Síria: um chamado à sensatez

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Por Pedro García HernándezDamasco, 19 set (Prensa Latina) 

O que ocorre na Síria exige sensatez, sobretudo quando se dissipam as dúvidas a respeito dos objetivos dos Estados Unidos e seus aliados ocidentais na região do Oriente Médio.

Para todos os analistas e especialistas, sejam do grupo que for, o ataque da Coalizão Internacional liderada por Washington contra posições do Exército sírio na cidade de Deir Ezzor é uma provocação de consequências imprevisíveis.

Desde 1956, quando Gamal Abdel Nasser nacionalizou o Canal de Suez e França e o Reino Unido atacaram o Egito, não se produzia uma escalada bélica da magnitude que se vive atualmente na Síria.

O mundo árabe, cada vez mais desvanecido, golpeado pelos contínuos confrontos com os regimes sionistas de Israel, está agora dividido entre os que aspiram pelo petrodólar para viver a sua maneira e os que defendem a soberania, advogam pela união e tolerância e tentam manter a sensatez adequada.

Não existem antecedentes da presença militar contra esta nação do Levante, dirigido de uma maneira ou outra à pressão geográfica contra a Rússia e o Irã, não por acaso aliados e defensores da Síria.

Na era de uma evolução constante, de incrível rapidez nos avanços tecnológicos, Estados Unidos e a coalizão internacional têm no Mar Mediterrâneo, ao redor de Chipre e junto às águas do Líbano, 13 navios de guerra, incluídos um porta-aviões e um número indefinido de submarinos.

França e Reino Unido estão presentes e assumem o papel de nostálgicas potências coloniais sob o comando de Washington, que sustenta bases estratégicas e centros de monitoramento via satélite e inteligência na Turquia, Kuwait, Arábia Saudita, Bahrein, Qatar, Emirados Árabes Unidos e Jordânia.

Ninguém, em sã consciência, pode supor que com esse nível tecnológico e o armamento empregado na costa dos contribuintes de seus próprios países, passe desapercebido qualquer tipo de operação militar.

Daí que o ataque coligado contra posições do Exército sírio em Deir Ezzor, ponto geográfico próximo à fronteira do Iraque e da província síria de Hasaka, possa ser admitido como um erro de cálculo ou uma carência de informações adequadas sobre o terreno.

As peças sobre o dramático tabuleiro de xadrez que a Síria representa foram movidas com agilidade, subterfúgios, más intenções e o claro objetivo de dividir esta nação, berço de milenares civilizações.

Cada petrodólar desempenhou seu papel no financiamento das redes anti-Damasco da Al Jazeera e Al Jarabiya, os cortes nas transmissões televisivas sírias a partir dos satélites e o bloqueio comercial imposto há cinco anos pela Europa Ocidental.

As finanças, os compromissos mal focados e as divisões internas propiciaram a irrupção turca em território sírio, o insano impulsionamento das chamadas Forças Democráticas Sírias (FDS) e uma revitalização dos esforços de uma boa parte das Autodefesas Curdas, as quais levantaram em Tal Abiab, província de Hasaka, a bandeira das 50 estrelas em suas próprias instalações.

Também não é sensato supor, e sem apelar a teorias conspirativas, que após prepará-los durante longo tempo, financiá-los com abundância e sustentá-los logisticamente, Estados Unidos se prestaria a combater os grupos terroristas.

Por si próprias, as mais de 50 organizações jihadistas extremistas, sob o comando indireto ou direto, em muitos casos, do Estado Islâmico (Daesh) e da Frente para a Conquista do Levante, antes Al Nusra, não levavam-nas a ganhar no terreno de combate e muito menos no diplomático.

As análises a esse respeito devem levar em consideração também que os serviços de inteligência ocidentais estão metidos até o fundo no terreno para minar, aniquilar, dividir, confundir e atentar contra tudo o que cheire à soberania e independência na Síria.

Por outro lado, o regime sionista de Tel Aviv parece cumprir com os movimentos das peças quando nega o respaldo aos ex-Al Nusra e ataca a Síria, ainda que em segredo de vozes lhes forneça todo o necessário.

Frente à comedida e realista ação da Rússia e da Síria, em prol de uma paz equilibrada que evite a continuação de um banho de sangue maior, os contrários apelam a mover os peões como se fossem bispos ou peças de mais calibre.

Estados Unidos, com o respaldo verbal e nunca prático da França e Reino Unido, aceitou as contínuas propostas de trégua de Moscou e Damasco e depois, sem aparente tom nem som, acrescentou condições unilaterais, prolongou a aplicação de pontos táticos operacionais e agora contribui com absoluta desfaçatez a fragilizar ainda mais a recente trégua pactuada.

Para Catherine Shakdam, diretora do Centro de Estudos do Oriente Médio em Beirut, 'Síria converteu-se em um poço cego político de tratos encobertos e agendas ocultas', e prognostica que com o Estado Islâmico derrotado 'as negociações de paz tomarão um tom muito diferente.' 

E conclui: 'Para isso, finalmente o mundo pode se ver obrigado a prestar atenção ao que os sírios desejam. Recorda-os? Alguém se incomoda de lhes perguntar como visualizam seu futuro? Que tal se começarmos com essa pergunta e regressarmos à sensatez?' 

lam/pgh/mm

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