Fernando Brito: Previsão de Levy sobre volta do crescimento depende de que ele próprio mude

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De volta da Turquia, o Ministro da Fazenda, Joaquim Levy, deu uma declaração que só não será desprovida de realidade se ele próprio mudar sua atitude.

“A recuperação brasileira é uma questão de meses. A presidente e o governo tiveram a coragem de tomar as medidas necessárias. A gente tem que ver além do primeiro momento, dos custos, e ver os resultados que teremos [no futuro]”, disse ao Valor.

É verdade que existem vários fatores para sustentar o otimismo aparente de Levy, a começar da mais que tardia desvalorização cambial, algo que só tem sentido se um país realiza uma política agressiva de industrialização e de projeção destes produtos no mercado internacional, suportando via subsídios a defasagem de preços e a perda de competitividade.

Verdade também que nossa crise é multiplicada a níveis alarmantes pela instabilidade política, que influi mais sobre o ambiente econômico do que, diretamente, a realidade dos negócios o faz. Vivemos um daqueles períodos incomuns onde “é a política, estúpido” ajuda a explicar as expectativas econômicas. Se a política reduzir sua temperatura para alguns graus abaixo da ebulição, certamente isso será positivo ao cenário econômico, até com certa rapidez.

Igualmente correto é esperar um declínio da aceleração inflacionária – energia e alimentos, essencialmente – mesmo com a desvalorização cambial, onde se está comendo “gordura” nos preços e se conta com estoques altos e demanda baixa. A projeção de inflação pelo IPCA, que será divulgado quinta-feira, anda em 0,25%, e pode representar, pela primeira vez no ano, uma parada ou até mínima queda em relação à medida acumulada em 12 meses.

Mas isso tira a economia brasileira do caminho declinante que ela trilha?

Não parece o suficiente, e não apenas pelo imenso desafio que representa a estagnação da economia mundial.

O Brasil – esta verdade permanece há mais de meio século vigindo – só terá equilíbrio econômico com políticas de investimento e investimento aqui depende, essencialmente do Estado e suas ações e investimentos.

A previsão otimista de Levy precisa, para realizar-se, que a seletividade dos cortes não derrube, como vem fazendo, os investimentos públicos e os grandes projetos de infraestrutura, já acertados no peito pelos efeitos desastrados da Lava Jato, que confunde (deliberadamente?) prisão de empresários e dirigentes desonestos – os que interessam, claro – com a destruição de projetos essenciais ao país e a imensa importância da atividade de algumas das maiores empresas do país.


A isso soma-se o estado de semiparalisia em que segue, por estas e por outras razões, a Petrobras, que movimenta mais de 10% do PIB brasileiro.

Não existe, ao menos no horizonte, a possibilidade de apertar, de forma significativa, a receita pela via de impostos – de “travessia”, que sejam. Algo, de fato, pode ser feito, mas será “um troco”. “Troco” que se obteria sem traumas com medidas voltadas a reduzir o rombo que a sonegação – envolta em seu manto de “planejamento tributário” – produz em nossa arrecadação.

A chave para que se realize a profecia de Levy está com ele próprio e se traduz de maneira muito simples: o Estado voltar a apostar no crescimento econômico.

Não é preciso ser “de esquerda” ou “desenvolvimentista” para enxergar isso. O empresário Benjamin Steinbruch, com todas as ressalvas que pode merecer, diz o mesmo em artigo, hoje, na Folha:
“O atual ajuste econômico brasileiro deveria se distanciar do conservadorismo radical, fórmula usada na Europa para enfrentar a crise de 2008 e que provocou recessão em vários países, especialmente nos menos desenvolvidos, com aumento brutal do desemprego no continente.
Durante todos esses anos, as autoridades europeias impuseram uma política de forte austeridade e retardaram a redução das taxas de juros, só recentemente ajustadas para níveis semelhantes aos dos Estados Unidos”.
Nem é preciso dizer que nossas taxas, aqui, estão no Himalaia. E que baixá-las um degrau  não teria efeito inflacionário – nossa inflação nada tem a ver com “aquecimento” da economia, ao contrário – mas seria sinalização mais que legível desta disposição de retomada.

Evidente que não se fará a retomada sem os “remédios amargos” mencionados ontem pela Presidenta Dilma Rousseff. O problema é que, até agora, o único “princípio ativo” da medicação têm sido a recessão e a alta cavalar dos juros.

Quem olhar os resultados do Tesouro Nacional verá que não estamos penando porque as despesas cresçam, porque elas baixaram sob qualquer conceito que se examine. Mas porque houve uma brutal queda real na arrecadação.

A dose, Minisro, a dose não pode matar o paciente.

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