Carta aberta a Aécio Neves. Por Paulo Nogueira
Postado em 16 Jun 2016
Caro Aécio:
Que diferença um ano e meio faz, hem? Lembro você fazendo uma campanha à base da palavra corrupção contra Dilma.
Você chegou a empregar a expressão mar de lama, a mesma com que o corvo Lacerda martelou criminosamente Getúlio até levá-lo a dar um tiro no peito.
Você se comportava como um cidadão acima do bem e do mal, um homem tão incorruptível como Robespierre, um exemplo de retidão como o romano Catão.
Uns poucos sabíamos que era uma mentira mantida pelos barões de imprensa. Eles simplesmente mandavam não publicar nada que afetasse sua imagem de homem de elevados princípios morais.
Mas agora seu “esquema” é de domínio amplo, geral e irrestrito. A já histórica delação de Sérgio Machado citou-o não uma, não duas, não três — mas quarenta vezes.
Machado disse que lhe deu os meios para financiar a campanha de 50 deputados, quantidade suficiente para lhe dar a presidência da Câmara no final dos anos 1990.
Isto faz de você um elo entre seu mentor, FHC, o homem que comprou os votos para poder ser reeleito, e Eduardo Cunha, que também financiou a campanha de deputados e com isso virou, como você, presidente da Câmara.
Outros delatores também mencionaram você. Delcídio, por exemplo, falou de Furnas. Sua irmã, Andrea, foi outro nome frequente. Uma das coisas que ela fez foi, quando você governava Minas, transferir dinheiro público para os veículos de mídia da família.
Caro Aécio: isto é indecente. Mas ninguém lhe cobrou. E é fácil de entender: você destinava uma bolada publicitária à Globo, e os Marinhos pensam nisso e só nisso.
Você está em todas.
Isso quer dizer que você, políticamente, é um morto que anda. Todas as denúncias serão lembradas em qualquer debate do qual você participe. E você não terá resposta. Sua campanha girou em torno da corrupção dos outros. O problema agora é sua própria corrupção.
Você se transformou numa farsa, em suma. Como aqueles pastores americanos que condenavam a homossexualidade durante o dia e à noite se esgueiravam em pontos gays.
Você foi desmascarado.
E no entanto foi você mesmo quem deflagrou o processo que o triturou ao se comportar como um homem mimado, estragado, que não sabe aceitar a derrota.
Tivesse a elegância mínima de aceitar a vitória da adversária, estaria em boa situação hoje para as eleições presidenciais. Seus 50 milhões de votos eram um grande cacife para uma segunda tentativa.
Mas não. Inventou pretextos sobre pretextos para subverter as urnas. Deu as mãos a Eduardo Cunha no trabalho sujo contra a democracia e contra Dilma. Contratou uma desvairada como Janaína Paschoal para elaborar um projeto imundo de impeachment.
Tudo foi muito bem para você — até ir muito mal. Seu nome começou a aparecer nas denúncias de roubalheira, e não saiu mais. Já não era apenas o aeroporto particular construído com recursos públicos perto de sua casa de campo. Eram coisa muito mais graves.
Você, numa palavra, se ferrou.
É hoje motivo de desprezo, ódio, rejeição ampla, geral e irrestrita.
Você confiava que mesmo que os delatores citassem você a imprensa daria um jeito de suprimir as menções. Mas você prevaricou tanto que nem a Globo conseguiu manter você fora do noticiário.
E olhe que a Globo foi aparelhada por você. O chefe de política do jornal Globo em Brasília, Paulo César Pereira, é seu parente. O laço foi reforçado: você é padrinho de casamento de Paulo. A mulher de Paulo é Andrea Sadi, repórter de política da GloboNews. Sua afilhada, portanto.
Joseph Pulitzer, o maior editor da história para muitos, dizia que jornalista não podia ter amigos, ou isso deformaria o seu trabalho.
Que você acha disso, Aécio?
Montaigne disse que a maldade traz seu próprio castigo. Você foi mau ao conspirar contra Dilma. E o castigo está aí.
Falta apenas uma coisa: uma tornozeleira. Vejo em você uma perna à espera de uma tornoleira.
Sinceramente.
Paulo
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