Dirigente do MST descarta nova eleição e vê trabalhador distante da política

CRISE
"Nós despolitizamos o debate e estamos pagando um preço bastante grande", diz Gilmar Mauro, para quem os trabalhadores estão participando do processo como quem vê um jogo de tênis
por Vitor Nuzzi, da RBA publicado 15/06/2016 19:41, última modificação 15/06/2016 19:49
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Mauro: 'Não haverá saídas fáceis e nem de curto prazo'
São Paulo – Para o dirigente do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) Gilmar Mauro, a convocação de uma nova eleição, como propõem alguns setores, é "bobagem". "Primeiro, porque não se viabiliza a tempo. Segundo, porque legitima o golpe", afirmou, durante debate promovido hoje (15) pela Fundação Perseu Abramo, em São Paulo. "Não achamos que a saída é uma 'articulaçãozona' por cima. Não haverá caminho mais fácil", acrescentou, ressalvando que essa postura não considera o cenário de "consolidação do golpe", com o afastamento definitivo da presidente Dilma Rousseff.

"Não haverá saídas fáceis e nem de curto prazo", disse Gilmar Mauro, prevendo um "período longo de disputas" em um contexto de crise econômica mundial sem perspectiva breve de solução e com ofensivas conservadoras. "Para que isso aconteça de fato, é preciso que o movimento sindical se enfraqueça. O movimento sindical, o movimento social e até partidos têm atuado de maneira reativa."
No Brasil, os fatores que levaram a certo crescimento e redução da desigualdade – alta das commodities, investimentos, maior oferta de crédito – não existem mais. "Esse cenário acabou. O mercado internacional de commodities está saturado. O cenário de pacto entre classe trabalhadora e elite econômica acabou, e não fomos nós que rompemos. É possível ainda pensar em um projeto de desenvolvimento com setores da burguesia nacional?"
Segundo Gilmar Mauro, não existe "ganha-ganha" no capitalismo. "Alguém tem de perder. E os burgueses estão impondo as perdas a nós." Ele também considera um "engodo" a questão discutida nos últimos anos sobre incorporação de setores sociais à classe média. "O que temos, no Brasil e no mundo, é o aumento da classe trabalhadora, com diferenciações sociais imensas", comparou. "Nós despolitizamos esse debate e estamos pagando um preço bastante grande", acrescentou o dirigente do MST.
Ele avalia que quem tem participado mais ativamente das mobilizações é a militância. Já os trabalhadores estariam no processo como se assistissem a um jogo de tênis, vendo a bolinha passar de um lado para o outro, insatisfeitos com Executivo, Legislativo e Judiciário. Mesmo o modelo de "carro de som" em assembleias é questionável, segundo Gilmar Mauro. "O que a gente tem feito é insuficiente para enfrentar a luta de classes neste tempo histórico."
Para o professor Giorgio Romano Schutte, da Universidade Federal do ABC, o governo interino, se efetivado, será mais conservador que o do período de Fernando Henrique Cardoso, o que se refletirá na política externa brasileira. Com uma política "altiva e ativa" a partir da gestão Lula, o país ganhou protagonismo no cenário internacional, no debate sobre Brics e G20 e participação em organismos como a FAO. Os reposicionamentos atuais apontam "claro realinhamento" com os Estados Unidos, observou.
Segundo ele, os "dez mandamentos" do governo interino contêm, principalmente, obviedades, marketing e ideologia, a partir de elaboração de Rubens Ricupero e Sérgio Amaral. "Não são exatamente as pessoas que vão inovar a nossa política externa."

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