Por que o muro de Trump não deve sair do papel

Postado em 28 Jan 2017
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Publicado na DW.

Não se sabe se Donald Trump alguma vez ouviu The Wall, famso álbum do Pink Floyd. O que se sabe é que a promessa de construir o que ele repetidamente descreveu como “um grande e belo muro” ao longo da fronteira com o México se tornou o grito de mobilização inicial para seus seguidores, ajudou a catapultá-lo ao topo do campo republicano nas primárias e, finalmente, a chegar à Casa Branca.
Por isso, não é uma surpresa que Trump tenha assinado na quarta-feira (17/01) um decreto sobre uma de suas principais e mais controversas promessas de campanha. No ato, ele disse que o país estão no meio de uma crise na fronteira, que prejudica tanto México quanto EUA.
“Como presidente, não tenho dever maior que proteger a vida do povo americano”, afirmou Trump.

Mas, apesar do decreto assinado por Trump na quarta-feira, é improvável que um muro físico contínuo seja erguido ao longo da fronteira mexicana num futuro próximo – ou, como afirmam especialistas em segurança, é provável que ele sequer saia do papel.
“A ordem executiva é em grande parte simbólica”, diz Steve Yale-Loehr, especialista em lei de imigração na Universidade de Cornell, coautor do principal tratado jurídico de 21 volumes sobre a questão. “Especialistas estimam que, se ele realmente quiser construir um muro ao longo de toda a fronteira de 2 mil milhas [3.200 quilômetros], isso custaria entre 15 e 25 bilhões de dólares. É muito dinheiro, e há pouca coisa que ele pode fazer sozinho, sem pedir ao Congresso esse dinheiro.”
“É um movimento simbólico”, concorda Jennifer Gordon, especialista em direito imigratório da Fordham University. “Ele não tem o poder de apropriação para dar dinheiro a isso, ele precisa do Congresso para isso.”
Trump pode determinar que o Departamento de Segurança Interna aloque fundos existentes para a finalidade de construir um muro, mas tais fundos, segundo os estudiosos, estarão longe do que é necessário para completar um projeto tão grande.
“Abordagem em camadas”
Isso significa que o Congresso, atualmente controlado pelos republicanos, teria que autorizar os bilhões necessários para financiar o plano de Trump.
“E é aí que o projeto provavelmente terá problemas”, observa Yale-Loehr. “Embora os republicanos geralmente apoiem o aumento das medidas de segurança nas fronteiras, eles estarão relutantes em apoiar uma barreira contínua com um preço tão alto e benefícios de segurança questionáveis. O México já disse que não vai pagar pelo projeto”, afirma o especialista.
“Acho que o Congresso daria mais dinheiro para a construção contínua de uma cerca, mas eu duvido que eles sejam capazes de financiar todo o muro ou fazê-lo da maneira que Trump propôs na campanha”, diz Yale-Loehr, observando que mesmo o novo chefe do DHS, John Kelly, em sua audiência de confirmação no Senado, falou de uma “abordagem em camadas”.
Isso significa uma série de medidas, incluindo drones, mais guardas de fronteira, negociações com outros países, assim como aumento de cercas, mas não necessariamente um muro. “Acho que veremos mais essa abordagem do que realmente financiar a construção de uma estrutura física”, ressalta Yale-Loehr.
Jeniffer Gordon, da Fordham University, lembra que a posição do novo chefe do DHS de uma abordagem em camadas é compartilhada por muitos especialistas “que são sofisticados e acreditam em mais segurança nas fronteiras”.
“Uma parede é uma espécie de solução do homem das cavernas”, acrescenta. “É um grande projeto simbólico, mas é muito dinheiro para gastar em um símbolo.”
Uma medida mais eficaz seria detectar melhor pessoas que estão com vistos vencidos, um grupo que compõe metade de todos os estrangeiros que residem ilegalmente nos EUA, segundo Yale-Loehr.
Questionada se acredita que um muro contínuo e físico ao longo da fronteira entre EUA e México se tornará realidade sob o governo Trump, Gordon é categórica. “Não, eu não”.
“Não acho que vou ver um grande e belo muro”, concorda Steve Yale-Loehr. “Poderemos ter uma ou duas milhas de uma grande e bonita muralha para fotos, mas ela não vai abranger todas as 2 mil milhas.”

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Sobre o Autor
Diretor-adjunto do Diário do Centro do Mundo. Jornalista e músico. Foi fundador e diretor de redação da Revista Alfa; editor da Veja São Paulo; diretor de redação da Viagem e Turismo e do Guia Quatro Rodas.

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