Emir Sader: Ciclo pós-neoliberal não terá fim se não houver alternativas

Por ora, oposições do continente não têm nada novo a oferecer. Única perspectiva seria de retorno ao modelo neoliberal
por Emir Sader, para a RBA publicado 16/09/2015 13:15
ARQUIVO/ABR
progressistas
Governos progressistas seguem sendo a melhor aposta para superar os problemas atuais
Com dificuldades em vários países de governos pós-neoliberais, com cara constrita, algumas vozes vêm lamentar o que seria o fim de ciclo de governos progressistas na América Latina, somando-se, uma vez mais, às vozes da direita. Um ciclo que eles não reconheciam que tenha existido.
Antes, se dizia que não teria havido ruptura alguma, os novos governos eram a continuidade dos anteriores, tão neoliberais quanto eles. A Venezuela de Hugo Chávez reproduziria a dos governos da Ação Democrática e de Copei. O governo do Lula seria a continuação do governo de FHC. Os governos da Frente Ampla do Uruguai seriam novas versões dos governos da direita. Evo Morales e Rafael Correa seriam reedições dos governos conservadores desses países, e assim por diante.

Quando as transformações operadas por esses governos, dentro dos seus países, diminuíram substancialmente a desigualdade, a miséria, a exclusão social, mesmo no marco do aumento desses fenômenos em escala mundial; quando os processos de integração regional diminuíram a capacidade de influência dos Estados Unidos na região e projetaram espaços próprios de ação; quando os Estados recuperaram capacidade de ação econômica, política e social; aquelas vozes tiveram de se calar, para agora vir a trombetear que esses governos teriam se esgotado.
Mas o que representa um fim de ciclo? Foi o esgotamento do longo ciclo desenvolvimentista em escala mundial e latino-americano, que levou à sua substituição por governos neoliberais. Foi o esgotamento do ciclo neoliberal, que levou ao surgimento de governos pós-neoliberais.
O que significaria o esgotamento do ciclo pós-neoliberal? No horizonte a única perspectiva é a restauração conservadora, com o retorno ao modelo neoliberal, programa proposto por todos os setores oposicionistas, todos de direita. A ultraesquerda, ao longo de todo o ciclo pós-neoliberal, iniciado há mais década e meia, em nenhum lugar construiu alternativas, não ocupa nenhum lugar no campo político, se limita a proclamações críticas e a alianças com a direita contra esses governos.
Fim de ciclo será quando surjam perspectivas novas, superadoras, no horizonte. Será quando a direita consiga – se chega a fazê-lo – uma perspectiva conservadora de superação dos governos atuais. Ou quando esses mesmos governos esgotem suas plataformas atuais e se proponham a objetivos maiores, por exemplo, anticapitalistas.
Inegavelmente vários governos pós-neoliberais se enfrentam atualmente a dificuldades, maiores ou menores. São afetados por heranças recebidas dos governos neoliberais, como a desindustrialização, o peso maior dos setores primários exportadores, a hegemonia do capital especulativo, a predominância do neoliberalismo e das políticas de austeridade e de recessão no plano mundial, entre outros.
Assim como dificuldades que alguns desses governos não souberam superar até aqui, além das mencionadas, como o peso dos monopólios privados dos meios de comunicação, o papel do dinheiro na política, o estilo norte-americano de consumo, entre outros.
O que termina é uma primeira fase dos governos pós-neoliberais, que são os que tem as melhores condições de enfrentar, de maneira progressista, avançando no caminho trilhado até aqui, para superar os problemas atuais. Com mais integração regional para favorecer a formulação de uma nova matriz produtiva, com novas plataformas que permitam a superação definitiva do neoliberalismo.
A direita permanecerá impotente diante desses avanços, enquanto a ultraesquerda, porque o uso da crítica deixa a boca torta, seguirá assistindo o desenrolar da história real.

Comentários