Mídia insufla guerra entre PF e PGR. Qual o objetivo?


  

Nesta sexta-feira (17) o presidente da Associação Nacional dos Delegados da Polícia Federal, Marcos Leôncio, criticou a atuação do procurador-geral da República, Rodrigo Janot, o que ganhou ampla repercussão midiática. "Em Curitiba (na operação Lava Jato), tudo funciona às mil maravilhas, cada um respeita o papel do outro. Mas, em Brasília, temos um problema particular no STF”. Que intenções motivam o confronto? Com qual objetivo a mídia o insufla?


Excelente reportagem de Dayane Santos, no Portal Vermelho, traz algumas pistas. Uma coisa é clara, e Leôncio diz com todas as letras, ele quer que a PF tenha autonomia em relação ao MPF. Diz Marcos Leôncio, “A PF é obrigada a cumprir as orientações do MPF sim, mas a forma e o melhor momento quem sabe é o investigador. Além das sugestões (dadas pelo MPF), podem haver outras”. Vejam quantas contradições em uma frase de três linhas.

A motivação de Marcos Leôncio

Se a PF “é obrigada a cumprir as orientações do MPF”, elas não são meras sugestões como mais a frente ele afirma. Ora, se uma pessoa é “obrigada a cumprir as orientações” de outra, é evidente que só deve acolher “sugestões” de terceiros caso estas estejam de acordo com as orientações recebidas. O que é límpido e cristalino, Marcos Leôncio tenta nublar. E mais, parte para o ataque frontal a Janot: “Ele (Janot) está chateado porque a PF não ficou fazendo apenas as diligências inócuas que ele orientou”. Vejam esta outra declaração de Marcos Leôncio: “Se a gente trabalha por mais autonomia, se não quer ser subordinado a um partido, vai querer (ser subordinado) do MPF?”. Ao fazer um discurso mencionando “um partido”, o delegado deixa clara sua motivação política e seu objetivo de “jogar para a plateia”, pois para agentes públicos com funções institucionais relevantes, este tipo de declaração seria, em outros tempos, inconcebível e hoje é reveladora.

A “autonomia da PF”

Uma das bandeiras de Marcos Leôncio é, como se sabe, a autonomia da polícia federal. Esta proposta, inclusive, está no Congresso Nacional, através da PEC 412. A polícia federal é um braço armado do estado. Como tal, deve ter controle de outras instâncias do poder público para impedir abusos aos direitos constitucionais de todos os cidadãos. Nota técnica do Ministério Público Federal (MPF) sobre a PEC sustenta que ela representa “patente ameaça ao Estado Democrático de Direito”. Vejam trechos da nota.

“Tal proposta levaria à criação de um perigoso rompimento do equilíbrio entre os órgãos de poder, conferindo poderes exacerbados a um braço armado do Estado”.

“Não há exemplo histórico de democracia que tenha sobrevivido intacta quando Forças Armadas ou polícias tenham se desvinculado de controles. Em suma, não há democracia com braço armado autônomo e independente.”

“Conferir autonomia funcional, administrativa e orçamentária à Polícia corresponde a trilhar-se um perigoso caminho de enfraquecimento dos controles sobre o braço armado do Estado, seja pelo viés da condução de políticas públicas pelo Poder Executivo, seja pelo viés do controle externo da atividade policial, exercido pelo Ministério Público”.

“Conferir a uma instituição independência e discricionariedade, sem garantia de controles efetivos, claramente definidos, traz evidente risco de arbítrio na seleção de crimes investigados, mais uma vez trazendo um monopólio para a definição não só do que é prioritário investigar, mas acerca do que será ou não investigado.”

“Não se pode vislumbrar qualquer possibilidade de que as instituições policiais tornem-se independentes e autônomas, pois isso não condiz com os conceitos de democracia e república”.

“O que se está pretendendo por meio da PEC 412/2009 não encontra paralelo no mundo todo, o que, por si só, já é indicativo de quão temerária é a proposta”.

“Não se vislumbra vantagem para a sociedade em ter-se órgão armado, legitimado para uso da força, também podendo propor seu orçamento e desfrutando de autonomia na definição de prioridades governamentais, inclusive para deixar de investigar crimes, à revelia do Poder eleito e sem submissão a um efetivo controle externo”.

Pergunta lá na Globo

O que está por trás de tudo isso? Apenas luta pelo proscênio na famosa Operação Lava Jato? Ou existem outros interesses? Os jornalões e seus colunistas amestrados insistem em que as investigações têm que obrigatoriamente chegar a Dilma e a Lula, tenha-se ou não provas, atropele-se a legalidade se necessário... Será isso? Mas estas são apenas especulações. Quem tiver dúvidas procure a sede do sistema Globo. Eles, com certeza, têm todas as informações e, quem sabe não se dá sorte e se encontra por lá o próprio Sergio Moro que foi, talvez, pegar outra medalha.

Folha de S. Paulo mente e é desmascarada

Nesta última terça-feira (14), o jornal Folha de S. Paulo publicou como manchete a seguinte chamada: “CGU esperou eleição de Dilma para abrir processo, diz delator”. A página “A4” do jornal da família Frias foi dedicada a esta matéria. Nos dias seguintes o jornal desdobrou as repercussões do “furo” em novas reportagens sobre o tema. Havia, no entanto, um pequeno, insignificante, desprezível detalhe: é tudo mentira.

Folha: informação falsa para uma opinião distorcida

A Controladoria Geral da União (CGU) enviou para o jornal, depois que a reportagem foi publicada, um documento, assinado pela assessora de comunicação do órgão, Bárbara Lobato, onde mostra que abriu uma sindicância, “amplamente divulgada àquela época” para apurar as denúncias em abril de 2014, seis meses, portanto, antes da eleição. A abertura do procedimento foi devidamente registrada pelo Diário Oficial da União no dia 3 de abril daquele ano. E o mais grave, o repórter da Folha, informado previamente sobre a existência da sindicância, omitiu este fato para não comprometer o objetivo de atingir o governo. Abaixo, alguns trechos do demolidor documento enviado ao jornal Folha de S. Paulo, pela CGU.

"O texto (da reportagem) leva o leitor a entender que nenhum procedimento foi adotado antes do período eleitoral para analisar os fatos. O repórter chega a escrever sobre a existência da sindicância, mas omite que foi aberta em abril, informação que prejudicaria a tese de sua reportagem de que nada fora feito antes”.

“Entre os meses de abril a outubro a equipe de servidores da Controladoria trabalhou na análise de extenso material documental, como entrevistas; depoimentos; exame de documentos, e-mails, CDs e arquivos digitais de computador; análise de dados patrimoniais e de renda dos empregados e ex-diretores, além de apurações relativas a registro de viagens e de emissão de passaportes. O trabalho da Controladoria também envolveu contatos com representantes da SBM Offshore, bem como com autoridades estrangeiras.”

“O repórter utilizou na reportagem e no 'outro lado' apenas as informações que davam a entender que a investigação só começou com a abertura do processo e depois do processo eleitoral, ignorando todas as outras etapas do processo investigatório que lhe foram relatadas”.

Seguindo o que manda o protocolo, a CGU finaliza da seguinte forma: “Considerando que a Folha é um jornal que prima pela correção de suas informações, tenho certeza de que a informação será corrigida no espaço adequado do Erramos". Mas acontece que a Folha não “prima pela correção de suas informações”, prima antes de tudo em proteger os amigos e difamar os inimigos. A CGU, diante de uma matéria com informações falsas que foi publicada como a manchete principal, pede apenas uma reparação no “Erramos”, um pedido não apenas modesto como até mesmo recuado. Mas a Folha fez pior, publicou tão somente um pequeno trecho do documento em sua seção de cartas desta quinta-feira (16) e até agora não se pronunciou sobre o assunto. A Folha está com uma campanha de assinaturas e tenta atrair incautos com o slogan “Quem tem informação, sempre tem opinião”. Talvez fosse melhor, outra versão. Uma sugestão: “Quem tem informação distorcida, sempre tem opiniões distorcidas”.

A anatomia do discurso coxinha - despolitização

Os governos Lula e Dilma foram importantes para inúmeros avanços em diversos campos, mas pecaram em relação a estimular entre o povo o necessário debate político. Com receio de receber a pecha de um governo ideológico, o PT optou por não travar esta batalha. Recebeu a pecha mesmo assim e sem ter anteparos para uma resposta. Lembra um pouco aquela frase de Churchill, quando ele acusa Chamberlain de ter sido leniente com Hitler, entregando ao ditador nazista a Checoslováquia para evitar a guerra: "Entre a desonra e a guerra, escolheste a desonra, e terás a guerra". Atualmente, a imensa maioria das pessoas “detesta a política”, e é mesmo raro encontrar alguém que discorde da frase: “todo político é safado”. Isto é estimulado e serve aos intentos da mídia hegemônica, afinal nada mais fácil de manipular do que alguém que “desiste” da política e terceiriza seu pensamento sobre os temas da atualidade às manchetes e narrativas das “Vejas” e “Globos” da vida.

A anatomia do discurso coxinha – pensamento acrítico

Quem age assim, seja um metalúrgico, um médico ou engenheiro, em pouco tempo terá seu senso crítico amortecido a ponto de acreditar em toda sorte de mentiras sem questionamento. As ruas, bares, escolas, pululam com o que o escritor Luís Fernando Veríssimo chamaria de o falso entendido: “é o cara que não sabe nada de nada mas sabe o jargão. E passa por autoridade no assunto. Um refinamento ainda maior da espécie é o tipo que não sabe nem o jargão. Mas inventa”. Assim, hoje em dia, acompanhando acriticamente a realidade através de mensagens de Facebook, de WaatsApp e das manchetes da mídia hegemônica, não é impossível ouvirmos o seguinte diálogo em uma mesa de bar no Brasil:

Falso entendido 1 – E a Dilma hein? O Brasil nesta m***da e ela dando dinheiro pra Cuba.

Falso entendido 2 – Pra Cuba e pro Haiti. Souberam que o PT trouxe 50 mil haitianos para votar na Dilma?

Espectadora atenta 1 (futura falsa entendida) – Gente, isso não pode ser verdade.

Falso entendido 1 – É verdade sim. Infelizmente. Eu também não acreditava, mas tenho um amigo que trabalha na PF e confirmou tudo.

Espectadora atenta 1 (futura falsa entendida) – E ninguém faz nada?!? É um absurdo.

Falso entendido 2, olhando com ar superior para o Falso entendido 1, que corresponde ao olhar como se dissessem: “como ela é ingênua”. – Você não sabe de nada. Os caras estão bilionários, o Lula é dono de bilhões lá fora.

Falso entendido 1 – Mas agora vocês vão cair para trás. Sabe quem está tramando para derrubar a Dilma, que já tá para cair? O Lula, pois ele acha que é mais fácil assim ele voltar, fonte quente*.

Espectadora atenta 1 (futura falsa entendida) – Mas gente, esse PT tem que cair!!

Falso entendido 2 – Ué, com certeza vai ter uma outra manifestação contra a Dilma, e aí a gente pode marcar para ir, o que acha?

Espectadora atenta 1 (futura falsa entendida) – Só se não coincidir com minha viagem à Europa. 


* Coluna de Merval Pereira, edição do jornal O Globo, sexta-feira (17).

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