Bernie Sanders: uma estrela no horizonte
Um senador de Vermont, um estado politicamente fraco, está propondo uma devassa no sistema financeiro e impostos mais pesados para os mais ricos
Uma estrela é uma luz que orienta, e o horizonte é longínquo porém vasto e jubiloso: quero dizer que a estrela no horizonte é mais remota porém mais bela, significativa e auspiciosa do que a velha luz no fim do túnel. E nesta perspectiva quero falar do Senador Bernie Sanders, o primeiro candidato socialista à presidência da república na história dos Estados Unidos da América.
A primeira nação livre e democrática do mundo foi um farol que iluminou todos os povos do Ocidente durante o século dezenove, até a primeira metade do século vinte. Por mais de cem anos, navios cruzavam diariamente o Atlântico Norte abarrotados de emigrantes que aportavam em Nova Iorque, sob o facho luminoso da Estátua da Liberdade, trazendo homens e mulheres cheios de esperança, em busca da felicidade que lhes era vedada na Europa.
A primeira nação livre e democrática do mundo foi um farol que iluminou todos os povos do Ocidente durante o século dezenove, até a primeira metade do século vinte. Por mais de cem anos, navios cruzavam diariamente o Atlântico Norte abarrotados de emigrantes que aportavam em Nova Iorque, sob o facho luminoso da Estátua da Liberdade, trazendo homens e mulheres cheios de esperança, em busca da felicidade que lhes era vedada na Europa.
Aos poucos, entretanto, depois da segunda guerra, na segunda metade do século XX, aquela imagem se foi deteriorando. O ideal político novo, socialista, que se afirmou a partir do heroísmo de Stalingrado, prometendo justiça, igualdade e fraternidade entre os seres humanos, ganhou fortes adesões em todo o mundo e suscitou uma reação americana, de anticomunismo radical, macartista, que se espalhou lastreado num armamentismo em escala jamais vista. Ademais, a grande potência americana passou a praticar uma política imperialista de dominação também em escala jamais vista, com o propósito de impor um efetivo poder mundial e um modelo econômico do business comandado por eles. A resposta, igualmente realista e imperialista da outra potência que sustentava o socialismo, criou um confronto de enormes proporções, caracterizando mesmo uma guerra que só não se materializou plenamente em razão dos graves riscos de destruição de todo o planeta.
O fato é que a força e a beleza do ideal libertário americano se foram desvanecendo à proporção que este embate se desenvolvia e nele se evidenciava a arrogância dos dois poderes dominadores, igualmente cínicos e prepotentes. As guerras parciais de confronto, na Coréia, na China e no Vietnam, e posteriormente no Oriente Médio, acentuaram continuamente o forte desgaste do prestígio americano, que não obtinha vitórias apesar do inacreditável poderio militar usado em operações arrasadoras, genocidas. Parecia faltar-lhe, precisamente, a força de um ideal mobilizador.
Sua força material e econômica, entretanto, cresceu avassaladora e levou ao colapso a potência rival. Com o desmoronamento da União Soviética, a dominação do business americano, com o poder dos seus bancos à frente, parecia definitiva, um triunfo que aparecia como o fim da História.
Na América do Sul, o imperialismo americano abertamente derrubou governos democráticos, nos idos dos sessenta e setenta do século passado, propiciando a implantação de ditaduras militares cruentas, fato que contribuiu decididamente para criar sentimentos de repulsa em relação à dominação política e econômica da potência do norte, e deu origem ao surgimento e crescimento de grupos políticos que defendiam propostas de emancipação do continente do Sul.
E logo surgiu a China, como potência alternativa; e surgiu o grupo dos BRICS, os emergentes que rejeitavam o modelo do business e fortaleciam a opção de um novo caminho. E a poderosa economia do sistema financeiro globalizado e dominador mostrou instabilidade e entrou em crise. A História não havia terminado.
E é neste panorama tumultuado que surge a estrela no horizonte. Depois do Presidente negro de pai muçulmano, que recebeu de entrada o Prêmio Nobel encorajando-o a buscar a paz mundial e a justiça social; que não logrou realizar essas promessas implícitas mas abalou crenças cristalizadas e suscitou uma forte reação interna do business mais ortodoxo, criando uma radicalização política espantosa dentro da potência imperialista; depois dessa período de tensão interna incomum, eis que surge, dentro mesmo do Império, uma voz realmente nova, brilhante e socialista.
Um senador de Vermont, um estado politicamente fraco, quem diria(?!), propondo uma devassa no sistema financeiro e impostos mais pesados para os mais ricos, salário mínimo mais elevado, sistema único de saúde como o nosso e educação pública e gratuita do primário à universidade, uma revolução política orientada por um pensamento de cunho socialista, que avança nas pesquisas de opinião a ponto de ameaçar seriamente a posição da Senhora Clinton na convenção dos Democratas, caramba! Impensável, mas é! O radicalismo tem dois lados: o de direita puxa o de esquerda
São escassas, naturalmente, suas probabilidades de êxito final. Mas a sua existência, o seu vigor e o seu significado têm o brilho de uma estrela nova no horizonte. E se a potência capitalista absoluta, dominadora, imperialista, cínica, pendesse para essa inclinação nova, levando o mercado de negócios a respeitar e conviver com políticas éticas de busca da justiça e da felicidade, retomando algo da força idealista dos fundadores da democracia?
Oh, o que seria do mundo?!..
Bem, o próximo domingo é de carnaval, tempo de fantasia. Vamos respirar e esperar.
Créditos da foto: Tiffany Von Arnim / Flickr
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