Frauke Petry, a nova cara da extrema-direita na Alemanha
Sua juventude a ajudou a se destacar na política alemã, assim como sua proposta de atirar em refugiados que tentam entrar ilegalmente no país
por The Observer —na Carta Capital - publicado 11/03/2016
Volker Hartmann/Getty Images/AFP
Petry, nascida no lado oriental, catalisa as reações à política de acolhimento de refugiados
Houve um tempo no qual se alguém mencionasse uma política alemã com raízes no Leste comunista e doutorado em Ciência falaria de Angela Merkel.
Há, no entanto, uma nova mulher em cena. Frauke Petry, a jovem líder do principal partido de direita alemão, anti-imigrantes, a Alternativa para a Alemanha (AfD, na sigla original), avança e lucra com a crescente insatisfação em relação à política derefugiados da chanceler, que estimulou a chegada de mais de 1,1 milhão de estrangeiros ao país no ano passado.
Petry, de 40 anos, quase não sai dos noticiários desde que causou polêmica ao insistir recentemente que a polícia de fronteira da Alemanha deve ter o direito de atirar em refugiados que tentarem entrar clandestinamente no país.
“Deve-se impedir que os imigrantes cruzem ilegalmente da Áustria para a Alemanha”, disse em entrevista a um jornal regional. “Se necessário, deveriam usar armas de fogo. Não quero isso, mas o uso da força armada existe como último recurso.”
Seus comentários, feitos imediatamente após um discurso aos seguidores do partido em Hannover, provocaram uma tempestade de protestos, no mínimo por lembrarem, com um calafrio, o tempo da Guerra Fria, quando seres humanos foram mortos a tiros ao tentar escapar da Alemanha Oriental comunista, onde Petry cresceu.
A líder do AfD, que terminou a Universidade de Reading, na Inglaterra, com um diploma de química em 1998, ascendeu ao comando do partido em julho de 2015, após a saída dos fundadores acadêmicos que criaram a legenda como um grupo antieuropeu no auge da crise grega, em 2013.
A partir daí, Frauke foi uma peça central nos esforços para conduzir o AfD a uma posição populista, anti-imigrantes, e uma das mais veementes – e perigosas – críticas da decisão de Merkel de acolher os refugiados.
Merkel recusou-se resolutamente a aceitar as exigências de fechar as fronteiras ou impor limite ao número de refugiados. Pesquisas de opinião mostraram recentemente que a AfD tem hoje até 12% de aprovação, o que a torna potencialmente a terceira força política da Alemanha.
Com eleições marcadas para o próximo mês em três estados, a legenda estaria prestes a obter ganhos consideráveis nos parlamentos de Baden-Wurttemberg, Alta Saxônia e Renânia-Palatinado.
O partido tem assentos em cinco parlamentos estaduais e observadores dizem que os representantes de legendas estabelecidas não podem mais continuar a ignorá-lo, como fizeram de modo geral até hoje.
Habitualmente vestida com ternos bem-cortados, Petry tornou-se a face jovem da ascensão da AfD. Em um programa de tevê, em debate sobre a inclinação à direita da Alemanha, ela fincou o salto do sapato no tapete e insistiu ser errado rotular seu partido de populista e de extrema-direita. “Tem a ver com políticos que reconhecem que precisamos de conceitos que levem a soluções ou não. Direita e esquerda são termos que não se encaixam há muito tempo.”
No passado, a AfD tentou distanciar-se do grupo de campanha anti-imigrantes e anti-islâmicos Europeus Patrióticos contra a Islamização do Ocidente (Pegida), que, como Petry, se originou em Dresden. Mas seu partido é cada vez mais citado como o braço político do Pegida. E Petry pouco fez para convencer alguém do contrário.
Ambos utilizam linguagem semelhante, como “imprensa mentirosa”, um termo guarda-chuva para a mídia, ou “traidor”, para se referir a Merkel e outros defensores de sua política de asilo, que eles gostariam de ver revertida, com controles em toda a extensão das fronteiras alemãs.
Assim como nos comícios do Pegida, tornou-se comum ver cartazes da AfD a pedir que figuras do governo sejam linchadas como castigo. Recentemente, um funcionário da legenda sugeriu que a pena de morte seja adotada para o governo ser “encostado em um muro” e fuzilado.
Jakob Augstein, colunista da revista Der Spiegel, disse a Petry no mesmo programa de debate: “Você é o sorriso amistoso no rosto das hordas que marcham por Dresden e espancam cidadãos (...). Você é o braço democrático daqueles que espreitam estrangeiros e incendeiam as casas dos asilados”. Petry continuou a sorrir quando ele prosseguiu: “Eu não a subestimo. Eu a levo muito, muito a sério”.
Há muito tempo não se escrevia e se falava tanto sobre um político alemão, à exceção de Merkel. Petry destaca-se de seus seguidores, na maioria homens grisalhos (estatísticas recentes mostraram que 71% dos eleitores da AfD são do sexo masculino), com sua aparência jovial e sorridente.
Mãe de quatro filhos, ela causou um escândalo razoável no ano passado quando anunciou que havia deixado seu marido, o pastor luterano Sven Petry, por Marcus Pretzell, deputado da AfD. Seu novo parceiro desde então trocou a AfD pela Democracia Cristã de Merkel.
Apesar disso, houve sugestões de que ele é responsável por Petry se sentir cada vez mais à vontade para manter o partido no rumo da direita populista. “Pretzell e Petry são o ‘amor louco’ da direita alemã”, escreveu Augstein em uma coluna recente. “Como Bonnie e Clyde, eles seguem um curso de emboscadas entre o público alemão.”
O sorriso da líder do AfD tem sido visto com suspeita por muitos. Ao chamá-la de “Frau Dr. Strangelove”, referência ao ex-cientista nazista que assessorava o presidente no filme de Stanley Kubrick de 1964, Hans Hutt escreveu no jornal de esquerda Freitag: “O sorriso de Petry é um código. Todo sorriso e toda expressão dão um sinal ao povo: os argumentos do outro são besteiras... Trazem o terror de volta à política alemã. Parecem tão simpáticos, tão insultantemente simpáticos”.
*Reportagem publicada originalmente na edição 888 de CartaCapital, com o título "Hitler de saias?"
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