, especializada em prestar serviços para o setor público.
Ultrapassa R$ 15 milhões o resumo patrimonial do coronel aposentado da Polícia Militar João Baptista Lima Filho, amigo há mais de 30 anos do vice-presidente Michel Temer.
A fazenda da Lima foi invadida pelo Movimento dos Trabalhadores Sem-Terra (MST) na segunda-feira (9), que justificou a invasão alegando se tratar de propriedade do vice-presidente.
A fazenda Esmeralda, cuja área de 484 hectares (o equivalente a três parques do Ibirapuera) ocupa quatro municípios no interior de São Paulo, é avaliada em pelo menos R$ 10 milhões por negociadores de terras da região de Duartina, onde está localizada.
A fazenda está em nome da Argeplan, da qual Lima é sócio. Um proprietário de terras de Duartina ouvido pela reportagem de ÉPOCA afirma que a fazenda abrigou durante mais de 10 anos a criação de gado nelore, mas que, nos últimos anos, havia mudado a produção da propriedade para a plantação de eucalipto, tendo como principal cliente a Fibria.
Tanto Lima quanto a Argeplan foram citados pelo empreiteiro José Antunes Sobrinho, sócio da Engevix, como intermediários na arrecadação de recursos ilícitos em um dos contratos da Eletronuclear, investigado no âmbito da Operação Lava Jato.
Em sua proposta de delação premiada revelada com exclusividade por ÉPOCA, Antunes aponta Lima como “pessoa de total confiança de Michel Temer”.
Antunes detalhou os meandros de um contrato fechado entre a Engevix e a Eletronuclear, e que tem a Argeplan como integrante. Segundo Antunes, Lima também seria próximo do almirante Othon Pinheiro, presidente da Eletronuclear nos governos Lula e Dilma, que foi preso na Lava Jato, acusado de corrupção nos contratos de Angra 3.
Segundo dois chefes do PMDB e um lobista do partido, o almirante foi indicado por Temer e pelos senadores do PMDB — Temer nega ter feito a indicação.
Consta da proposta de delação de Antunes que “Lima foi diretamente responsável pela indicação de Othon junto a Michel Temer, e por sua manutenção no cargo de presidente da Eletronuclear”.
Além da fazenda Esmeralda, a Argeplan possui mais 274 hectares na região de Duartina. Já Lima, como pessoa física, é dono ainda da Fazenda Bela Esperança, de 542 hectares, e de mais 115 hectares em propriedades menores no entorno.
Com o preço do hectare em Duartina em torno de R$ 20 mil (ou R$ 50 mil o alqueire), o patrimônio de Lima na região ultrapassa R$ 13 milhões, a considerar apenas as terras, sem levar em conta as benfeitorias feitas ao longo dos anos.
Em São Paulo, o coronel é dono de dois imóveis avaliados em R$ 2 milhões: um apartamento duplex no bairro do Morumbi e uma sala comercial na avenida Francisco Morato, na zona Sul da capital.
O crescimento patrimonial do ex-PM teve início na década de 2000, com a aquisição das primeiras glebas de terra em Duartina. Em 2005, comprou a fazenda Bela Esperança, vizinha da Esmeralda. Lima aparece como sócio da Argeplan apenas em 2011, segundo dados da Junta Comercial de São Paulo, apesar de já atuar como representante da empresa desde, pelo menos, a década de 2000.
Segundo a Junta, o ex-PM adquiriu metade da construtora por apenas R$ 250 mil.
O valor é incompatível com o vulto dos contratos firmados pela construtora à época. Em 2011, a Argeplan se consorciou à Engevix por meio de uma empresa finlandesa, a AF Consult, para a execução de um contrato de R$ 164 milhões. Aposentado pela corporação, Lima, aos 74 anos, recebe R$ 23 mil mensais do Estado de São Paulo.
Lima é do círculo próximo do vice-presidente Michel Temer desde os tempos em que ele assumiu cargos de alto escalão no governo de Franco Montoro, em São Paulo.
Um exemplo da confiança que o vice já depositou no coronel remonta a 1984, quando um acusado por tráfico de drogas no Rio de Janeiro envolveu a Secretaria de Segurança Pública de São Paulo em suas denúncias.Temer, que era secretário, e teve a imagem abalada, mandou um de seus homens de confiança, o então Major João Baptista Lima Filho, à capital fluminense para averiguar o caso.
Quando Temer foi candidato a deputado federal, em 1994, tanto Lima quanto a Argeplan e seu outro sócio, Carlos Alberto Costa, fizeram doações para a campanha do vice.
A Argeplan doou R$ 150 mil (ou R$ 993 mil em valores corrigidos), o equivalente a 40% do total arrecadado por Temer com empresas naquele ano, o que fez da construtora a maior doadora do vice em 1994, segundo dados do Tribunal Regional Eleitoral de São Paulo.
Já Lima e Costa doaram três linhas telefônicas à campanha do peemedebista. Depois de 1994, tanto a Argeplan quanto seus sócios sumiram das listas de doadores do vice-presidente.
O vice-presidente reconhece a amizade de longa data com Lima, mas nega que tenha confiado a ele qualquer tipo de intermediação em seu nome. Temer também nega qualquer relação com a Argeplan.
O vice afirmou, por meio de sua assessoria, que as doações de campanha feitas pela Argeplan em 1994 foram devidamente declaradas ao TRE, assim como as doações feitas por demais empresas.
A Argeplan afirmou, em nota, que a propriedade rural invadida pelo MST foi “adquirida de maneira regular, a partir de 1986”. E que “todas as áreas de propriedade da Argeplan e do Sr. João Baptista Lima Filho são absolutamente regulares”. A empresa não deu declarações sobre a relação com Temer.
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