Chauí: 'Esgoto da política subiu à tona'. Trajano: 'Mídia esconde reação popular'
GRITO PELA DEMOCRACIA
Movimentos sociais, intelectuais, juristas e populares realizam ato em defesa da legalidade democrática e contra os retrocessos do governo interino de Michel Temer. Imprensa é cúmplice do golpe, diz José Trajano
por Vitor Nuzzi, da RBA publicado 21/05/2016 16:33, última modificação 21/05/2016 21:13
JORNALISTAS LIVRES/FACEBOOK
Trajano disse que superou com a reação da sociedade o desânimo que o abateu depois das votações do impeachemnt
São Paulo – “O esgoto da política brasileira subiu à tona. Temos de lavar e limpar tudo isso aí”, disse a filósofa Marilena Chaui, sobre o afastamento da presidenta Dilma Rousseff por meio de um golpe legislativo conduzido pelo que “há de pior” da política brasileira. A professora da Universidade de São Paulo (USP) participou do Grito pela Democracia, manifestação realizada durante a tarde e até o início da noite, na capital paulista, reunindo dezenas de pessoas no palco e centenas na plateia.
O evento começou às 14h15 deste sábado (21), na Casa de Portugal, bairro da Liberdade, e é organizado pelo mandato do deputado Paulo Teixeira (PT-SP), compondo a onda de manifestações desencadeadas desde a posse de Michel Temer como presidente interino, em 12 de maio. O ato é marcado pela diversidade, com intervenções de representantes de diversos setores da sociedade brasileira – como movimento negro, LGBT, intelectuais, jornalistas, estudantes – e por uma sucessão de palavras de ordem como “Fora Temer” e “Volta Dilma”.
“Em uma canetada, o governo Temer desfaz o trabalho de 15 anos. Simplesmente anula. Mas ele não pode anular aquilo que nós somos. A democracia se caracteriza por uma forma social de criação de direitos, a instituição de novos direitos e a garantia de direitos existentes”, disse Chaui, conclamando a reação ao golpe.
O jornalista José Trajano, em sua intervenção, admitiu ter ficado “desanimado” pela forma autoritária como a Câmara e o Senado determinaram o afastamento da presidenta Dilma Rousseff. “Eu desanimei, baixei a cabeça. Mas depois de ver a nossa gente na rua, me animei de novo. E essa vai ser a nossa vitória", afirmou, citando nomes como os de Leonel Brizola e Darcy Ribeiro. "Quem está aqui agora, somos nós, principalmente as mulheres e a juventude."
Trajano afirmou que o golpe em curso não seria possível sem a cumplicidade da imprensa tradicional no processo, destacando vários veículos, como as revistas Veja e IstoÉ, a emissora Jovem Pan e a Rede Globo e exaltando meios alternativos, "a verdadeira mídia deste país", como Mídia Ninja, Jornalistas Livres, Tijolaço, Diário do Centro do Mundo e Escrevinhador. Ele lembrou que essa imprensa continua engajada na operação, ao lembrar que todos os veículos comerciais esconderam a manifestação ocorrida ontem à noite em Belo Horizonte.
Antes de participar da abertura do 5º Encontro Nacional de Blogueiros Progressistas e Ativistas Digitais na capital mineira, a presidenta afastada Dilma Rousseff foi recebida por um ato de solidariedade com a participação de mais de 30 mil pessoas, segundo estimativa da Frente Brasil Popular. “Ninguém deu nada. Somente os blogueiros e veículos alternativos.”
O jornalista pediu unidade para combater o governo interino. "Temos de sair daqui unidos e confiantes que vamos derrubar quem usurpou o poder." E comentou a decisão anunciada de manter o Ministério da Cultura, após dias de protestos. "Não pensem eles que isso nos satisfaz. Tudo o que vier desse governo ilegítimo não terá nosso respaldo", reagiu Trajano.
Marco do retrocesso
Primeiro a falar no evento, o integrante do coletivo Democracia Corintiana Leandro Bergamim Almeida demonstrou preocupação com a iminência de um governo repressivo ante o processo de resistência que está em curso. E lembrou a prisão de torcedores que se articularam para protestar contra o escândalo da merenda em São Paulo. Ele citou também o cinismo o ex-presidente da Câmara e um dos líderes do golpe, Eduardo Cunha, ao depor na Comissão de Ética da Casa esta semana. “Ele disse que o dinheiro (encontrado em paraísos fiscais) não é dele. É claro que não é. É nosso!”, ironizou o ativista.
A sessão na Câmara ainda presidida por Cunha, em 17 de abril, foi o marco histórico do retrocesso político e ideológico em curso no Brasil, na avaliação de Amelinha Teles, ex-militante do PCdoB, presa pela ditadura nos anos 1970 e integrante da Comissão de Familiares de Mortos e Desaparecidos Políticos. Ela disse estar vivendo o seu "segundo golpe". “Não podemos abandonar essa luta. A única luta que se perde é a que se abandona. Vamos resistir sempre. Temer jamais”, enfatizou Amelinha.
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