Grécia: Pelo direito dos povos a auditar a dívida pública

Um manifesto internacional, divulgado no último dia 4 de maio, apela à solidariedade com a resistência da Grécia à Europa neoliberal, apoiando a Comissão pela Verdade sobre a Dívida Pública Grega. O documento é assinado por personalidades como Immanuel Wallerstein, Noam Chomsky, Ken Loach, Tariq Ali, Etienne Balibar, Frei Betto, Francisco Louçã, Jaime Pastor, Michael Lowy, Farooq Tariq, István Mészáros, entre outros.

ESQUERDA.net - 07/05/2015

"Participai ativamente nos processos de auditoria cidadã da dívida que se estão a desenvolver em muitos lugares, na Europa e fora dela".
Apelo em apoio à Grécia que resiste e à sua Comissão pela Verdade sobre a Dívida Pública Grega
Aos povos da Europa e do mundo.
A todas e todos os que rejeitam as políticas de austeridade e não aceitam pagar uma dívida pública que nos estrangula, que foi contraída sem nós e contra nós.

Nós, signatários deste apelo, estamos junto do povo grego que, depois do seu voto nas eleições gerais de 25 de janeiro de 2015, é o primeiro povo da Europa – e no hemisfério norte – a repudiar as políticas de austeridade aplicadas em nome do pagamento de uma dívida pública contraída pelos de cima, sem o povo e contra o povo. Ao mesmo tempo, consideramos que a criação da Comissão pela Verdade sobre a Dívida Pública Grega, por iniciativa da Presidente do Parlamento grego, constitui um acontecimento histórico de fundamental importância, não só para o povo grego, como também para os povos da Europa e do mundo inteiro.
"A criação da Comissão pela Verdade sobre a Dívida Pública Grega, por iniciativa da Presidente do Parlamento grego, constitui um acontecimento histórico"
Na realidade, esta Comissão, composta por cidadãos e cidadãs voluntários chegados de toda a parte, sem dúvida estimulará iniciativas semelhantes noutros países. Em primeiro lugar, porque o problema da dívida é uma verdadeira peste que se abate sobre quase toda a Europa e não só. E ainda porque muitos milhões de cidadãos e cidadãs colocam, com redobrada razão, perguntas elementares mas fundamentais sobre a dívida:
Que se passou com o dinheiro dos empréstimos? Que condições lhes estão subjacentes? Que juros já foram pagos, a que taxas e que parte do empréstimo já foi reembolsada? Como se acumulou a dívida sem que isso tenha beneficiado o povo? Que destinos foram dados aos capitais? Para que serviram? Que parte foi dispersa, por quem e como isso aconteceu?
E também:
Quem pediu emprestado e em nome de quem? Quem emprestou e qual foi o seu papel? Como foi conseguido o envolvimento do Estado? Quem decidiu e como foram tomadas as decisões? Como se converteram em “públicas” as dívidas privadas? Quem impulsionou projetos inadequados e inúteis, quem contratou, quem foi beneficiado com eles? Foram cometidos delitos ou crimes com esse dinheiro? Por que não se formalizam responsabilidades civis, criminais e administrativas?
Todas estas perguntas vão ser analisadas de forma rigorosa pela Comissão criada por iniciativa da Presidente do Parlamento da Grécia e cujo mandato oficial postula a compilação de todos os dados relacionados com o surgimento e o desmesurado aumento da dívida pública, para submissão a minucioso escrutínio científico com o objetivo de definir que parte se pode identificar como dívida ilegítima, ilegal, odiosa ou insustentável. E isso, tanto durante o período dos Memorandos, entre maio de 2010 e janeiro de 2015, como em anos anteriores. A Comissão também deve publicar informações claras e acessíveis para todos os cidadãos, realizar declarações públicas, facilitar a tomada de consciência da população grega, assim como da comunidade internacional e a opinião pública internacional, e, finalmente redigir argumentações e propostas relativas à anulação da dívida.
Consideramos que constitui o mais elementar dos direitos democráticos, para qualquer cidadão ou cidadã, pôr estas perguntas e obter respostas claras e precisas às mesmas. Entendemos que a recusa de respostas pressupõe uma denegação de democracia e uma recusa de transparência por parte dos de cima, que inventaram o “sistema-dívida” para enriquecer os ricos e empobrecer os pobres. Ainda mais grave: consideramos que, ao monopolizar o direito de decidir sobre o destino da sociedade, os de cima privam a imensa maioria das cidadãs e cidadãos não só do seu direito a decidir e, sobretudo do direito de assumir os seus destinos próprios, assim como o de tomar as rédeas do destino da humanidade.
"Ao monopolizar o direito de decidir sobre o destino da sociedade, os de cima privam a imensa maioria das cidadãs e cidadãos do direito de assumir os seus destinos próprios"
Por isso, dirigimos o urgente apelo seguinte a todos os cidadãos, aos movimentos sociais, às redes de movimentos ecologistas e feministas, aos sindicatos e às formações políticas que rejeitem esta cada vez menos democrática e humana Europa neoliberal:
Manifestai a vossa solidariedade com a resistência grega apoiando, de forma ativa, a Comissão pela Verdade sobre a Dívida Pública Grega e o seu trabalho de identificação das suas parcelas ilegais, ilegítimas, odiosas ou insustentáveis.
Defendei a Comissão dos indignos ataques com que a acossam aqueles que, na Grécia e no resto do mundo, estão interessados em manter oculta a verdade sobre o “sistema-dívida”.
Participai ativamente nos processos de auditoria cidadã da dívida que se estão a desenvolver em muitos lugares, na Europa e fora dela.
Partilhai nas redes sociais o vosso apoio e solidariedade, pois só semelhantes apoios e solidariedades podem frustrar o plano dos poderes que querem asfixiar a Grécia e o povo que luta contra os nossos inimigos comuns: as políticas de austeridade e a dívida que nos estrangula.
Estamos em confronto com adversários experimentados, unidos, bem coordenados, armados com poderes imensos e totalmente decididos a levar até ao final a sua ofensiva contra todos os que constituímos a esmagadora maioria nas nossas sociedades. Não podemos permitir-nos o luxo de resistir separadamente, cada qual isolado no seu canto. Assim, unamos as nossas forças num vasto movimento de solidariedade com a resistência da Grécia. Apoiemos a Comissão pela Verdade sobre a Dívida Pública grega e multipliquemos comissões semelhantes onde seja possível.
A luta do povo grego é a nossa luta e a sua vitória será a nossa. A nossa união é a nossa força.
4 de Maio
Primeiros signatários
1. Immanuel Wallerstein, sociólogo, cientista de história social e analista dos sistemas-mundo, EUA
2. Noam Chomsky, MIT, EUA
3. Ken Loach, realizador de cinema e de TV, Reino Unido
4. Hugo Blanco Galdos, histórico dirigente do movimento camponês e indígena, Peru
5. Etienne Balibar, filósofo, França
6. Frei Betto, escritor, ativista político, teólogo da libertação, Brasil.
7. Leonardo Boff, teólogo e escirotr, Professor emérito de Ética, Filosofia da Religiºão e Ecologia da Universidade Estadual do Rio de Janeiro, Brasil.
8. Jacques Gaillot, bispo, França
9. Paul Jorion, Detentor da cátedra «Stewsardship of Finance», Vrije Universiteit Brussel, Bélgica
10. Padre Alex Zanotelli, missionário comboniano, Nápoles, Itália
11. Ada Colau, candidata a Presidente da câmara de Barcelona pela Barcelona en Comú, Estado espanhol
12. Susan George, presidente honorária da Attac-France; presidente do Transnational Institute, França
13. Costas Isychos, Vice Ministro da Defesa Nacional, Grécia
14. James Petras, Professor reformado (Emeritus) de sociologia da Binghamton University em Binghamton, Nova York, e professor adjunto na Saint Mary’s University, Halifax, Nova Scotia, Canadá, EUA
15. Marina Albiol Guzman, parlamentar eleita para o Parlamento Europeu nas eleições de 2014 pela coligação da Izquierda Plural.
16. Fabio De Masi, Ökonom und Politiker (Die Linke). Bei der Europawahl 2014 wurde er in das Europäische Parlament gewählt.
17. Kostas De Masi, eurodeputado, Syriza, Grécia
18. Paloma Lopez Bermejo, sindicalista e política espanhola. Eurodeputada, Izquierda Plural, Espanha
19. Ransdorf Milislav, deputado europeu pelo Partido Comunista da Bohemia e Moravia, República checa.
20. Eleonora Forenza, eurodeputada (L’Altra Europa con Tsipras) membro da secretaria nacional do Partido da Refundação Comunista, Itália
21. Arcadi Oliveres, economista catalão e reconhecido ativista pela justiça social, Catalunha
22. Jorge Riechmann, ensaísta, poeta e professor de filosofia moral (Universidad Autónoma de Madrid). Membro do Conselho Cidadão do Podemos na comunidade de Madrid.
23. Joanne Landy, codiretor, Campaign for Peace and Democracy, Nova York, EUA
24. Tariq Ali, escritor, Reino Unido
25. Mariana Mortagua, deputada do Bloco de Esquerda, Portugal
26. Cecília Honório, deputada do Bloco de Esquerda, Portugal
27. João Semedo, dirigente do Bloco de Esquerda, Portugal
28. José Soeiro, deputado do Bloco de Esquerda, Portugal
29. Jeffrey St. Clair, editor do CounterPunch, autor de “Born Under a Bad Sky” e “Grand Theft Pentagon”, EUA
30. Nico Cué, secretário-geral da FGTB Métal, Bélgica
31. Jaime Pastor, Professor de Ciência Política e editor de Viento Sur.
32. Michael Lowy, escritor, professor, França
33. Paolo Ferrero, secretário nacional do Partito della Rifondazione Comunista- Esquerda Europeia, Itália
34. Farooq Tariq, scretário-Geral, Awami Workers Party, Paquistão
35. Andrej Hunko, deputado do Die Linke, Alemanha
36. Annette Groth, deputado do Die Linke, Alemanha
37. Mireille Fanon Mendes France, especialista da ONU, França
38. István Mészáros, Professor Emérito de Filosofia, University of Sussex, Hungary/UK
39. Pierre Khalfa, copresidente da Fondation Copernic, França
40. Aminata Traore, antiga ministra da cultura do Mali
41. Carmen Lamarca Perez, catedrática de direito penal, universidade Carlos III de Madrid, Espanha
42. Francisco Louçã, Bloco de Esquerda, Portugal
43. Pablo Micheli, secretário-geral da CTA (Central de los Trabajadores Autónoma de la Argentina)
44. Joxe Iriarte «Bikila», membro da coordenadora nacional da organizacion basca Alternatiba e da coligação Eh-Bildu.
45. Mary N. Taylor, membro doconselho editorial do LeftEast website/Diretora Assistente, Center for Place, Culture and Politics, City University of New York., EUA


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