Emir Sader: Mauricio Macri, um Aécio que deu certo?
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O governo de Mauricio Macri não perdeu tempo para demonstrar ao que veio. As vagas e doces promessas de campanha ficaram rapidamente para trás, substituídas pela dura realidade dos choques na economia, na segurança pública, nos meios de comunicação, no Judiciário. O sentido do Cambiemos – nome de marketing da sua campanha – ficou claro em pouco tempo. Difícil selecionar que posição, que ato, que declaração revelam melhor o sentido do governo da nova direita argentina.
As semelhanças com Aécio Neves e com a direita brasileira são muitas, tanto na campanha, quanto no governo realmente existente. Ambos batalharam muito tempo contra governos caracterizados pela opção preferencial pelas políticas sociais para os mais necessitados, perdendo sempre. Dispõem do monopólio privado dos meios de comunicação. Assumem sempre o modelo econômico neoliberal. Promovem aproximações com os EUA e detrimento dos processos de integração regional. Consideram que o projeto desenvolvido no país fracassou, que é preciso dar uma virada radical a favor das políticas de mercado.
Ambos se apresentam como bons moços, que tentam se contrapor à "excessiva" presença do Estado, tendo atrás de si aos grandes empresários, as perspectivas de grandes investimentos externos caso se abra a economia para o mercado internacional. Prometem uma virada radical na economia e na inserção internacional do país, recuperando a imagem negativa que eles mesmos projetaram.
As diferenças vêm de que Aécio perdeu - por 3%- , enquanto Macri ganhou - por 2,6%. Macri vem de uma direita dura e pura, frontalmente oposta ao peronismo e a suas políticas sociais. Tem um partido relativamente pequeno, que fez alianças eleitorais para ter apoio nacional. Tem fama de bom empresário, embora sua imagem pública veio da presidência do Boca Juniors. Saiu dos dois mandatos na prefeitura de Buenos Aires com apoio suficiente para eleger seu sucessor.
Aécio vem de um partido que originalmente se disse social democrata, com uma estrutura política nacional, grande quantidade de governadores, bancada expressiva no Congresso. Saiu de um governo fracassado em Minas Gerais.
Macri teve a capacidade para assumir a ideia da "mudança" – no próprio nome da sua coalizão: Cambiemos -, contando com a imagem negativa e pessimista gerada e alimentada pela mídia, de rejeição à continuidade. Valeram-se de elementos reais – como a inflação na casa dos 25% - da defasagem entre o câmbio oficial e o paralelo, de retrocessos dos efeitos sociais das políticas do governo -, mas sobretudo do papel pesado que a mídia jogou lá também.
A oposição conseguiu bloquear praticamente todos as decisões da Lei de Meios no Judiciário e atuou de forma ainda mais partidária contra o governo. As campanhas mais ou menos similares às daqui criaram um clima de pessimismo econômico, pano de fundo para passar a ideia da necessidade do "cambio".
Lá também a reiterada campanha de denúncias da corrupção que envolveria o governo e políticos do kirchnerismo teve os seus efeitos, especialmente sobre setores da classe média, que aceitavam o Nestor e a Cristina enquanto eles tiraram o país da pior crise da sua história. Mas que quando começaram a ver a possibilidade de ter governante alternativo, se jogaram totalmente nessa alternativa.
Tal como Aécio, Macri pode contar com dissidentes do governo, nesse caso com Sergio Massa, que esteve no governo mas rompeu, além do decadente Partido Radical. Mas tal como Aécio, sua equipe fundamental é de economistas e executivos de empresas privadas, que ocupam os cargos mais importantes do seu governo.
É cedo para dizer que Macri deu certo. Ganhou, o que até aqui nenhum outro candidato da oposição a governos progressistas da região havia conseguido. Mas como triunfou com uma estreita margem e os movimentos populares estão muito ativos, não teve lua de mel, tendo enfrentado já várias manifestações na Praça de Maio contra o seu governo e uma de piquetes na autopista a Ezeiza que, tal qual ele havia prometido, foi dissolvida com muita violência. O clima de euforia é então restrito a setores do grande empresariado e da mídia econômica internacional.
É cedo ainda para dizer que Macri deu certo, mas seu começo de governo basta para dizer que ele é a versão argentina do derrotado – mas não resignado – Aécio Neves.
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