Cultura Inútil: Crianças, melhor não tê-las?

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Blog do Boitempo - Por Mouzar Benedito.- 12/10/2015

* Título inspirado no “Poema Enjoadinho”, de Vinícius de Moraes, que começa assim:
Filhos… Filhos?
Melhor não tê-los.
Mas se não os temos,
Como sabê-lo?
Colecionei frases sobre crianças, ditas por filósofos, educadores, escritores (principalmente poetas) mães e pais… São anjos às vezes incompreendidos. Bem, nem sempre. Vou apresentar parte delas, e também ditados populares.
Mas antes de apresentá-las, algumas considerações e também umas historinhas de espertezas infantis…
Quando ouço algum adulto falando que criança não tem maldade ou que não mente, não sei se ele é hipócrita ou desmemoriado. Não se lembra ou finge não lembrar da sua própria infância. Moleque, às vezes, mente e manipula adultos.

Já vi crianças com uns três anos de idade cometendo as maiores maldades, mentindo, manipulando os pais (principalmente as mães) com uma categoria impressionante.
É claro que nisso tudo, da manipulação e da mentira, tem essa coisa dos adultos acreditarem que criança é um ser totalmente puro e ingênuo. Crianças podem ser isso, sim, mas às vezes podem ser também mentirosas e um tanto malvadinhas. Lembro-me de um menino de três anos que acabava de “ganhar” uma irmãzinha e que ficava de costas para o berço, com as mãos para trás, beliscando o bebê, que chorava, chorava, e os pais não sabiam o motivo. Eu dei um flagra nele fazendo isso e murmurei: “Que canalhinha!”.
Um outro, de quatro anos, falou ao pai que viu um amigo dele de mãos dadas com a mãe andando pela rua. Pura mentira, pois eu estava junto com esse amigo e a mãe do monstrinho, que insinuava um caso entre a própria mãe e o amigo do pai. Quase deu separação.
Mas isso tudo é natural, faz parte da natureza humana. Só é preciso entender, não fingir que estamos tratando com anjos.
Não estou querendo demonizar as crianças, só mexer um pouco com os adultos que as divinizam. E torço para que quando adultos elas se lembrem das crianças que foram, e que entendam isso. Mas de qualquer forma, a quase totalidade das frases que se fazem sobre crianças são enaltecedoras, e quando acham “defeitos” nelas, culpam os adultos e a educação pelos “defeitos” que elas possam ter. E não falta quem lembre que elas são o futuro. O mundo será delas.
Aliás, lembro que Monteiro Lobato, dizia ter começado a escrever para crianças porque achava que os adultos não tinham mais jeito. Concordo em parte. Vejo, por exemplo, que muitas crianças estão se interessando por questões ambientais, e mudam não só seu comportamento como questionam e reivindicam mudanças dos próprios pais e de outros adultos. Quem sabe as crianças de hoje cresçam coerentes e revertam muitas porcarias feitas pelos adultos de hoje e de ontem.
Espertezas infantis
Há muitas historinhas infantis bem divertidas. Conto aqui algumas que mostram espertezas e outras qualidades infantis. Inclusive um lado meio safado.
1.
Meu sobrinho Hilmar, quando tinha quatro ou cinco anos de idade e morava em São Sebastião do Paraíso. Ele surpreendia os que lhe perguntavam o clássico “o que você quer ser quando crescer?”, com uma resposta bem objetiva:
— Aposentado.
2.
Em São Paulo, no Jardim Nordeste, tem uma do Tiago, com 5 anos de idade na época.
Um dia, fui visitar a Elza e o marido dela, Mário, e o Tiago estava lá. Era sobrinho deles. Uma hora depois, acabou a cerveja que bebíamos. Peguei uma sacola com vasilhames e fui buscar mais numa padaria que ficava a uns quinhentos metros de distância. O Tiago resolveu ir comigo. Fomos conversando e ele disse:
— Lá em casa a gente não bebe cerveja não. Nós bebemos só pinga, mas tem que ser pinga bem ruim. Quando é boa a gente põe limão pra ficar ruim.
Falei pra ele:
— Então eu vou comprar uma pinga bem ruim pra você.
Ele, espertamente, respondeu:
— Ah… Hoje eu vou tomar guaraná mesmo.
3.
De um carioquinha cujo nome eu não sei, lembro-me de uma pergunta que fez, com ar muito pensativo:
— Gente grande é assim, né?
— Assim como? — perguntou alguém.
— Assim…
— Como, assim?
— Uai, gente pequena não é anão?
4.
Em Brasília, o Thomas tinha uns três anos de idade e ficava observando a minha barba. Estávamos na casa do Luiz Mineiro, no Lago Norte, bebendo umas e pulando na piscina. Curioso, perguntou porque eu tinha isso. Falei o que sempre falava com as crianças:
— É porque eu passo cocô de galinha no rosto, aí a barba cresce. O seu pai só passa cocô de galinha em cima da boca, por isso só tem o bigode.
Ele olhou pra minha careca e perguntou:
— E por que você não passa aí?
5.
Um menino olhava a tia se maquiando e perguntou, curioso:
— Por que você faz isso?
Ela respondeu:
— Pra ficar bonita.
E ele:
— E por que não fica?
6.
Estávamos em uma cidadezinha do Triângulo Mineiro… Meu irmão Vicente, a namorada dele, uma morena toda charmosa, e eu.
Silas, meu sobrinho de uns quatro anos, começou a falar que estava com vontade de comer enroladinho, mas queria que alguém fosse com ele até a lanchonete. Fui. No caminho, passou uma menininha do tamanho dele, toda bonitinha, rebolando, e eu perguntei a ele:
— Quando você vê uma menininha dessas, não fica com vontade de tascar um beijo nela? Mas um beijão na boca, chupado…
Ele respondeu meio vermelho:
— Eu tenho vontade de dar um desses é na mulher do Vicente.
— E por que não dá?
— Ele dana comigo…
7.
Em São Paulo, meu amigo Manetti tinha um filho de cinco anos, o Gregório, e o levou a uma médica pediatra. Só havia menininhas na sala de espera. Todas elas levadas por mães. E lá estava o Manetti com o filho no meio da mulherada e meninada, esperando atendimento. De repente, o Gregório pulou da cadeira, foi até uma menininha, baixou o calção e mostrou o pintinho pra ela. Todo mundo ficou pasmo e sem ação. A menininha falou:
— Pipi…
Ele respondeu.
— Pipi não… Jeba!
E depois foi de uma em uma menininha com o calção abaixado, mostrando o pintinho e falando “jeba”. Todas as mulheres olhavam feio pro Manetti, que não sabia o que fazer. Quem terá ensinado essa safadeza ao Gregório? Não olhem para mim!
8.
O Joãozinho, meu conterrâneo, aos dez anos de idade, tinha uma irmã bonita e namoradeira. Tascamos nele o apelido de “Cunhado dos Outros”.
9.
O Olímpio, com uns 11 anos de idade, foi ser caixeiro (epa!, esta palavra caiu em desuso, foi substituída por balconista) numa loja de Nova Resende. Um dia resolveu repetir no balcão uma piada que tinha ouvido. Uma moça queria comprar uma camisola para a noite de núpcias, ele disse que não tinha, mas lhe ofereceu um cachecol. Ela achou estranho:
— O que tem a ver cachecol com camisola?
— Ora, vai passar a noite inteira no pescoço mesmo…
10.
Não era só eu que fazia isso, mas confesso que fazia, quando eu tinha sete ou oito anos de idade. Minhas calças sempre tinham um bolso furado, o esquerdo. De vez em quando, punha o pintinho nesse furo do bolso e chegava chupando bala perto de alguma menininha. Quase sempre as meninas caíam na safadeza da gente. A menina em questão via aquela cara de prazer e pedia uma bala. Eu mostrava a mão melecada ou suja de barro e falava:
— A minha mão tá suja, pega no meu bolso.
Ela enfiava a mão e pegava… E ficava vermelha!
Quando a menininha era algum desafeto, pra sacanear mais eu gritava pras outras ouvirem:
— Ela pegou no meu pinto! Ela pegou no meu pinto!
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Agora, as frases e os ditados
Mário Quintana: “Quando guri, eu tinha de me calar à mesa: só os grandes falavam. Agora, depois de adulto, tenho de ficar calado para as crianças falarem”.
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Simone de Beauvoir: “O que é um adulto? Uma criança de idade”.
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Jean Paul Sartre: “Eu era uma criança, esse monstro que os adultos fabricam com suas mágoas”.
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Sartre, de novo: “A família é como a varíola: a gente tem quando criança, e fica marcado”.
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Nelson Mandela: “Não existe revelação mais nítida da alma de uma sociedade do que a forma como esta trata as suas crianças”.
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Maiakovski: “Se a criança é um porquinho, quando adulto não poderá ser outra coisa senão um porco”.
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Nietzsche: “O homem chega à sua maturidade quando encara a vida com a mesma seriedade que uma criança encara uma brincadeira”.
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Júlio Machado: “O coração das crianças tem o seu movimento regulado como o de um relógio, e para, quando a mão de uma mãe se esquece de lhe dar corda”.
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Millôr Fernandes: “Criança é esse ser infeliz que os pais põem para dormir quando ainda está cheio de animação e arrancam da cama quando ainda está estremunhado de sono”.
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Félix Pacheco: “Quem não ama, e é sozinho e sem crianças, não tem consolações nem esperanças”.
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O povo (ditado popular): “A quem Deus não deu filhos, deu o diabo sobrinhos”.
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O povo, de novo: “Filho de pobre não nasce, aparece”.
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Oscar Wilde: “A melhor maneira de tornar as crianças boas é torná-las felizes”.
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Oscar Wilde, de novo: “A infância não mais do que um longo percurso de inocente escuta às portas para se ouvir o que se devia ignorar”.
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Eu: “Qualquer adulto que participar de uma festinha infantil, com aquelas criancinhas alegrinhas e seus gritinhos estridentes, corre o risco de achar que Herodes não estava tão errado assim…”.
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José Saramago: “Tentei não fazer nada na vida que envergonhasse a criança que fui”.
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Denis Diderot: “A criança como o homem, e o homem como a criança, prefere divertir-se a instruir-se”.
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Voltaire: “Sufoca-se o espírito da criança com conhecimentos inúteis”.
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Franz Kafka: “Toda a educação assenta nestes dois princípios: primeiro repelir o assalto fogoso das crianças ignorantes à verdade e depois iniciar as crianças humilhadas na mentira, de modo insensível e progressivo”.
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Pitágoras: Educai as crianças para que não seja necessário punir os adultos”..
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Platão: “Não eduques as crianças nas várias disciplinas recorrendo à força, mas como se fosse um jogo, para que também possas observar melhor qual a disposição natural de cada um”.
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Platão, de novo: “Os filhos dos homens, dentre todos os animais jovens, são os mais difíceis de serem tratados”.
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Coelho Neto: “É na educação dos filhos que ser revelam as virtudes dos pais”.
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Textos judaicos: “Nunca ameace uma criança: castigue-a ou perdoe-a”.
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Alcorão: “As crianças são o ornamento da vida neste mundo”.
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O povo (ditado popular): “Menino bom não se cria”.
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O povo, novamente: “Menino e sino, só com pancada”.
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Carmem Sylva: “Um lar sem filho é um sino sem badalo”.
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Benjamin Franklin: “O menino que sofre e se indigne diante dos maus tratos infligidos aos animais, será bom e generoso com os homens”.
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Saint-Exupéry: “As crianças têm que ter muita paciência com os adultos”.
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Saint-Exupéry, de novo: “Todas as grandes personagens começaram por serem crianças, mas poucas se recordam disso”.
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Pablo Picasso: “Toda criança é um artista. O problema é o como manter-se artista depois de crescido”.
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Jean de La Bruyère: “As crianças não têm passado, nem futuro, e coisa que nunca nos acontece, gozam o presente”.
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Camilo Castelo Branco: “A infância é a estação das crenças, dos temores e das superstições”.
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Camilo Castelo Branco, de novo: “A infância é como a água que desce da bica, e nunca mais sobe”.
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Agustina Bessa-Luís: “A criança que é despojada da sua riqueza de convivencialidade incrementa a frustração do adulto de amanhã”
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Giacomo Leopardi: “As crianças acham tudo em nada, os homens não acham nada em tudo”.
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Taylor: “Uma criança mimada nunca ama a sua mãe”.
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São Marcos: “Queria voltar a ser criança, porque os joelhos ralados curam bem mais rápido que os corações partidos”.
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C. Siqueira: “Quando você é criança, você é tão ingênuo a ponto de achar que ser adulto é uma coisa legal”.
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Cesare Pavese: “Existe algo mais triste do que envelhecer: permanecer criança”.
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Amy Winehouse: “Não dou ouvidos a ninguém… exceto à minha criança interior”.
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Paulo Leminski: “Nesta vida, pode-se aprender três coisas de uma criança: estar sempre alegre, nunca ficar inativo e chorar com força por duto o que se quer”.
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O povo (ditado popular): “É de pequenino que se torce o pepino”.
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Joaquim Nabuco: “O traço todo da vida é para muitos um desenho da criança esquecida pelo homem e ao qual este terá sempre de se cingir sem o saber”.
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Monteiro Lobato: “Ainda acabo fazendo livros onde as nossas crianças possam morar”.
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Josh Billings: “Guie uma criança pelo caminho que ela deve seguir e guie-se por ela de vez em quando”.
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Stephen King: “A criança nunca sabe o que é um martelo, até confundir o dedo com um prego”.
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Eu: “No dia da criança, comemorei usando camisinha… e evitei que viesse mais uma”.
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Immanuel Kant: “É por isso que mandam as crianças à escola: não tanto para que aprendam alguma coisa, mas para que se habituem a estar calmas e sentadas e a cumprir escrupulosamente o que se lhes ordena, de modo que depois não pensem mesmo que têm de pôr em prática as suas ideias”.
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Jesus Cristo (no Evangelho segundo São Mateus): “Deixai vir e a mim as criancinhas, porque delas é o Reino dos Céus”.
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Um anônimo safado: “Vinde a mim as criancinhas, que mais atrás vêm as mamãezinhas”.
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Barão de Itararé: “A criança arteira enche de alegria uma casa; enche também os pais de preocupação; enche de satisfação os amiguinhos; enfim a criança enche, enche…”
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Eu:
“Coisas da vida, irmão.
Seio pra criança é comida.
Pra adulto é diversão”.
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Mouzar Benedito, jornalista, nasceu em Nova Resende (MG) em 1946, o quinto entre dez filhos de um barbeiro. Trabalhou em vários jornais alternativos (Versus, Pasquim, Em Tempo, Movimento, Jornal dos Bairros – MG, Brasil Mulher). Estudou Geografia na USP e Jornalismo na Cásper Líbero, em São Paulo. É autor de muitos livros, dentre os quais, publicados pela Boitempo,Ousar Lutar (2000), em co-autoria com José Roberto Rezende, Pequena enciclopédia sanitária (1996) e Meneghetti – O gato dos telhados (2010, Coleção Pauliceia). Colabora com o Blog da Boitempo quinzenalmente, às terças. 




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