Pepe Escobar: Visão da China para 2020


Traduzido por Vila Vudu

Todo mundo está indo de Shisanwu. Quer dizer, centenas de milhões de chineses, pelo menos, sim, estão.
China's Five-Year Plan popularized by bizarre cartoon
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Podem ver aqui a versão pop; chamem de versão do plano quinquenal chinês para idiotas [orig. for dummies]. Qualquer um pode até cantar junto, enquanto dá tratos à bola sobre como pôr abaixo o mapa do caminho para o desenvolvimento econômico e social da China para 2016-2020.
People’s Daily disse que o 13º plano quinquenal trata principalmente de crescimento econômico, reformas institucionais, meio ambiente e redução da pobreza. O que não diz é que é mapa do caminho tipo vai-ou-racha, para que a China escape da temida armadilha da renda média.
O primeiro traço fulgurante do Shisanwu é a consagração do já famoso “novo normal” do presidente Xi Jinping – com a economia chinesa entrando em padrão de crescimento mais lento, sustentável; 6,5% de crescimento anual, ainda deslumbrante, embora abaixo dos 7% atuais. O premiê Li Keqiang destacou que a China tem de crescer 6,5% ao ano, nos próximos cinco anos, para conseguir tornar-se sociedade “moderadamente próspera“.

O professor Zhao Xijun da Universidade Renmin de Pequim, explica tudo, logo: “O timingdo 13º plano quinquenal é crucial, porque em 2020, a China deverá ter cumprido a meta do primeiro centenário, no 100º aniversário da fundação do Partido [1921], completando a construção de uma sociedade moderadamente próspera.”
Mas… e como se tem de cumprir essa tarefa sobre-humana? Essencialmente, com Pequim mudando o foco, da manufatura intensiva em mão de obra com vistas à exportação, base do modelo até o presente, para uma economia de serviços/consumo, com papel chave reservado também para uma agricultura modernizada.
Todos na Ásia sabem como as empresas chinesas de manufatura vêm perdendo regularmente aquela famosa “margem competitiva” [orig. “competitive edge”], com custos do trabalho e da terra subindo sempre, especialmente nas regiões litorâneas do leste. Assim, o “novo normal” de Xi implica processo complexo de transferir empregos, da manufatura para o setor de serviços. Isso também implica aumentar a inovação na tecnologia, indústria, design e na gestão empresarial, na China.
Conheçam o Matador de Zumbis
O plano quinquenal tem de ser visto como relíquia da economia de estilo soviético na China. O primeiro plano quinquenal foi de fato redigido em 1953, cópia direta da URSS. Mas os conservadores do Partido Comunista da China (PCC) insistem em que se mantenha forte controle pelo estado, dados os notórios desastres do mercado ocidental, como se viram na crise financeira de 2008 induzida pelas hipotecas podres [orig. sub-prime].
O plano agora proposto tem coisa de 100 páginas; lista as principais metas políticas e muitos, muitos alvos importantes, relacionados a crescimento econômico, exportações, investimento externo direto e criação de empregos. Virtualmente, todos os principais ministérios e agências, além dos governos provinciais, regionais e municipais, contribuem para o texto que se divulga agora.
Com as linhas gerais publicadas pelo Conselho de Estado, os planejadores dos ministérios e agências do governo central, bem como os governos regionais, trabalharão para conceber e traçar todos os detalhes. O plano então será debatido na sessão anual do Congresso Nacional do Povo, na primavera de 2016.
Xi – renovado depois de seu recente, espetacular tour de force pelo antigo Império Britânico – trabalhou muito para promover e expandir o mapa do caminho. De maio a julho, reuniu-se com os líderes do PCC de metade das 31 províncias da China, muito antes de a crise do mercado de ações e de crescimento do PIB chinês ter despencado abaixo de 7% pela primeira vez desde 2009.
Essa semana, líderes do PCC passaram horas revisando o texto do plano no Jingxi Hotel na zona oeste de Pequim, como parte do 5º Pleno do PCC, realizado a portas fechadas.
Todos eles, é claro, conhecem bem o homem que vem com o plano: Liu He, um dos principais conselheiros econômicos de Xi, formado em economia industrial pela Universidade Renmin, pós-graduado em administração pública por Harvard.
Liu He também é vice-diretor da Comissão para Desenvolvimento Nacional e Reforma, a todo-poderosa agência que cria políticas para o desenvolvimento econômico e social da China.
E Liu He é a cereja do bolo: é o Matador de Zumbis.
Matador de Zumbis “, em contexto pop chinês, significa alguém que quer fechar ‘por bem’ as empresas de fachada conhecidas como empresas zumbis.
Assim, Liu He é homem que muitos amam odiar, porque muitas das zumbis são poderosamente conectadas a empresas que pertencem ao Estado [ing. state-owned companies (SOEs)]. Governos locais recusam-se a fechar as tais zumbis, porque temem uma explosão de empréstimos podres; aumento no desemprego; e queda violenta nas respectivas arrecadações locais.
No plano público, Liu He é totalmente pragmático; insiste em que a China precisa de “reformas orientadas para o mercado, foco gerencial mais ativo sobre a oferta, esforços cada vez mais intensos para fechar as empresas zumbis e o fim da superoferta.” Mas esse ajuste estrutural tem de ser gradual; o PCC teme mortalmente o desemprego e a instabilidade social [como, aliás, também a Casa Branca (NTs)].
Como se não bastasse o caso com as empresas zumbis, Liu também é diretor do Escritório Geral do Grupo Central para Questões Financeiras e Econômicas, principal corpo gerador de políticas econômicas da China, cujo presidente é – e quem mais poderia ser? – Xi.
Liu He foi ator importante para a aprovação do pacote chinês de estímulos, de 4 trilhões de yuans, em 2009, que foi o contragolpe que Pequim usou contra a crise financeira global de 2008 provocada por Wall Street.
É ele, pois, o homem com quem conversar para todas as políticas econômicas e a rapidez com que devem avançar. Mas destacados economistas chineses dizem que tudo que se relacione a política e governança hardcore das empresas de propriedade do Estado sempre será conduzido pelos grandões do PCC, se não por Xi em pessoa.
‘Bora microgerenciar a coisa toda
Tudo sempre volta àqueles ainda deslumbrantes 6,5% de crescimento anual do PIB. Segundo o China Finance 40 Forum, Pequim deve orientar-se por um quadro de “banda de controle”, com limite superior do PIB definido pela inflação, e limite inferior definido pelo desemprego.
Acima disso tudo, Pequim ainda tem de microgerenciar pelo menos três variáveis cruciais: o excesso de capacidade industrial do país; “correções” que afetam o mercado da propriedade; e empresas altamente endividadas.
Mas no momento, tudo tem a ver com o sonho chinês. O premiês Li Keqiang disse que a meta de Pequim é, nada menos, que dobrar o PIB per capita até 2020, comparado ao de 2010, para assim criar “uma sociedade próspera em geral” [orig. “all-around prosperous society“]. Com empurrão extra, o alvo pode ser fixado em cerca de 7% em 2016 e 2017 para “estimular a confiança”.
E tratando-se de China governada pelo PCC, onde tudo é planejado, lá está a lista das tarefas que cabem a Pequim – acompanhada de zilhões de mecanismos para cuidar que nenhum dos encarregados diretos meta os pés pelas mãos. E assim será. Bárbaros do mundo, abram o olho: 2020 está aí, virando a esquina.
Pepe Escobar (1954) é jornalista, brasileiro, vive em São Paulo, Hong Kong e Paris, mas publica exclusivamente em inglês. Mantém coluna no Asia Times Online; é também analista de política de blogs e sites como:  Sputinik, Tom Dispatch, Information Clearing House, Red Voltaire e outros; é correspondente/ articulista das redes Russia Today e Al-Jazeera.

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