Relator pede cassação de Cunha; pedido de vista adia votação de parecer

QUEBRA DE DECORO
Texto, cuja leitura durou quatro horas, destaca que existem provas robustas para comprovar abuso de poder por parte do presidente afastado da Câmara
por Hylda Cavalcanti publicado 01/06/2016 18:45, última modificação 01/06/2016 19:45
LUCIO BERNARDO JUNIOR/CÂMARA DOS DEPUTADOS/FOTOS PÚBLICAS
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Relator disse que Cunha, com seus atos, quebrou valores éticos e morais da comunidade
Brasília – Em leitura que durou quase quatro horas, o relator no Conselho de Ética da Câmara do processo que investiga Eduardo Cunha (PMDB-RJ), deputado Marcos Rogério (DEM-RO), deu parecer pela cassação do parlamentar. O texto considera “robustas” as provas de que Cunha omitiu dinheiro no exterior e fez uso do cargo para obter vantagens. Mas um pedido de vista coletivo adiou a votação do parecer para a próxima terça-feira (7), em sessão marcada para as 9h30.

O relator afirmou que o presidente afastado da Câmara, com seus atos, quebrou valores éticos e morais da comunidade, “num comportamento contrário do que se espera de alguém que está no parlamento e que desgasta a instituição Congresso Nacional, sobretudo no tocante à sua credibilidade e respeitabilidade”. Sobre o uso do cargo para obtenção de vantagens indevidas, Marcos Rogério disse que as provas existentes são “suficientes” para essa constatação e que tais atos foram praticados ou de forma privativa por Cunha e de outros parlamentares a ele ligados, como também, por meio do uso do seu prestígio e poder “para indicar aliados a postos-chave da administração pública”. Na avaliação de Marcos Rogério, isso torna censurável sua consulta perante a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Petrobras – ocasião em que Cunha negou fatos que logo foram confirmados serem verdadeiros.
“Pode-se até discutir, na doutrina nacional, qual a melhor forma de enquadrar o truste (serviço de custódia e administração de bens, interesses ou valores de terceiros) no direito brasileiro, mas é indiscutível que o beneficiário de qualquer trust tem um direito de evidente conteúdo econômico, o qual lhe confere renda e patrimônio. E no caso do deputado, sua situação é mais grave pelo fato de ter constituído trustes revogáveis a seu puro arbítrio”, disse Marcos Rogério.
Cunha informou que nunca precisou dar explicações à Receita Federal porque usufrui de trustes fora do país – e até março passado, esse tipo de informação não precisava ser declarado. Conforme o parecer do relator, ao contrário do que tem tentado justificar o deputado afastado e seu advogado de defesa, a legislação brasileira – baseada em documentos do Supremo Tribunal Federal (STF) e do Banco Central – exige que os trustes sejam declarados às autoridades há certo tempo.
Segundo ressaltou Rogério, os investimentos feitos por Cunha foram usados para o que chamou de “prática de fraudes para ocultamento de bens originários de propina”. Além disso, afirmou que quando são contabilizados os números do valor gasto pelo presidente afastado da Casa, juntamente com os de sua esposa e sua filha, com cartões de crédito, gastos em viagens e contas das duas na Suíça, fica comprovado que o valor é incompatível com o patrimônio que ele diz possuir.

‘Prática habitual e contínua’

“Durante anos, o deputado Eduardo Cunha omitiu à Câmara e nas sucessivas declarações de imposto de renda apresentadas à Receita Federal a titularidade de milhões de dólares no exterior”, disse. “A instrução probatória efetuada demonstrou a prática habitual e contínua de conduta dolosa destinada a falsear e omitir a existência de contas e patrimônio ilícito no exterior”, destaca o documento de Rogério.
Depois de tantas confusões no Conselho e de vários recursos apresentados pela defesa de Cunha em outras comissões, o relator fez questão de observar que, ao citar a questão das contas fora do país, ateve-se, na sua avaliação, apenas à ida voluntária de Cunha à CPI da Petrobras para afirmar declarações depois tidas como não verdadeiras – que foi o que suscitou o pedido de cassação, por falta de decoro, uma vez que um parlamentar não pode mentir em nenhuma CPI.
“A ida voluntária do representado à CPI da Petrobras constituiu muito mais uma clara tentativa de colocar o Congresso Nacional contra as investigações que vinham sendo efetuadas pelo procurador-geral da República naquele momento, do que um ato de colaboração com os atos processuais que vinham sendo praticados pela comissão parlamentar”, disse.
Ele ainda acrescentou que foi pela finalidade desse depoimento voluntário e o contexto em que foi feito, juntamente com as provas existentes, que chegou à conclusão de que Cunha agiu com “absoluta falta de decoro”.
O advogado do presidente afastado da Câmara, Marcelo Nobre, reiterou, na abertura dos trabalhos, argumentos anteriormente apresentados. Afirmou que não existem provas de que seu cliente possui contas na Suíça e que achava que a legislação da Receita a respeito seria modificada ao final deste processo, mas tal lei já foi alterada desde março.

Lamento de Fontana

Um dos primeiros a falar sobre o tema, já no plenário, o deputado Henrique Fontana (PT-RS) considerou que é de se comemorar o fato de, depois de muitas manobras protelatórias, os parlamentares que têm lutado pela cassação do deputado terem conseguido, finalmente, aprovar o relatório. Mas, por outro lado, lamentou que o processo tenha demorado tanto que o parlamentar terminou sendo afastado do cargo, antes, pelo STF, que deu decisão para afastamento provisório durante a tramitação do processo.
“É impressionante o número de deputados que ainda são aliados de Cunha nesta Casa e que atuaram na defesa dele ao longo desse tempo, mesmo sabendo das provas existentes. O que se comprova é que, infelizmente, uma parte do parlamento brasileiro está de joelhos para Eduardo Cunha. O silêncio do presidente interino Michel Temer indica que a base de sustentação de Temer está protegendo Eduardo Cunha”, acusou Fontana.
Com informações da Agência Câmara

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