O desespero mudo da infeliz Geração Y (Millenials)

06/10/2016, Naked Capitalism (by Yves Smith)


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"O mito de que muita gente poderia jogar-se no mundo para 'empreender' e iniciar negócio próprio que asseguraria a todos vida decente não passa de desculpa esfarrapada, mas conveniente, para o fracasso de quem teria de criar empregos em número suficiente.

(...) por mais que o ser humano seja capaz de resistir ao infortúnio, é claro que todos temos de nos perguntar até quando os infelizes jovens da Geração Y (Millenials) se deixarão enganar e se manterão conformados com a estagnação econômica em que realmente vivem, enquanto as camadas de 1% a 10% de mais alta renda só fazem acumular cada vez mais renda e riqueza à custa deles (à custa de todos nós)."


Embora Lambert e eu não gostemos de usar segmentos geracionais criados por marketeiros, como "geração Y" e "geração X", porque grupos etários não coincidem com grupos de ação política e o espectro das experiências é muito mais amplo dentro de cada grupo etário, que entre grupos contíguos, achamos interessantes os resultados de uma pesquisa com 1.200 adultos jovens realizada por Ernst & Young e Economic Innovation Group, que mostram situação econômica impressionantemente precária. 

Admite-se que não se trata de assunto relacionado a jovens adultos que se veja discutido entre gente 'educada', que vive de convencer outros igualmente 'educados' sobre o quanto eles todos se deram bem na vida. Recordo de dois profissionais bem-sucedidos, com cerca de 40 anos, contando como viveram da mão para a boca, comendo macarrão instantâneo, nos primeiros anos depois da faculdade, com medo de que algum evento emergencial os lançasse na miséria (e que tampouco tinham pai&mãe na retaguarda para resgatá-los: um deles tinha origem em família extremamente pobre, e escapou da miséria, em parte, porque alguém o aconselhou a tomar aulas de dicção, para erradicar da própria fala os marcadores de classe; o outro se afastou da família, quando saiu de casa). Mas para a maioria dos adultos jovens com formação acadêmica no período pós 2ª Guerra Mundial, antes da crise, os anos magros dos respectivos 20 anos eram vividos como período de transição, não o status permanente.

Bem diferente disso, o estudo que se vê hoje mostra que o único status de vida permanente para a maioria dos ditos jovens, Millenials, ou da "Geração Y", é o mais mudo desespero. 

Embora o choque da crise financeira tenha causado enorme dano a muita gente em todos os grupos etários, como o atestam todos, de todas as faixas etárias, que foram despejados da própria casa por bancos credores, a "Geração Y" enfrentou um mercado de trabalho que deixou sem emprego recém-formados que em condições normais podiam considerar-se "altamente empregáveis", ou, no mínimo, os pôs abaixo do potencial de cada um, em empregos de garçons e baristas ou outras funções de baixo salário. Isso teve impacto imenso nos ganhos possíveis para o resto da vida, não só porque deprimiu a renda nos anos iniciais, mas porque, mesmo quando esses jovens adultos encontram trabalho menos mal remunerado, o começo difícil os condena a faixas de mais baixa renda do que os que encontraram empregos bem-remunerados desde o momento em que deixaram a escola.

Todos devem ler na íntegra os resultados dessa pesquisa, em relatório curto, mas importante (ing.), porque o quadro é realmente sombrio. Destaquei alguns dados que reproduzo adiante (negritos no original).

Alcançar a maioridade em período de histórica depressão econômica teve impacto severo na vida da Geração Y (Millenials)

  • 30% dos(as) respondentes moram com os pais (40%, no caso de solteiros(as).
Quase 1/3 dos(as) respondentes acreditam que a respectiva comunidade local continua em recessão.
Altos níveis de estresse entre os jovens adultos
  • 78% da Geração Y (Millenials) preocupam-se com o risco de não encontrarem oportunidades de emprego bem pago.
  • 74% preocupam-se com não conseguirem pagar as próprias contas de médico e hospitalização, caso adoeçam.
  • 79% preocupam-se com não terem dinheiro suficiente para sobreviver, quando se aposentarem.
  • Só 6% dos jovens da Geração Y (Millennials) sentem que ganham mais dinheiro do que precisam para cobrir as necessidades básicas. Para mulheres da Geração Y (Millennials), essa porcentagem cai para apenas 3%.
  • 63% teriam dificuldades para cobrir despesas inesperadas de $500.
44% usariam prêmio de loteria de $5.000 para pagar contas e dívidas, o que indica luta inglória para encontrar remuneração satisfatória, para conseguir poupar e conseguir investir (ver Gráfico "Como melhor descrever sua situação financeira").

Uma das coisas que me pareceram tristes, é o quanto esses jovens da Geração Y (Millennials) deixaram-se enganar pela mistificação gerada em torno do 'empreendedorismo'.

 
Dados históricos sempre mostraram que a maioria dos 'empreendedores' foram demitidos duas vezes, de empregos 'com carteira assinada', antes de serem obrigados a 'empreender'.
 
A mistificação em torno da ideia do 'empreendedorismo' fez inflar a ideia mentirosa de que aí haveria opção razoável de emprego para muita gente. Conheço número sem conta de pessoas que, da vida, só conheceram emprego assalariado, dedicados a 'aconselhar' jovens que tenham sido demitidos a sair e criar o próprio emprego.
 
Pessoalmente, como mulher que criou e mantém o próprio negócio há 27 anos, posso dizer a todos que qualquer um que tenha currículo apresentável e estômago para a política interna das empresas, deve é questionar profundamente a ideia de sair e montar negócio próprio. A independência custa muito, muito caro.
 
Ter quem cuide da maior parte do serviço sujo e pesado de gerir uma empresa capitalista privada, além de a empresa empregadora servir como anteparo de proteção para grande parte da violência do mundo exterior (como ter de drenar a poupança para a velhice e consumi-la para manter vivo o 'negócio próprio', como vi tanta gente fazer), vale muito, muito dinheiro. Como disse um colega: "A diferença entre ser desempregado e ser autoempregado é, de fato, extremamente tênue."
 
O mito de que muita gente poderia jogar-se no mundo para 'empreender' e iniciar negócio próprio que asseguraria a todos vida decente não passa de desculpa esfarrapada, mas conveniente, para o fracasso de quem teria de saber criar empregos em número suficiente.
 
São raras as pessoas que têm o temperamento e o raro 'mix' de talentos e experiência [e nas quais também se verifique a ausência de outros traços de caráter (NTs)], para conseguir viver do próprio empreendimento. 90% de todos os novos empreendimentos fracassam no prazo de três anos. E também é extremamente difícil fazer funcionar as sociedades e parcerias comerciais.
 
Mesmo assim, a Geração Y (Millennials) romantiza os empreendedores [e, no Brasil-2016, especialmente em SP, romantiza também os autodefinidos "gestores não políticos", só que MUITO políticos (NTs)], apesar de os dados comprovarem consistentemente que a maioria dos que tentam fracassam:
 
Poucos jovens da Geração Y (Millennials) estão realmente iniciando negócios próprios, mas a geração tem em alta conta os 'empreendedores' (empresários) [os quais, de fato, são patrões, mais que gestores (NTs)]  
 
  • 78% da Geração Y (Millenials) considera empresários "gente bem-sucedida" [Hoje, no Brasil, parece que "Executivos", da categoria "Altos Executivos", os quais, todos, são empregados e absolutamente jamais, na vida, empreenderam ou sonharam com empreender porcaria niúma, são mais prestigiados que "empresários" e "empreendedores" (NTs)].
  • 62% da Geração (Millenials) consideraram iniciar negócio próprio.
55% acreditam que a própria geração é mais empreendedora que gerações passadas – mesmo que todos os dados conhecidos desmintam essa fantasia.
O maior obstáculo que impede a Geração Y (Millenials) de iniciar o próprio negócio é o dinheiro

42% da Geração Y (Millenials) lamenta não ter os meios financeiros para iniciar um negócio
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No quadro demográfico, homens brancos são os menos preocupados com finanças (só 40% citam "finanças" como principal obstáculo para iniciar um negócio, comparados a 53% das mulheres negras e 59% das hispânicas.

Por mais que possa parecer racional para os Millennials, confrontados a um mercado de trabalho horrendo e curtos períodos como empregados, tentarem eles mesmos se puxarem para cima pelos próprios cabelos, a Geração Y é, precisamente, o grupo com menores chances de sucesso como dono do próprio negócio.

A característica mais frequente de empreendedores bem-sucedidos – como mostra extensa pesquisa realizada pelo Professor Amar Bhide e exposta em seu livro clássico The Origin and Evolution of New Businesses, é que a experiência prévia como empregado permitiu-lhes identificar um nicho ainda não totalmente ocupado, e só então começar um negócio, para ocupá-lo. 

Jovens com pouca ou nenhuma experiência de negócios e empresa dificilmente têm meios para conhecer o 'campo' – muito menos enquanto são mantidos por dinheiro alheio – para aprender como funciona alguma determinada indústria e identificar oportunidades. Tampouco têm muitas ocasiões para aprender outras competências, como negociadores, para classificar fornecedores, para saber vetar e contratar provedores de serviços profissionais e administrar subordinados.

Mesmo assim, apesar das incontáveis incompetências e fracassos de muitos jovens Millennials como empreendedores, muitos ainda mantêm esperanças quanto ao longo prazo. 

Mas, por mais que o ser humano seja capaz de resistir ao infortúnio, é claro que todos temos de nos perguntar até quando os jovens da Geração Y (Millenials) se deixarão enganar e se manterão conformados com a estagnação econômica em que realmente vivem, enquanto as camadas de 1% a 10% de mais alta renda só fazem acumular cada vez mais renda e riqueza, à custa dos jovens que eles mandam 'empreender', apesar da altíssima probabilidade de fracasso nesses 'empreendimentos' para os quais Millenials estão sendo empurrados. À custa, de fato, de todos nós.*****


* No original "Millenials" (também conhecidos como "Geração Y"): é o segmento demográfico que sucede a Geração X. Não há datas precisas, mas os pesquisadores de marketing costumam definir a faixa correspondente aos 'jovens do milênio' entre os nascidos a partir do final dos anos 70-início dos 80s, até meados dos anos 1990s-início dos anos 2000s [NTs, com informes de Wikepedia].

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