Mauricio Dias: O Gilmar de sempre
Opinião
O ministro Mendes já defendeu Collor e condenou o Tribunal de Nuremberg
por Mauricio Dias — na Carta Capital - publicado 09/04/2016
José Cruz/Agência Brasil
Irá ele, agora, transferir suas distorções para o Tribunal Superior Eleitoral? |
Gilmar Mendes tornou-se uma espécie rara em quase 15 anos de uso e abuso da almejada toga do Supremo Tribunal Federal. Nesse período mostrou-se um juiz com índole e característica um tanto incomuns. Em pouco tempo essa distorçãoficou clara. O magistrado, além das pitadas políticas, acrescentou um danoso cálculo partidário a certas decisões.
Para ele, o plenário do STF em certos julgamentos torna-se uma espécie de competição. Um clássico. Foi assim, por exemplo, no julgamento do “mensalão”.
Irá ele, agora, transferir este confronto para o Tribunal Superior Eleitoral?
Quando esse árbitro decide, os petistas perdem. Os tucanos ganham. É quase um torcedor apaixonado. É uma regra. E não é por acaso.
Gilmar entrou para os quadros do Supremo praticamente pela porta de trás. Indicado por Fernando Henrique Cardoso, assumiu a Corte, em junho de 2002, com uma aprovação apertada no Senado e, já então, acossado por senadores do PT. Em janeiro de 2003 Lula assumiu a Presidência. Gilmar escapou por um triz.
Muitos anos antes, em 1992, ao longo do debate sobre o impeachment de Fernando Collor, foi percebido e destacado pelo jornalista Moacir Werneck de Castro (1915-2010), nas páginas do hoje extinto Jornal do Brasil.
Werneck, também escritor e tradutor, tinha sensibilidade transmitida no pelo do braço e faro profissional semelhante ao de perdigueiro. Mais de duas décadas atrás, ele percebeu certas tipicidades naquele homem. Um jovem rábula. Eis um flagrante sobre Gilmar.
“Diante das câmeras de televisão e em várias entrevistas à imprensa, tem deitado sapiência boba sobre as mais altas questões de Direito Constitucional. Ninguém sabe informar quem é o Gilmar, nem o que fez ou escreveu, nem de onde veio, mas o título que lhe outorgaram para a emergência conferiu-lhe uma deliciosa notoriedade.”
O jornalista percebeu no comportamento, nos jeitos e trejeitos do então “assessor jurídico” de Collor. Gilmar havia recém-retornado da Alemanha, onde concluiu os estudos superiores.
“Numa de suas falações em defesa do presidente Fernando Collor, ele afirmou que o processo de impeachment é uma barbaridade, um linchamento, um verdadeiro... tribunal de Nuremberg.”
Werneck percebeu a fragilidade daquele homem e, com ironia, o desnudou:
“Sim, o cara disse isso mesmo. Eu vi, todo mundo viu. Fulminou Nuremberg como o suprassumo da iniquidade judiciária. Evidentemente não estava fazendo a mínima ideia do que foi o tribunal reunido depois da Segunda Guerra Mundial na devastada cidade da Baviera (...). Para Gilmar, era um tribunal nazista. Talvez pensasse no tribunal de Leipzig, que julgou o incêndio do Reichstag, farsa montada pelo hitlerismo recém-investido no poder para incriminar os comunistas”.
Segundo Werneck, quando advertiram Gilmar Mendes da confusão, “o jurista do Planalto” procurou disfarçar, alegando que se referia ao “modelo”, “ao rito célere supostamente estabelecido em Nuremberg para o julgamento dos piores criminosos de guerra que a História já conheceu”.
Conclusão fulminante de Werneck: “De qualquer modo, seria um paralelo estapafúrdio, próprio, quando não de crassa ignorância, pelo menos de uma argumentação bisonha e desastrada”.
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Jornalista, editor especial e colunista de CartaCapital.mauriciodias@cartacapital.com.br
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