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Vai ter Copa, sim (apesar da Fifa): um guia do Mundial feminino

DO ESPORTE FINO- na Carta Capital
POR   •  5/6/2015  •  FUTEBOL FEMININOFUTEBOL
Por Roberta Nina Cardoso* (autora convidada) e Rodrigo Borges
Segolene Valentin, gerente de relações com a mídia da Fifa, iniciou a primeira entrevista coletiva da entidade no Canadá, nesta quinta-feira (4), afirmando que “os acontecimentos na sede da Fifa, na Suíça, têm sido bem noticiados nos últimos dias. Estamos aqui para falar de futebol”. A sétima edição da Copa do Mundo feminina começa neste sábado (6), com a partida entre Canadá e China. O microfone, então, foi entregue a um jornalista japonês, que fez a primeira pergunta do evento: “Por que o presidente Joseph Blatter e o secretário-geral Jérôme Valcke não estão aqui no Canadá?”

E assim seguiu toda a entrevista coletiva, deixando irritados em diversos momentos os membros da Fifa. O escândalo que está implodindo a entidade, iniciado no último dia 27 com a prisão de sete dirigentes na Suíça (entre eles o ex-presidente da CBF José Maria Marin) é o principal assunto de uma competição que já havia sido colocada em evidência com outra polêmica: o uso de gramados artificiais em todos os seis estádios.
“Este é o momento para o futebol feminino jogar um pouco de luz em um esporte que perdeu um pouco de seu compasso moral”, disse Victor Montagliani, presidente da Associação Canadense de Futebol. Será possível?

A polêmica dos gramados

Abby Wambach segura a rede
Abby Wambach: estrela em campo e, fora dele, líder de ação contra Fifa (Foto: Elsa/Getty Images/AFP)
Os estádios nas seis sedes que receberão jogos usarão gramado artificial, inferior e menos seguro em relação ao piso natural. A decisão motivou uma ação coletiva contra a Fifa e a Associação Canadense de Futebol, tendo à frente um grupo de jogadoras lideradas pela americana Abby Wambach, eleita melhor do mundo em 2012. As atletas diziam ser vítimas de preconceito de gênero, já que nunca um Mundial masculino foi jogado em gramado que não fosse natural. E provavelmente estavam corretas. Afinal, o futuro ex-presidente da Fifa, Joseph Blatter, já sugeriu que jogadoras deveriam usar shorts apertados para aumentar o interesse pela modalidade.
 
“Deixem as mulheres jogarem com roupas mais femininas, como elas fazem no vôlei”, disse Blatter em 2004. “Elas poderiam usar calções mais apertados.”
A grama sintética, além disso, representa um risco maior de lesões, além de tornar o comportamento da bola diferente. A ação, defendida por Kobe Bryant e Tom Hanks, foi retirada depois de um acordo com as jogadoras: a Copa de 2019, na França, será jogada apenas em gramados naturais, a tecnologia da linha do gol será utilizada já no Canadá e o gramado do estádio BC Place, em Vancouver, que receberá a final, foi trocado.
“Estas jogadoras fizeram o que Fifa e a associação canadense mostraram ser incapazes: colocar o futebol em primeiro lugar”, disse Hampton Dellinger, advogado das atletas.

Brasil

Embora tenha participado de todas as edições da Copa do Mundo, a seleção brasileira nunca chegou ao título. Bateu na trave em 2007, quando perdeu a final para a Alemanha, e foi terceira colocada em 1999. Nas duas oportunidades, foi conduzida por duas das melhores camisas 10 da história do futebol feminino: Marta e Sissi.
Para tentar a conquista inédita, depois de ficar fora das semifinais na Copa de 2011 e nos Jogos Olímpicos de 2012, a seleção terá uma chave teoricamente fácil na primeira fase: enfrentará Coreia do Sul (dia 9) e as estreantes Espanha (13) e Costa Rica (17).
 
Serão oito estreantes. Disputam a Copa pela primeira vez Camarões, Costa do Marfim, Costa Rica, Equador, Espanha, Holanda, Suíça e Tailândia.
Mas a CBF tratou a seleção feminina como um subproduto ao menos na hora da convocação. Apesar ter criado uma seleção permanente, a  confederação anunciou a lista de 23 jogadoras sem um evento ou entrevista coletiva. Um vídeo com cara amadora revelou a lista, que aponta uma equipe renovada: 14 atletas (61% do grupo) disputarão uma Copa do Mundo pela primeira vez.

Para apoiar as muitas novatas, a seleção terá a força de atletas experientes como Formiga – que, aos 37 anos, disputa seu sexto Mundial -, Rosana, Cristiane e Marta, que jogarão o torneio pela quarta vez. Elas terão o comando de Vadão, técnico conhecido por passagens principalmente pelo interior de São Paulo, em clubes como Mogi Mirim, Guarani, Ponte Preta e São Caetano.
Será a primeira grande competição depois da criação da seleção permanente que, se por um lado proporciona tranquilidade a 27 jogadoras, que têm emprego garantido, por outro desfalca clubes como o campeão mundial São José, que perdeu cinco atletas para a seleção permanente, que vira uma espécie de “concorrente” dos times.

As favoritas

O torcedor não deve se enganar: embora a fase de grupos possivelmente mostre um Brasil passando com facilidade pelas adversárias, hoje a seleção está passos atrás das principais equipes do mundo. Já nas oitavas de final, o rival deve ser a Suécia ou, pior, os Estados Unidos. O título será uma grande surpresa.
Japão É o atual campeão e está novamente entre os favoritos. Das 23 convocadas, 17 fizeram parte do time vencedor em 2011, que despachou Alemanha, Suécia e Estados Unidos. A meia-atacante Homare Sawa, capitã e eleita melhor do mundo pela Fifa em 2011, é o destaque da equipe, que pegará Suíça, Camarões e Equador na primeira fase.
Estados Unidos. São talvez a maior potência do futebol feminino. As americanas ficaram entre as três primeiras colocadas em todas as edições e foram campeãs em 1991 e 1999. Embora a goleira Hope Solo seja a atleta mais famosa, os destaques do time são as atacantes Alex Morgan e Abby Wambach, melhor do mundo em 2013 e excelente cabeceadora. Os Estados Unidos estão no Grupo D e enfrentam na primeira fase Austrália, Suécia e Nigéria.
Alemanha. Se alguém lhe pedir uma aposta para a campeã, as alemãs são sua melhor chance de acertar. Bicampeã em 2003 e 2007, a Alemanha é treinada por Silvia Neid, melhor técnica do mundo em 2013 e que já anunciou que deixará a seleção após os Jogos Olímpicos do Rio, em 2016 – será sucedida pela ex-zagueira Steffi Jones. Entre os destaques em campo estão a experiente goleira Nadine Angerer, melhor do mundo em 2013 e a atacante Celia Sasic. A Alemanha está no Grupo B, ao lado de Costa do Marfim, Noruega e Tailândia.
França. Tem um time muito bem preparado e liderado pela meia Luisa Necib, 28 anos, que adora fazer gols incríveis – um deles já disputou com os homens o Prêmio Puskas em 2013, dado pela Fifa ao mais bonito do ano. Uma boa aposta de zebra, a França, quarta colocada em 2011, está no Grupo F e terá pela frente Inglaterra, Colômbia e México na primeira fase.
Canadá. Uma outra aposta de zebra, o Canadá é o único país do mundo que tem mais mulheres jogadoras profissionais de futebol do que homens. Sua única aparição nas semifinais aconteceu em 2003, quando foi quarto colocado. Mas nos Jogos Olímpicos de 2012 conseguiu subir no pódio para receber a medalha de bronze. A atacante e capitã Christine Sinclair é o destaque do time que deve ganhar força pelo apoio da torcida e enfrentará na primeira fase China, Nova Zelândia e Holanda.

Top 5 – fique de olho

Asisat Oshoala (Nigéria). Em votação popular feita pela BBC, a atacante foi escolhida a melhor jogadora de 2015. Tem 20 anos e, contratada pelo Liverpool, tornou-se em janeiro a primeira africana a disputar o Campeonato Inglês, a Women’s Super League. Foi Bola de Ouro e Chuteira de Ouro no Mundial sub-20 de 2014 – a Nigéria foi vice-campeã.
Vivianne Miedema (Holanda). A atacante de 18 anos é uma goleadora. Joga profissionalmente há quatro anos e em 86 jogos marcou 85 gols. Foi artilheira das eliminatórias da Europa e eleita melhor jogadora da temporada 2013/2014, defendendo o Heerenveen. Em junho de 2014, foi negociada com o Bayern de Munique.
Verônica Boquete (Espanha). A meia de 28 anos joga no Bayern de Munique e defende a seleção desde 2004. É uma a referência da equipe que estreia em Copas do Mundo e atleta muito experiente, com passagens por ligas de Estados Unidos, Rússia e Suécia – ao lado da brasileira Marta, inclusive.
Ji Soyun (Coreia do Sul). A meia de 24 anos joga no Chelsea Ladies, onde é conhecida pelo apelido de “Messi Coreana”. Baixinha, ligeira e habilidosa, foi a responsável por levar sua seleção até as quartas de final do Mundial sub-17, em 2008. Foi escolhida a melhor jogadora da Ásia em 2014.
Andressinha (Brasil). É gaúcha, tem 19 anos e será provável estrela da seleção brasileira no futuro. Joga como meia e dificilmente erra passes, além de ser excelente cobradora de faltas. Já defendeu as seleções sub-17 e sub-20 e, apesar de ser reserva, tem chance de crescer e conseguir uma vaga de titular.
Andressinha treina
Andressinha, 19 anos: aposta de futura estrela (Foto: Rafael Ribeiro/CBF)
* Roberta Nina Cardoso é jornalista, colunista do portal São Paulindas (@spfc1935) e pós-graduada em Gestão e Marketing Esportivo.

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