Quando soma e subtração na economia são para dividir, não multiplicar

A produção mundial não soma nem se multiplica, aprofunda a subtração. O mercado financeiro não subtrai, mas se multiplica, com rendimentos menores ou não.

José Carlos Peliano* - Carta Maior
Geralt / Pixabay
A gente aprende na escola desde pequenos que a soma aumenta a quantidade ou o valor e a subtração em sentido contrário reduz. Que a divisão é como uma subtração acelerada ao reduzir mais ainda a quantidade e o valor e a multiplicação como uma soma empolgada que dá saltos para frente e para cima para aumentar.
 
Em nossos bolsos e saldos bancários já passamos por momentos de soma e subtração que nos fez passar da conta ou apertar os cintos. Multiplicação e divisão são momentos mais raros, mas se não passamos por eles já vimos ou soubemos quem estava por lá.
 
Na vida de cada um sabe-se o que é melhor e o que convém. Uns poupam para terem quando precisarem, outros gastam e não se preocupam com o amanhã. Aqueles apertam-se e esses não estão nem aí. Ainda há muitos que se apertam o tempo todo porque não ganham o bastante para sobreviverem.

 
Na economia como um todo, do mesmo modo há poupadores e gastadores. Eles continuam usando de seus bolsos e contas do jeito que acham melhor e, assim, vão levando suas vidas, bem como suas poupanças e dívidas.
 
Só que o administrador central dessa economia deve cuidar para que o conjunto das atividades produtivas somem mais que subtraiam e, de preferência, multipliquem-nas mais que dividam-nas.
 
Por que? Porque se deixar a corda e a coisa soltas, a vaca pode ir para o brejo. Numa fase de crise, por exemplo, os produtores podem deixar de fabricar e vender, os compradores podem parar de comprar ou por temor de perder ou por não terem mesmo com o que comprar.
 
É fácil ilustrar o comportamento das pessoas e da economia simplesmente pensando e escrevendo sobre elas. Como este texto aqui. Na realidade, administrar uma economia não é fácil, como sabemos por experiências próprias diante de nossos compromissos mensais a serem cumpridos.
 
Na economia o administrador depara-se não só com os bolsos e contas do governo, mas também com os bolsos e contas dos demais da população. Ou deveria se deparar! A pressão dos grupos sobre o orçamento, as políticas públicas, os direitos e deveres, os benefícios e vantagens, enfim, torna o dia a dia do administrador uma verdadeira panela de pressão.
 
De qualquer maneira, porém, o administrador conta com a colaboração de auxiliares que o ajudam a poder dar conta do recado. Conselho se fosse bom seria comprado, embora se saiba que, no final das contas, quem decide segue ou não o conselho, sendo dele, portanto, a decisão e a responsabilidade.
 
A administração da economia deve se orientar por somar mais que subtrair e multiplicar, quando puder, evitando pensar em dividir – não no sentido redistributivo, de repartir melhor a renda entre indivíduos e setores, mas no sentido de perda de produção e capacidade produtiva.
 
No mundo de hoje, o principal problema é a administração da crise econômica. Como fazer com que o país não perca produção e emprego, mantendo-os ambos em níveis satisfatórios a fim de não gerar movimentos individuais ou de setores que formem uma bola de neve, provocando perda de expectativas, investimentos e força produtiva.
 
A China, protagonista mundial, cresce atualmente mais devagar tanto na manufatura, quanto nos investimentos e exportações. Reduz também a compra de matérias primas e bens de luxo, o que provoca uma queda nos preços, principalmente de petróleo, carvão, metais, ferro e comida dos países emergentes e de carros de luxo, produtos de tecnologia de ponta do Japão e Europa.
 
Enquanto isto, os EUA vem devagar também desde a crise de 2009, crescendo hoje ao redor de 2% a.a., mas com a manufatura dando sinais de cansaço. Na Europa apenas a Alemanha consegue manter um taxa baixa de crescimento, enquanto os demais países se arrastam, estando Grécia e Finlândia em situações piores. Por fim, o Japão ainda não conseguiu manter um crescimento firme e estável.
 
A única mercadoria que consegue superar a barreira das demais é o dólar. Como o cenário produtivo no exterior não está promissor, os especuladores e investidores correm a comprar a moeda americana, que serve de reserva internacional de valor.
 
A corrida ao dólar desvaloriza as demais moedas acentuando a já difícil situação econômica dos países, especialmente os emergentes, entre eles o Brasil. Penaliza também as grandes empresas e grupos econômicos que levantaram créditos em dólares para obterem rendas em moedas nacionais e agora estão com dívidas maiores e rendimentos menores.
 
Esse movimento em direção ao dólar, embora seja natural na economia capitalista mundial, não é novidade. Já ocorre há tempos e demonstra uma conta de subtração e divisão preocupante. Os recursos estão sendo aplicados proporcionalmente mais no mercado financeiro do que na esfera produtiva. Há um corte substancial separando a mercadoria dinheiro das demais.
 
Este corte prejudica e dificulta a retomada do crescimento no mundo e no Brasil. Ainda mais porque as políticas de ajuste dominantes estão sob o corte da austeridade. Ao invés de fomentar o investimento produtivo, as medidas tomadas fazem-no retrair para rumar em direção a compra da moeda americana seja em espécie, seja em títulos nela referenciados.
 
O quadro final é desalentador. Setores produtivos em retração e dívidas de empresas e de governos em alta. Desemprego a caminho, quedas nas vendas e inadimplência. Mas o mercado financeiro mantendo vigor. A decisão recente do banco central americano de aumentar a taxa interna de juros, há tempos mantida bem baixa, vai piorar mais ainda o quadro econômico mundial.
 
A produção mundial não soma nem se multiplica, aprofunda a subtração. O mercado financeiro não subtrai, mas soma e se multiplica, com rendimentos menores ou não. O capital financeiro está supervalorizado em relação ao produtivo, menos valorizado.
 
Se o capital financeiro não for expurgado, eliminando as especulações, ganhos predatórios de ocasião e programas de estabilização suicidas patrocinados pelas instituições multilaterais, a economia mundial tenderá a aprofundar a retração. Com todos os males e pesares daí decorrentes.
 
Michael Kalecki, economista polonês, advertiu que os capitalistas só são solidários no crescimento, fora dele são predadores. Ou eles então criam vergonha para não se afundarem e ao mundo muito mais, ou o longo prazo será sofrido, predatório e longo mesmo.
 
*colaborador da Carta Maior



Créditos da foto: Geralt / Pixabay

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