Por Paulo Nogueira: O que vai acontecer com os sites independentes num governo Temer?

Postado em 07 May 2016
A plutocracia vai ter que nos aguentar
A plutocracia vai ter que nos aguentar
O que vai acontecer com os sites independentes num governo Temer?
A resposta cabe em duas sílabas: na-da.
Há uma imensa torcida da plutocracia para que eles desapareçam. O motivo seria o fim, neles, de propaganda do governo federal.
Há várias tolices contidas aí.
A mais importante é que quem verdadeiramente depende da publicidade do governo federal são as grandes empresas de jornalismo.
Elas não vivem e nem sobrevivem sem dinheiro público em torrenciais quantidades. Apenas a TV Globo levou nestes anos todos do PT 500 milhões de reais em média ao ano em propaganda governamental.

Foi um dos maiores erros do PT. As administrações petistas financiaram as companhias de jornalismo e contribuíram para a colossal fortuna particular das famílias Marinho, Civita e Frias, para ficar nas principais.
O efeito destruidor da internet sobre a imprensa tradicional brasileira foi extraordinariamente mitigado pelo duradouro e multimilionário mensalão da publicidade federal.
A Abril provavelmente já estaria morta, por conta do mercado, não fossem as remessas constantes de dinheiro público oriundas do Planalto.
Fazia já anos que a Veja se dedicava meticulosamente a tramar a derrubada do governo com um jornalismo bandido e, mesmo assim, cerca de 100 milhões por ano iam dar na Abril em anúncios federais publicados numa mídia já virtualmente sem leitores.
A Abril conseguiu, no apogeu da guerra de exterminação contra o PT, até um financiamento do BNDES parareformar a base tecnológica de seu sistema de assinaturas.
Acionistas então riquíssimos foram poupados de investir num negócio de interesse exclusivo dos Civitas. (O tamanho da fortuna da família é tanto que, há pouco tempo, os Civitas colocaram 450 milhões de reais na Abril.)
São as grandes empresas, repito, que não vivem e nem sobrevivem sem o dinheiro público.
Isso vem de longe. Num livro que reuniu documentos guardados pelo presidente Geisel, há um despacho de um ministro do círculo íntimo do poder que dizia que o governo deveria jamais esquecer da dependência da imprensa de favores governamentais. Era uma “arma extraordinária” para lidar com os donos dos jornais.
Publicidade, financiamentos subsidiados em bancos oficiais, vista grossa para a sonegação de impostos, manutenção de privilégios abjetos como a isenção de impostos na compra de papel – tudo isso o ministro de Geisel alinhavou para explicar por que a imprensa não se sustentaria de pé sem a mãozinha providencial do governo.
A administração Geisel usou isso, por exemplo, ao ameaçar cortar o dinheiro público que salvar as contas do Jornal do Brasil depois que este contratou como colunista Carlos Lacerda.
Lacerda já era então inimigo mortal da ditadura porque os militares ceifaram seu sonho presidencial ao decidir permanecer no poder em vez de devolvê-lo aos civis rapidamente.
Pode-se dizer que os únicos governos que encheram as empresas de mídia de dinheiro sem nenhumacontrapartida foram o de Lula e o de Dilma.
Republicanismo ou burrice, cada qual fique com sua visão das coisas.
Repare que jamais, ao execrar os gastos exagerados do governo, os jornais tocaram na questão das absurdas verbas publicitárias.
Este quadro de dependência visceral do dinheiro do contribuinte está na cultura da mídia brasileira.
O PT perdeu uma chance formidável de promover um choque de capitalismo na imprensa. Bastaria forçá-las a viver das próprias pernas. Os barões da imprensa não seriam tão bilionários, mas pelo menos aprenderiam o que é capitalismo.
Os sites independentes vivem uma realidade completamente diversa. Receberam sempre uma migalha miserável da publicidade governamental, isto quando receberam alguma coisa.
Toda a estrutura da Secom, o departamento do governo responsável pela publicidade federal, foi montada de forma a beneficiar as grandes empresas, a começar pela Globo.
Também isso o PT nunca mudou.
A internet já respondia em países como a Inglaterra por metade da verba dos anunciantes e no Brasil estatais destinavam menos de 5% de seu orçamento para a mídia digital. E mesmo assim a fatia maior desses 5% esqueléticos ia, claro, para os sites das grandes empresas.
É portanto uma falácia, um cinismo, uma piada dizer que os sites independentes foram financiados pelo PT.
É uma inversão sórdida: financiadas foram as empresas da mídia plutocrata, para usar a expressão de Glenn Greenwald.
Com seus custos obscenos – você pode imaginar os dividendos dos donos –, elas não podem se manter como são sem a publicidade federal.
Os sites independentes têm, em oposição, custos mínimos.
No caso específico do DCM, a publicidade programática – anúncios que vão diretamente para os sites, de acordo com sua audiência, e sem intermediação das agências – cobre com folga todos os custos.
O futuro é da publicidade programática. No Reino Unido, metade das verbas digitais dos anunciantes deriva da publicidade programática, e o crescimento é vigoroso.
Você depende de apenas uma coisa para ter uma receita boa nesse campo: público. E para isso, como sempre na história da imprensa, você tem que ter qualidade no conteúdo.
A mídia plutocrática, com sua partidarização, abre um mercado enorme para sites voltados para leitores que não toleram seu conteúdo manipulador.
Isso quer dizer o seguinte: ao contrário do que gostariam as grandes empresas e seus jornalistas vassalos, os sites independentes continuarão sua escalada no mercado de notícias, seja com que governo for.
mercado os quer.
Na contrapartida, as corporações da plutocracia enfrentarão inevitavelmente a crescente erosão de sua audiência por força da internet.
Receberão de governos amigos, como o de Temer, caso o golpe se concretize, dinheiro em doses indecentes.
Mas mesmo isso não impedirá que o mercado faça com elas o que fez, no passado, com os fabricantes de carroças quando surgiram os carros: as transforme em pó.
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Paulo Nogueira
Sobre o Autor
O jornalista Paulo Nogueira é fundador e diretor editorial do site de notícias e análises Diário do Centro do Mundo.

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