Flávio Aguiar: Destaques da agenda internacional na semana de 19 a 26 de abril

Naufrágios na costa italiana e possível saída grega da zona do euro movimentam política europeia

Flávio Aguiar, de Berlim - na Carta Maior
cena do filme Terra Ferma
A agenda europeia será dominada nesta semana por dois temas principais.

1. A questão dos imigrantes clandestinosA semana que passou trouxe à tona os maiores naufrágios dos frágeis navios que transportam imigrantes clandestinos da costa da Líbia para a da Itália. No começo da semana o número de vítimas fatais já chegava a centenas (uma estimativa, baseada no depoimento de sobreviventes).
No último fim de semana este número foi catapultado pela notícia do naufrágio de um destes barcos ainda perto da costa da Líbia, com apenas 28 sobreviventes. Alguns destes relataram que no barco havia entre 700 e 950 pessoas. Neste caso o navio chegou a enviar um pedido de socorro na madrugada de sábado para domingo, mas os navios italianos e malteses só conseguiram chegar ao local por volta do amanhecer, quando já era tarde demais.

No maior naufrágio do fim de semana anterior (com cerca de 400 mortos) e no deste houve elementos em comum.  Ambos estavam sem tripulação treinada. Ao avistarem um outro navio, a maioria das pessoas que estavam no convés correu para o lado de onde ele era visto. Com este movimento, o navio se desequilibrou e virou. Em ambos os casos a maioria dos mortos, segundo os depoimentos, era de mulheres e crianças.

O tema vem provocando viva polêmica. No ano passado, quando o número de vítimas foi bem menor, a marinha italiana executava um programa chamado de Mare Nostrum, ao custo de 9 milhões de euros por mês. Cansado de pedir ajuda, sem recebê-la, aos demais países europeus, o governo italiano cancelou a operação e substitui-a por outra, a Triton, ao custo reduzido de 3 milhões de euros por mês. Agora cresce a pressão para que a União Europeia tome a si, como um todo, o assunto. Até o Papa fez um apelo neste sentido.  Há duas correntes: uma pensa em privilegiar as operações de socorro; a outra, em privilegiar a ação contra os traficantes que agenciam estes navios, a um custo que varia de mil a dois mil euros por pessoa. Esta segunda opção esbarra em duas ordens de dificuldades.

Primeiro, o número de pessoas que busca este tipo de “solução” é cada vez maior. Elas vêm do Senegal, da Eritréia, do Egito, do Sudão, do Sudão do Sul, e da República Centro-Africana, mas também da Síria, do Iraque e do Afeganistão. Procuram passar pela Líbia, que, nesta altura, pode ser considerada como um ex-país que virou uma terra de ninguém, devastada pela guerra civil e depois de uma intervenção catastrófica por parte de potências ocidentais através da Otan . Aí está a segunda ordem de dificuldade: a única maneira de agir contra os traficantes seria intensificar a intervenção do Ocidente, uma vez que o que resta do governo líbio não tem condição de fazê-lo.

Nesta segunda-feira, os ministros de Relações Exteriores da União Europeia estão reunidos em Luxemburgo, e o tema deve dominar a pauta. O primeiro-ministro italiano, Matteo Renzi, pediu uma reunião de cúpula da U. E. ainda para esta semana.
 
2. A GréciaNa quarta-feira reúnem-se em Riga, capital da Letônia, ministros e/ou vice-ministros da área financeira da Zona do Euro, para encarar, mais uma vez, a questão grega. O ministro Yanis Varoufakis deverá estar presente. Segundo a maior parte dos comentários na mídia, a possibilidade de um acordo é cada vez mais remota, e as chances da Grécia deixar a Zona do Euro são cada vez maiores. Ninguém quer isto, mas a situação pode ser descrita como próxima da chantagem: ou o governo grego abandona sua intenção de não continuar com as privatizações, e a desvalorização dos salários e pensões, ou não receberá os 7,2 bilhões de euros da parcela que falta da prometida “ajuda” ao país. Sem esta parcela, acreditam os comentaristas, a Grécia não honrará seus compromissos em maio, que envolvem um bilhão de euros para o FMI e mais de 4 para pagamento de salários e pensões, e será forçada então a abdicar do euro.  

O curioso disto tudo é que o lado menos “duro” com a Grécia, mais propenso a fazer concessões, desde que não seja a de mudança nos prazos nos pagamentos, é o FMI, cujos dirigentes estão visivelmente preocupados com o efeito mundial deste provável aprofundamento da crise europeia. No longo prazo a saída do euro com a volta do dracma poderia até ser benéfica para a Grécia, que recuperaria a soberania de sua moeda. Porém no curto prazo o resultado é completamente incerto, podendo jogar o país na incerteza política. Completando este caldo já fervente, começa em Atenas, nesta semana, o julgamento de políticos do Partido Aurora Dourada, de extrema-direita, o terceiro do Parlamento, acusados de violação dos direitos humanos.

FinlândiaNeste fim de semana que passou a direita venceu as eleições nacionais na Finlândia, país que está em crise de desemprego e encolhimento da economia. O Partido do Centro, tido como mais conservador do que o da Coalizão Nacional, que estava no poder, foi o mais votado, ganhando 49 cadeiras das 200 do Parlamento. O segundo mais votado foi o partido dos “Verdadeiros Finlandeses”, com 38 cadeiras. A Coalizão ficou com 37 e o Partido Social-Democrata com 34. 

O resultado aponta para uma participação do V. F. no governo, o que vai endurecer a dificuldade de ajuda à Grécia, já que este partido sempre se manifestou pelo fim deste tipo de operação e pela “expulsão” deste país da Zona do Euro. Juha Sijilä, o líder do Centro, é um empresário de sucesso, inclusive no setor das comunicações, e seu programa prevê o congelamento dos salários e cortes nas despesas públicas.

Os filhos de Hillary e Castro
Não, não se trata de alguma ficção científica tresloucada sobre o futuro da política nas Américas. Acontece que a Suécia está enviando dez filhotes de crocodilos de seu zoológico em Estocolmo para Cuba. Antes do fim da URSS Fidel Castro presenteou um cosmonauta soviético (nos tempos da Guerra Fria, os EUA tinham “astronautas”, a URSS, “cosmonautas”) em visita à ilha caribenha com dois crocodilos. O cosmonauta levou-os para Moscou e conservou-os em casa, até que a sua esposa exigiu que ele se desfizesse dos animais, que cresciam a olhos vistos. O cosmonauta procurou o zoológico de Moscou, mas sua direção considerou que não tinha ambiente adequado para eles. Ofereceu-os então ao zoo de Estocolmo, que os aceitou. Com o passar do tempo, os crocodilos – macho e fêmea, batizados posteriormente com os nomes de Castro e Hillary (!) – procriaram. Acontece que a espécie específica destes crocodilos hoje é considerada como em perigo de extinção. Comuns no Caribe inteiro tempos atrás, hoje eles estão confinados a dois pântanos em Cuba, único país em que sobrevivem, sendo diferentes dos demais crocodilos e jacarés das três Américas.

Agora o zoo sueco vai “repatriar” dez dos filhotes de Castro e Hillary para Cuba, onde, depois de um período de adaptação, deverão ser soltos naquelas regiões pantanosas, interrompendo, assim, seu “exílio” em Estocolmo. Isto não deixa de ser mais um capítulo da hoje distensão mundial em relação à ilha.

Quem quiser pode conferir a notícia no The Guardian.
 




Créditos da foto: cena do filme Terra Ferma

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