Lula diz que saída da crise econômica também é política e reage a acusações

Ex-presidente afirma que "só economia" não resolverá os problemas do país. Para ele, governo deve ter "obsessão" com a retomada do crescimento, sem "fazer discurso" para o mercado
por Redação RBA publicado 20/01/2016 20:34, última modificação 20/01/2016 20:56
HEINRICH AIKAWA/INSTITUTO LULA
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Lula: "Não conseguimos ganhar uma pessoa do mercado. Nem o Levy, que era o representante do mercado"
São Paulo – O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva defendeu hoje (20) ações políticas para que o país saia da crise econômica. Em entrevista a blogueiros, realizada na sede do instituto que leve o seu nome, Lula também afirmou que não adianta ficar "fazendo discurso" para o mercado financeiro. Para o ex-presidente, o governo precisa ter "obsessão" com a retomada do crescimento econômico, o que é uma "tarefa política". Ele também reagiu a tentativas de incriminá-lo e ao que considera perseguição ao governo Dilma e ao PT.
"O que eu acho é que quando a gente tem crise a gente não fica discutindo crise, temos que discutir saída da crise. Na minha opinião, não tem saída só econômica se não discutir um pouco de política junto, só economia não resolve isso", afirmou Lula. "Acho que o grande sinal que o governo tem de dar é esse: nós vamos retomar o crescimento desse país custe o que custar. Isso é necessário. É necessário porque se a gente não tomar iniciativa, há uma estimativa de que o PIB (Produto Interno Bruto) possa cair mais 3% em 2016”, acrescentou.

Lula sugeriu apoio ao consumo, para estimular o mercado interno, e investimento em infraestrutura. "Termine o Comperj (Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro), a Refinaria Abreu e Lima, termine as ferrovias que começaram – muitas já estão em andamento – termine as rodovias que começaram, faça as hidrelétricas que precisam ser feitas, as linhas de transmissão que precisam ser feitas, as eólicas que precisam ser feitas. Não tem problema você aumentar a dívida em alguma coisa se for para construir um ativo novo para gerar emprego novo, para gerar renda, para gerar desenvolvimento. Não tem nenhum problema."
Para ele, também é uma questão de exemplo. "Você precisa escolher o que fazer, com investimento público. Se o governo não está pondo dinheiro, porque o empresário vai por? O governo precisa tomar a iniciativa. Precisamos de uma forte política de financiamento, temos muitas obras inconclusas que precisam ser terminadas."
Ele lembrou ainda que foi durante o governo Dilma que o país teve a menor taxa de desemprego da história (4,8%, segundo o IBGE) e que ela tem condições de fazer o país retomar o crescimento e voltar a criar postos de trabalho. E disse que "em algum momento deste mês" o governo terá de fazer algum anúncio relacionado à economia, inclusive para explicar à sociedade o que levou à mudança de titular no Ministério da Fazenda – no final do ano, Nelson Barbosa substituiu Joaquim Levy.

Mercado

Segundo Lula, o país não vai melhorar "fazendo discurso" para o mercado financeiro. "Em algum momento, se acreditou que fazendo discurso para o mercado a gente iria melhorar. O que percebemos é que não conseguimos ganhar uma pessoa do mercado. Nem o Levy, que era o representante do mercado no Ministério da Fazenda e virou governo. Nem ele. Não ganhamos ninguém e perdemos a nossa gente."
Lula avaliou que o primeiro mandato da presidenta foi "muito exitoso". "Os problemas começaram quando a Dilma, preocupada em prevenir a redução do crescimento, e ela não queria de jeito nenhum reduzir os programas sociais, fez um forte subsídio. E uma forte política de isenções que chegou a quase R$ 500 bilhões nos últimos anos", lembrou. "Quando você faz subsídios e a economia não consegue se recuperar, você começa a arrecadar menos. E aí precisa fazer um corte. E para isso, precisa escolher o que é prioritário para a sociedade, no caso, a geração de emprego, o investimento nas universidades."
Segundo ele, também houve um "equívoco político" que Dilma já reconheceu. "Foi a gente ganhar as eleições com um discurso, com apoio do povo da PUC e da zona leste, de artistas, de gente que acreditou e foi para a rua defender um projeto de inclusão social, acreditando que é possível fazer um processo mais forte de democratização da mídia brasileira, de diversificação da cultura. Foi para isso que as pessoas foram para as ruas. E a Dilma dizia que ajuste era coisa de tucano, não coisa dela, mas depois foi obrigada a fazer. E como estava num processo de diálogo com o movimento sindical e só anunciou em dezembro… Criou um mal-estar. Ela sabe disso", afirmou.

Crescimento

O ex-presidente vê dificuldades para o governo se quiser aumentar a receita via tributos. "Uma forma de aumentar a capacidade de arrecadação do Estado brasileiro é aumentar imposto, e está difícil no Congresso. A outra é o crescimento econômico. A Dilma tem de ter como obsessão a retomada do crescimento e do emprego. Não é fácil, mas é a tarefa política", comentou.
Lula relativizou o problema da inflação, mas disse que o governo deve ter cuidado para que o trabalhador não tenha redução da renda. "Para mim, quem viveu inflação de 80% ao mês, 8% dá até para guardar dinheiro debaixo do colchão. Mas não podemos deixar a inflação avançar, porque o trabalhador perde. Quem ganha são os especuladores."
Lula também contestou as tentativas de envolvê-lo em esquemas de corrupção. "Se tem uma coisa de que me orgulho e que não baixo a cabeça para ninguém é que não tem nesse país uma viva alma mais honesta do que eu. Nem dentro da Polícia Federal, do Ministério Público, da Igreja Católica, da igreja evangélica, nem dentro do sindicato. Pode ter igual, mas eu duvido”, afirmou, considerando remotas as chances de ser indiciado em algum processo. "Não há nenhuma possibilidade de uma ação penal, a não ser que seja uma violência contra tudo o que se conhece neste país. O próprio (juiz Sérgio) Moro já disse que eu não sou investigado”, disse, referindo-se ao magistrado que conduz os processos relativos à Operação Lava Jato.
O ex-presidente criticou a publicação,  na imprensa, do que chamou de "mentiras" contra ele e sua família. Também reagiu a boatos espalhados nas redes sociais. "O meu filho Fábio, o que fazem com ele é uma violência." E afirmou que pretende entrar na Justiça sempre que forem publicadas informações falsas contra ele. "Tudo o que os advogados entenderem que é possível abrir processo, eu vou abrir processo."
Ele também fez ressalvas ao PT, que "cometeu práticas que nós condenávamos" depois de chegar ao poder. "O PT precisa perceber que nós não nascemos para ser igual aos outros partidos políticos. O PT nasceu justamente para mudar a lógica da política dos partidos tradicionais", disse Lula. Mas ele acrescentou que o partido passa por um processo de "criminalização", no qual se levantam suspeitas até sobre doações legais de campanha. "O que acho grave é que todos os partidos pegaram dinheiro das mesmas fontes. Os empresários são os mesmos para todos os partidos, e só com o PT é crime? Por isso, sou favorável ao financiamento público de campanha."
Lula disse ainda que concorda com os termos do manifesto divulgado por um grupo de advogados que defende acusados na Lava Jato, que fala em "excesso de prisões preventivas", "espetacularização" dos julgamentos e "restrições" ao direito de defesa. "Eu li o  manifesto dos advogados, achei pertinente e atualizado. Acho que está na hora de a sociedade brasileira acordar e exigir mais democracia, mais direitos humanos e mais respeito a tudo que construímos de fortalecimento das instituições”, afirmou.
Com informações da Agência Brasil e do Instituto Lula

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