El País: Michel Temer leva a divisão política do Brasil ao palco olímpico
Certo de que Dilma será afastada neste mês, Michel Temer se prepara para deixar de lado esse incômodo acréscimo ao seu nome
Michel Temer/CADU GOMES EFE |
POR ANTONIO JIMÉNEZ BARCA - NO EL PAÍS - São Paulo 5 AGO 2016 -
Só tem de dizer uma frase breve e burocrática: "Declaro inaugurados os Jogos do Rio da 28ª Olimpíada da era moderna". Mas há muitas possibilidades de que o presidente interino, Michel Temer, sofra uma tremenda vaia na sexta-feira no estádio do Maracanã, na cerimônia de abertura dos Jogos. Tantas que a imprensa brasileira garante que o Governo prepara alguma solução técnicapara que a vaia retransmitida ao mundo inteiro não seja muito ouvida, expondo ao ridículo planetário o mandatário brasileiro.
Temer não é popular. Nunca foi. Seus opositores afirmam que nunca será. Seu Governo, segundo as últimas pesquisas, obtém miseráveis 14% de aprovação, quase o mesmo que o da injuriada Dilma Rousseff quando foi afastada do poder, em meados de maio. Contudo, há quem considere que o atual líder do Partido do Movimento Democrático Brasileiro (PMDB), antigo aliado do PT de Rousseff e agora seu inimigo irreconciliável, tem possibilidades de se tornar o candidato ideal para as eleições de 2018. É o que garante o deputado Rodrigo Maia- entre outras personalidades do partido. Talvez consciente de suas possibilidades reais ou talvez num movimento tático muito próprio dele, especialista em posicionar-se no lugar ideal no momento decisivo, o atual chefe de Estado interino do Brasil se apressou em dizer que não pensa em se apresentar a eleição alguma. Ou seja: Temer só será presidente se o processo de impeachment de Rousseff se completar no final de agosto, o que parece muito provável, e apenas durante pouco mais de dois anos.
O beneplácito dos mercados, que deram as costas a Rousseff há mais de um ano, e certo aroma um tanto indefinido de que a economia, na realidade, se recupera -ou pode enfim se recuperar- o avalizam. Um dado incontestável é que o dólar caiu. No final do ano valia quase quatro reais. Agora, o câmbio flutua em torno de 3,20. O desemprego, pelo contrário, continua subindo e já superou os 11%, uma cifra inimaginável há apenas dois anos.
Temer tem pendentes duas grandes reformas impopulares que, segundo diz, vai levar adiante quando se tornar presidente com todas as letras: a da previdência e a trabalhista. Seu ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, brinca de esconde-esconde um dia sim e o outro também com a alta de impostos. Ao assumir o cargo vaticinou uma enxurrada de medidas de ajuste direcionadas a enxugar a dívida. Mas Temer -como Rousseff- também deve contar com um Congresso atomizado pouco propenso a votar cortes. E Temer -como Rousseff- depende do Congresso e da votação final do impeachment para continuar como chefe de Estado.
Assim, ninguém conhecerá a verdadeira face deste Governo (composto por um gabinete monocromático de várias dezenas de homens brancos de 40 a 65 anos e apenas uma mulher) até que deixe de ser interino. Em uma recente entrevista a um conjunto de agências de notícias estrangeiras, o presidente brasileiro, além de afirmar que pensa que Dilma Rousseff será finalmente destituída, acrescenta que a interinidade é prejudicial para a economia. Mas que isso mudará a partir do final de agosto, data para o julgamento político da presidenta afastada: "Então, os investidores saberão a quem dirigir-se", acrescenta o atual presidente.
Enquanto isso, Temer, cada vez mais à vontade em sua nova pele, aproveita para deixar sua digital na história de seu, até agora, breve e especial mandato: na recente inauguração da nova linha do metrô do Rio de Janeiro que conduz à Vila Olímpica, inaugurada três dias antes da abertura dos Jogos, foi colocada uma placa comemorativa na qual figura, no lugar mais alto, o seu nome, Michel Temer. Depois, o cargo, "presidente em exercício", com esse incômodo acréscimo que determina tudo e que, segundo seus próprios cálculos e os da maioria dos especialistas do país, logo desaparecerá.
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