Temer e o julgamento político de Dilma. Por Fernando Molica

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Do ótimo blog do Fernando Molica, que explica melhor do que fiz ontem, aqui no Tijolaço, o tamanho da asneira golpista dito ontem por Michel Temer na entrevista a imprensa exterior. Mais claro que isso, como disse uma de suas leitoras, “só desenhando”.
Na entrevista de hoje (ontem) a correspondentes estrangeiros, Michel Temer, segundo a Folha, disse o seguinte:

“Essa questão do impeachment no Senado não depende da nossa atuação. Depende da avaliação política -não uma avaliação jurídica- que o Senado está fazendo. Nós não temos e não poderíamos ter influência nesse processo”, afirmou.
E acrescentou: “Eu penso que o Senado vai avaliar as condições políticas de quem está hoje no exercício e de quem esteve no exercício da Presidência até um certo período.”
O problema é que, segundo a lei que regula o impeachment, a de número 1.079, de 1950 , o processo é jurídico . O texto da própria lei diz que ela define “os crimes de responsabilidade e regula o respectivo processo de julgamento.”
Em linhas gerais, a lei separa crimes comuns dos crimes de responsabilidade – estes,que podem gerar o impeachment, são claramente definidos:
“Art. 4º São crimes de responsabilidade os atos do Presidente da República que atentarem contra a Constituição Federal, e, especialmente, contra:
I – A existência da União;
II – O livre exercício do Poder Legislativo, do Poder Judiciário e dos poderes constitucionais dos Estados;
III – O exercício dos direitos políticos, individuais e sociais; 
IV – A segurança interna do país; 
V – A probidade na administração; 
VI – A lei orçamentária; 
VII – A guarda e o legal emprego dos dinheiros públicos; 
VIII – O cumprimento das decisões judiciárias (Constituição, artigo 89).”
Em nenhum momento a lei inclui entre os crimes de responsabilidade a eventual incompetência do governante. Também não diz que a falta de “condições políticas” (expressão usada por Temer) é também motivo para que um presidente seja posto para fora.
O que o Senado tem que julgar, no caso específico, é se a Dilma violou a lei orçamentária, um dos pontos capazes de gerar o impeachment.
A lei fala em julgamento, define claramente os papéis da Câmara, do Senado e do presidente do STF. Diz que o Senado é “tribunal de julgamento”.
“Art. 80. Nos crimes de responsabilidade do Presidente da República e dos Ministros de Estado, a Câmara dos Deputados é tribunal de pronúncia e o Senado Federal, tribunal de julgamento: nos crimes de responsabilidade dos Ministros do Supremo Tribunal Federal e do Procurador Geral da República, o Senado Federal é, simultaneamente, tribunal de pronúncia e julgamento.
Parágrafo único. O Senado Federal, na apuração e julgamento dos crimes de responsabilidade funciona sob a presidência do Presidente do Supremo Tribunal, e só proferirá sentença condenatória pelo voto de dois terços dos seus membros.”
Ao dizer que o processo não é jurídico, mas político, Temer abre margem para a contestação da legalidade do processo de impeachment. Mais: ele pendura uma espada na direção do pescoço dos futuros presidentes, que terão seus mandatos ameaçados caso percam as tais “condições políticas”. Pendura uma espada na direção do próprio pescoço. O regime brasileiro não é parlamentarista, não custa lembrar.
A declaração de Temer transforma os próximos ocupantes do Planalto em reféns dos deputados e senadores. O presidente passará a ser um mero viabilizador dos desejos e interesses dos parlamentares.

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