Eleições em Portugal: O voto só é útil se contribuir para mudar

Mudar o quê? Mudar a natureza do poder, rejeitando o governo ao serviço duns poucos: dos que detêm o capital financeiro e dos que mandam no país, na Europa e no Mundo... 

Por Francisco Liberato Fernandes - ESQUERDA.NET - 03/10/2015

 Votar hoje no Bloco de Esquerda é votar numa oposição consequente a estes governos
Votar hoje no Bloco de Esquerda é votar numa oposição consequente a estes governos
1 – Fruto dum engenhoso processo de manipulação da opinião pública os eleitores portugueses estão mais uma vez colocados perante um falso dilema: votar, para manter este governo que tem realizado uma violenta política de austeridade, ou votar para fazer regressar ao poder o partido socialista que, nos quarenta anos de democracia tem, alternado (ou partilhado) o poder com os atuais partidos da coligação1, sem de que, de tal alternância represente qualquer mudança significativa nos modelos de governação e de desenvolvimento.
2 –O traço fundamental que separa a esquerda da direita é a posição relativamente à posse da riqueza, e à forma de distribuição do produto do trabalho. Avalia-se a coerência de esquerda, atualmente, através da posição de cada um dos partidos relativamente ao capitalismo e aos mercados: a esquerda opõe-se ao sistema capitalista que, hoje, é cada vez menos nacional e, mais transnacional. A esquerda opõe-se a que sejam os mercados a dirigir a política. A esquerda assume-se com um programa e uma política social, que pressupõe a apropriação pública de meios de produção e dos serviços fundamentais2, de forma a assegurar condições de bem estar para a totalidade da população, assim como a redução das desigualdades no acesso à propriedade, e à distribuição da riqueza, enquanto produto do trabalho humano coletivo.
3 -Como é verificável através da história recente (e passada), o PS vive do embuste. Não tem, nunca teve na sociedade portuguesa, um programa socialista. Nos 40 anos de democracia, sempre que os mercados financeiros precisaram de “mão forte” para evitar perder o controle de setores de negócios do país, ou para recuperar tais negócios, o PS assumiu funções de governo em cogestão: foi assim na primeira e na segunda crises financeiras, durante as quais Portugal esteve sob resgate (em 1978 e 1983), no primeiro dos casos formou governo com o CDS e, no segundo, liderou governo do bloco central (PS / PSD).
O PS português não chegou a ter papel significativo nem na luta contra a ditadura, nem na luta contra a guerra colonial. Hoje, não desempenha qualquer papel na luta contra o capitalismo global, selvagem, responsável pelas situações de brutal desigualdade que se agravam na Europa e no mundo, situações essas que estão na origem da atual “guerra quente”, envolvendo a Europa e que substituiu a “guerra fria”.
4 -Não existem razões para a abstenção nas eleições de 4 de Outubro. Apresentam-se a sufrágio partidos que cobrem todo o espectro político. Alguns dos concorrentes representam movimentos, e interesses sociais concretos, que não se reveem nas diferentes alternativas; outros, nasceram de cisões nos partidos com representação parlamentar.
Nascidos em tempos diferentes, e com história e cultura política diferentes, tanto o PCP como o BE, são portadores de programas de luta anticapitalista, e apresentam projetos contra o atual governo da coligação ao serviço dos mercados, que tem sede em Bruxelas. Quem vota em qualquer um dos partidos com história na luta contra o capitalismo não se engana e, com o seu voto, contribui para dar força a um movimento de mudança em Portugal e a um modelo diferente de governança, e de desenvolvimento.
5 -O Bloco de Esquerda, produto de sucessivos processos de união de agrupamentos que se constituíram contra a ditadura e a guerra colonial, tem sabido renovar-se sem perder identidade e raízes. Seria ótimo que BE e PCP tivessem conseguido estabelecer acordo eleitoral que ajudasse a afirmar-se como alternativa de poder a curto prazo. Não tendo acontecido esse acordo, a minha opção é Bloco de Esquerda.
6 -A emancipação da classe trabalhadora e dos povos é difícil. Longo é o caminho a percorrer e faz-se, caminhando. Votar hoje no Bloco de Esquerda é votar numa oposição consequente a estes governos. É fazer crescer uma voz na luta contra o desemprego e o emprego precário. Contribui para fazer crescer um movimento contra um sistema de castas, que vive na opulência à custa da opressão e exploração do trabalho.
A luta conduzida em Portugal converge com a luta dos povos da Europa e do mundo contra a barbaridade do capital financeiro que assumiu já, em muitos locais, o caráter de guerra contra a humanidade3, sobre a qual não podemos ficar indiferentes!
Ponta Delgada, 28 de Setembro 2015
Artigo de Francisco Liberato Fernandespublicado em Correio dos Açores

1 Nos 40 anos de democracia o PS governou, sozinho ou coligado, durante quase 20 anos. O governo nos Açores foi exercido, praticamente em partes iguais, ora pelo PSD, ora pelo PS.
2 Há uma enorme confusão entre o essencial e o acessório no que diz respeito ao domínio do Estado: o controle dos recursos fundamentais e serviços estratégicos relacionados com a gestão do território devem ser geridos pelo Estado. Igual situação deve ocorrer em tudo o que tem a ver com segurança, soberania, justiça.
3 Desde 1945 não temos vivido em paz. Apenas os confrontos entre potências deixaram de ser diretos e deslocalizaram-se em consequência do aparecimento das bombas atómicas. Assiste-se hoje ao agudizar de um conflito entre potências, que em muito se assemelha à situação ocorrida na Europa em vésperas da segunda guerra mundial.

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