Literatura síria mortificada pelas bombas. A violência como essência do humano.
Damasco, Bab Tuma. |
Há quem diga que a violência é o cerne do humano. E tem razão. Pobre de quem duvida: será sua próxima vítima.
Essa violência alça graus tão intensos, a fúria encontra um eco de tal modo tonitruante dentro dos corações e das mentes que inflama as ambições, que por sua vez transformam-se em vapores de mercúrio e colam-se a todos sem exceção. As ambições e a cupidez, por sua vez, saem ao encontro dos altos-fornos da expressão violenta, a qual se vê refletida nas chamas saborosas da cobiça e da mentira e o resultado é o festim da ignomínia, regado a cálices ferventes de ódio, baixelas de maldade onde estão servidas crianças chamuscadas e finos guardanapos bordados a sangue civil. Está servido o banquete da injúria, ao som da orquestração vampiresca mundial onuesca que ignora verdades e aplaude mentiras, não sem salivar diante do butim que se oferece às ambições ancestrais que circundam sua vítima servida nos samovares da infelicidade: a própria Síria.
E se a violência está no cerne, ela exigirá sua vítima sacrificial, e é o que a Síria representa neste momento. Incrustada que está no seio do oriente médio ela surge como vítima expiatória, mas resta perguntar já sabendo a resposta, ( portanto está estabelecida a antinomia) a quem interessa?
Desviam-se os olhares da caldeirada fervente egípcia, à moda da casa, onde primavera e ditadores borbulham misturados às vísceras faraônicas do desejo de dominação, e explode em um sem número e sem sentido para ocidente e oriente de expressões violentíssimas, envolvendo milhões de pessoas calcinadas pelo ódio e pela revolta, pela esculhambação e pela desorientação que parece reinar neste momento no Egito. Está servido a makluba da violência, acompanhada de bolinhos de falafel amassados pela mão dos ditadores revisitados, re-instalados e revividos.
Porém a Síria e o que acontece por lá atualmente, apesar da ira e da fúria reinantes, destoa, e sempre destoou do contexto da primavera árabe, hoje, inferno árabe.
O paradoxo do ressurgimento da ditadura do Egito, da libertação de seu velhíssimo ditador dos cabelos negros como a asa da graúna, parece ser mais uma mancomunação de múmias em um formidável sabah. Ela não invalidaria a própria destituição de Assad, agora, já que destoa dos sentidos primeiros desta infame primavera?
Já a literatura síria, esta antiquíssima senhora, vestal onipresente apesar dos pesares, sempre foi uma literatura de resistência. Convido a todos a lerem a entrevista do poeta sírio Adonis, em http://www.france24.com/fr/20130220-syrie-regime-baas-assad-poesie-adonis-opposition-revolution
Adonis, de son vrai nom Ali Ahmad Saïd Esber, déplore en outre que l’opposition soit si divisée et n’ait pas de projet pour le pays. Enfin, il dénonce l’influence des puissances étrangères sur le mouvement. “Je suis contre la destruction du pays que soutiennent certains pays arabes et européens, sans oublier Israël”, affirme-t-il.
“J’appelle l’opposition à adopter un projet clair basé sur le principe de laïcité”
“Une vraie révolution porte le pays, embrasse le peuple. En Syrie, on ne voit que meurtres et destructions. Ceux qui se disent révolutionnaires détruisent aussi le pays”, se désole le poète, longtemps exilé au Liban, qui vit en France depuis 1985. “Depuis 1956, je n’ai eu de cesse de me battre contre ce régime du parti unique qui, pour moi, s’apparente à une forme de religion, rappelle-t-il. Mais mon combat est toujours resté démocratique et non-violent”, souligne-t-il encore.
O fato é que não se consegue nada, ou quase nada sobre estes escritores. Muitos estão exilados, mas não mudos.
É o caso de Khaled Khalifa que grita a altos brados: “o mundo inteiro é cúmplice deste sangue derramado”… Exageros à parte, o tom de revolta e aflição é presente na literatura e nos escritores, principalmente neste autor de “Eloge de la haine” (Elogio ao ódio). Ele diz em carta aberta.
“Chers amis, écrivains et journalistes du monde entier, notamment en Chine et en Russie, je tiens à vous informer que mon peuple est exposé à un génocide.
Depuis une semaine les forces du régime syrien intensifient les attaques contre les villes rebelles en particulier Homs, Zabadani, les banlieues de Damas, Rastan, Madaya, Wadi Barada, Figeh, Idlib et dans les villages de la montagne de Zawiya.
Depuis une semaine et jusqu’au moment où j’écris ces lignes, plus de mille martyrs sont tombés, dont beaucoup d’enfants, et des centaines de maisons ont été détruites sur les têtes de leurs habitants.”
É isso, caros leitores, o desabafo e a tristeza desta que vos escreve diante das fatalidades que envolvem o mundo sírio.
Para onde irão os cristãos sírios? Esta é outra história cruel de um trânsito e de uma diáspora milenar que parece não ter fim, entre povos irmãos e infinitamente intolerantes.
Brasília, 24 de agosto de 2013.
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