Leandro Farias: E agora, cara pálida?

O que o financiamento empresarial de campanha tem a ver com as infrações cometidas pelos planos de saúde? Tudo. É só ver o quanto contribuíram nas eleições

Por Leandro Farias - 24/09/2015 - na Carta MaiorFabio Rodrigues Pozzebom / Agência Brasil
No último dia 10 de setembro, circulou pela grande mídia a notícia de que a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) condenou a empresa Unimed em primeira e segunda instância a pagar uma multa na quantia de R$ 110.000,00 (cento e dez mil reais), por conta do óbito da farmacêutica Ana Carolina Cassino, 23 anos, que esperou 28 horas por uma cirurgia de apendicite dentro do Hospital da empresa localizado na Barra da Tijuca, Rio de Janeiro. Devido a espera adquiriu infecção generalizada e morreu aos 23 anos.



De acordo com a ANS, a Unimed infringiu os artigos 7º, 10 e 79 da Resolução Normativa (RN) Nº 124/2006, e 35-C da Lei que dispõe sobre os planos e seguros privados de assistência à saúde (9656/98). Os artigos tratam da obrigatoriedade da cobertura de atendimento em casos de urgência e emergência e que implicam em risco imediato de vida. Apesar do valor da multa ser um dos mais elevados de acordo com a legislação da agência, a decisão foi criticada por boa parte da população, alegando que tal valor é “vergonhoso” frente ao lucro da empresa somado ao fato de se tratar de uma vida perdida.



O número de reclamações na ANS contra os planos de saúde cresce de maneira exponencial, e segundo informações da agência, entre março e junho deste ano foram notificadas mais de 21 mil reclamações. Porém uma pequena parte dessas reclamações são de fato revertidas em multas, e que não são pagas pelas empresas gerando um acúmulo no valor da dívida ativa com a União. Somando as multas aplicadas e o ressarcimento ao Sistema Único de Saúde (SUS), os planos devem mais de R$ 500 milhões aos cofres públicos.


Infelizmente sabemos que o financiamento empresarial de campanha é uma realidade, e que corre o sério risco de ser regulamentado pelo Congresso Nacional, mesmo que tenha sido surpreendentemente rejeitada pelo Senado, e o Supremo Tribunal Federal (STF) ter julgado procedente a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) Nº4.650, movida pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), proibindo o financiamento empresarial de campanha, no início desse mês, após o ministro Gilmar Mendes, ter pedido vista, por mais de um ano, e ter impedido o julgamento desta ação de 2011. Tal regulamentação se deve ao fato de termos a Câmara dos Deputados presidida por um parlamentar que recebeu milhões em sua campanha eleitoral, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), e que notoriamente defende os interesses dos empresários que o financiaram. As propostas que tratam do financiamento empresarial foram aprovadas na Câmara através de textos incluídos pelos deputados Celso Russomano (PRB-SP) e Rodrigo Maia (DEM-RJ).


Mas afinal, o que o financiamento empresarial de campanha tem a ver com as infrações cometidas pelos planos de saúde e a ANS? Pois bem, na última eleição (2014) os planos de saúde doaram em torno de R$ 52 milhões, contribuindo para a candidatura de 131 parlamentares, um deles Eduardo Cunha, e que a agência que deveria regular e fiscalizar os planos de saúde tem sua diretoria composta por representantes dos empresários da saúde, uma vez que a nomeação ocorre por indicação política, e que rotineiramente observamos parlamentares criando PECs, MPs e PLs que visam beneficiar o lucro e o crescimento vertiginoso dessas empresas, tendo como contraponto um SUS atrofiado e sucateado, além de pressionar a favor do perdão da dívida que estes tem frente a União por conta de infrações cometidas, como a que culminou no óbito da jovem Ana Carolina.


Então, para os críticos do valor da multa aplicada pela ANS frente ao caso que envolveu a Unimed. Na atual conjuntura de crise onde observamos um Executivo corrompido, um Legislativo financiado e um Judiciário sem credibilidade, e partindo das informações citadas acima e de uma história verídica, cabe a nós como sociedade tomarmos “as rédeas da situação”, através de mobilizações em conjunto visando um novo modelo de Estado, de maneira a beneficiar o coletivo e não apenas a classe dominante. Talvez a solução esteja em uma maior participação social na tomada de decisões, nas lutas contra o financiamento empresarial de campanha e em defesa de uma saúde pública de qualidade e contra a visão mercantil desta. Chega de descaso.












Créditos da foto: Fabio Rodrigues Pozzebom / Agência Brasil

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